No chão outro veze

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Aqui vai um apanhado do que descubro sobre ela:

1. Jennie tem três irmãs — duas gêmeas — por parte de pai. Antes de começar a viajar, estudava engenharia (quem diria!) e chegou a trabalhar em um cinema em Paris;

2. Diz gostar das mesmíssimas cantoras indies que eu, Foxes, Banks e Zella Day (“Não acredito que você conhece a Zella!”, exclamo quando ela cita seu nome. “‘Sweet Ophelia’ é a melhor
música do mundo”, Jennie afirma, contente, enquanto eu mexo a cabeça numa concordância acalorada);

3. Ama As Crônicas de Nárnia, as animações do Studio Ghibli, os filmes do Xavier Dolan (“Tirando a parte em que falam aquela língua estranha que chamam de ‘francês’ no Canadá”, Jennie desabafa, rindo da minha pronúncia em “Xavier”, já que em francês está mais para “Csaviê”) e a adaptação de Orgulho e preconceito com a Keira Knightley, minha atriz preferida no momento;

4. Jennie assiste Please Like Me , também conhecida como a melhor série gay de todos os tempos (podemos casar???);

5. Curte muita produção nacional: Céu, Caetano Veloso, Elba Ramalho, Vanessa da Mata, Elis Regina;

6. Gesticula muito. Maneia a mão livre no ar fluidamente, mexendo bastante a cabeça e arqueando as sobrancelhas quando se empolga. Seu entusiasmo é contagiante, os dedos constantemente em minha pele, massageando meu ombro ou em outro carinho sutil;

7. Jennie é super mão aberta. Pede o prato mais caro do cardápio (posta de salmão com patê de foie gras , receita supostamente servida no último jantar do Titanic antes do naufrágio), apesar
das minhas tentativas de convencê-lo do contrário. Entre a ausência de gastos com hospedagem — ela trabalha em troca de alimentação e moradia em suas viagens, me explicou — e as conversões de euro para real, sobra bastante grana. É a primeira vez que sai desde que
chegou a Natal e está “disposta a aproveitar a noite como merece”

Para alguém que passou tanto tempo em um retiro espiritual, ela entende muito de música pop: reconhece dois de cada cinco hits tocando na pista de dança. Sua voz cantarolando as músicas é bonita.

Assume um ar mais grave, rouco. Eu me pergunto quais truques ainda guarda na manga. Não raro o flagro me estudando também. Não sei justificar sua atenção. Por que, entre tantas pessoas, ele me escolheu? Eu não sou tão bonito assim; sou sem graça onde Jennie é
extraordinário. Saber que ele me enxerga traz um contentamento besta — o que sentimos ao perceber que o sentimento, seja qual for, é recíproco.

Pela primeira vez em minha inexistente e desastrosa vida amorosa, acho a balança equilibrada:
Jennie demonstra tanto interesse em mim quanto demonstro nele. Essa simples percepção desperta o meu sabotador, e começo a travar uma batalha contra sua voz sussurrando sobre o fim desta noite — o inevitável naufrágio da história de nós duas.

Até que ela me convida para dançar.
Imediatamente digo que sim, mas me sinto bêbado, a visão periférica tomada por um borrão brilhante. Nós dois estamos, na verdade. Quando Jennie e tenta levantar, não consegue.

— Acho que estou com um probleminha aqui — ela balbucia um instante depois.

— Que tipo de problema? — Estreito os olhos.
— Não consigo levantar. — Jennie começa a rir.

— Ah, é?

— É. E você podia ter mais empatia e me ajudar.

Balanço a cabeça.

— Por favor? — insiste ela. — Por favorzinho ?

Apoio as mãos na cintura e dou de ombros, impassível. Mas aí Jennie usa a única tática contra a qual eu não resisto. Minha kriptonita.

Enquanto eu não te encontro - JenlisaOnde histórias criam vida. Descubra agora