Prólogo - A chegada do inverno

24 4 0
                                    

  A luz do sol, que banhava a coroa real de Terynas, se esvaía lentamente conforme nuvens se aglomeravam e cobriam um belíssimo manto azul com uma cor que trazia apreensão para as pessoas. Em alguns minutos, a mistura de tons cinzentos tomou conta da paisagem até o fim do horizonte. Ao presenciar isso, o rei, Lancil Gerard III, deu dois passos para trás e, enquanto se virava e seguia caminhando para dentro do castelo, dirigiu a voz para o soldado que o aguardava na porta de seu quarto:

─ Capitão Cleddy, ordene o recuo das tropas para o Coração de Gwerth.

  O cavaleiro, de forma respeitosa, questionou a ordem devido ao conhecimento que possuía do calendário:

─ Meu soberano tem certeza? De acordo com o calendário, o inverno apenas chegará ao reino no próximo mês.

─ Naquela hora eu também duvidei, mas acabo de ver com meus próprios olhos. O maldito sacerdote Kimenon tinha razão, o inverno chegará mais cedo desta vez. Chame as tropas de volta, agora.

  Acatando as ordens, o capitão se retirou após realizar a reverência ao rei e se dirigiu em direção ao armazém da infantaria. Isso era algo inesperado, o inverno nunca havia se adiantado, mas não restavam dúvidas depois de presenciar a queda dos primeiros flocos de neve no imponente castelo de Gwerth.

  De pouco em pouco, no avanço dos dias, partículas brancas começavam a tomar conta da terra, pois o inverno havia chegado em Gwerth e nas demais vilas próximas. Os moradores da cidade grande de Anrhy já haviam começado a acender seus grandes aquecedores, porque anteriormente já os tinham abastecido com o carvão imperial, um tipo raro e duradouro de carvão. Já não se podia dizer o mesmo dos moradores das pequenas vilas, próximas das fronteiras da enorme cidade comercial, pois estes não tinham condições de obter tais suprimentos. Até mesmo suas pequenas quantias de alimento não deveriam durar por todo o período invernal, e isso certamente resultaria no fim de muitas vidas.

  O rei de Terynas, como Lancil gostava de ser chamado, sendo a principal voz de um dos maiores reinos do mundo, não parecia se importar com esta situação, já que não havia dado ordem alguma para que seus soldados auxiliassem os povos mais pobres. A verdade é que ele também temia outra coisa, os Penumbras. Não se sabia muito sobre eles, apenas que eram seres sobrenaturais e assustadores que caçavam humanos, fosse para alimentar-se, divertir-se ou até mesmo tomar suas posses. Os índices de ataques de Penumbras sempre aumentavam durante o inverno, principalmente em locais onde haviam mais sentimentos negativos, e por isso o rei se recusava a mandar seus soldados para as pobres vilas. Ao invés disso, ele focava seu exército nas muralhas de uma região conhecida como Coração de Gwerth.

  Porém, talvez nem tudo estivesse perdido para os moradores de Onest em particular, pois um menino de 12 anos, cansado de ver familiares e amigos morrerem durante os invernos anteriores, decidiu pegar seu pequeno arco e algumas flechas, junto de sua pequena faca improvisada com Blak, um tipo de metal negro bastante resistente, para lutar por sua proteção. Este garoto se chamava Ceunant Dyfinder, um dos poucos sobreviventes de uma família reconhecida de ferreiros que fora perdendo sua fama com o tempo. Enquanto corria pelas estreitas estradas da vila, sacudindo seus cabelos ruivos ao vento, Ceunant cruzou com um outro rapaz, seu amigo, Desmond Ravdol. Este, ao avistar o jovem ruivo com pressa, perguntou enquanto acenava com a mão:

─ Ei! Ceunant! Aonde está indo?!

  O garoto determinado desacelerou o passo logo que ouviu uma voz chamá-lo e, após tomar fôlego ao encarar o colega, respondeu com um enorme sorriso no rosto:

─ Des, venha comigo! Não tenho tempo para explicar, apenas venha!

─ Calma! Minha mãe me deu algumas tarefas e se eu não voltar logo para casa ela irá brigar comigo... Não posso ir com você.

Luz da Ruína - Caça às BruxasOnde histórias criam vida. Descubra agora