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Luzes vermelhas de neon piscaram automaticamente e uma voz chiou no alto-falante:


— O trem está de partida, plataforma três... Trem de partida para...

O trem já vai partir.

— Esse deve ser o seu trem — disse a mãe de Mary Ventura. — Só pode ser, querida. Apresse-se. Vá. Está com o bilhete em mãos?

— Sim, mãe, está comigo. Mas tenho de partir agora? Tão cedo?

— Você sabe como são os trens — disse o pai de Mary Ventura, disfarçado em seu chapéu de feltro cinza, como se viajasse escondido. — Os trens são assim. Eles não esperam.

— Sim, pai, eu sei.

O longo ponteiro preto do relógio de parede encurtou mais um minuto. As pessoas corriam de um lado a outro para pegar seus trens. Acima, a abóboda da estação se insinuava como a cúpula de uma enorme catedral.

— Trem de partida na plataforma três... Trem de partida para... O trem já vai partir...

— Depressa, querida — disse a sra. Ventura, segurando Mary pelo braço e a empurrando pelo corredor de paredes de mármore reluzentes do terminal ferroviário. O pai de Mary a acompanhava carregando a mala. Outras pessoas também se apressavam em direção ao portão de número três. Um maquinista de uniforme preto e rosto sombreado sob a pala do quepe conduzia a multidão pela emaranhada grade preta do portão de ferro até o interior da plataforma.

— Mãe — disse Mary, hesitante, ao ouvir o silvo espantoso do motor se aquecendo sobre os trilhos. — Mãe, eu não posso partir hoje. De jeito nenhum. Ainda não estou pronta para fazer essa viagem.

— Que bobagem, Mary — disse o pai, espirituoso. — Você só está nervosa. Não é um suplício viajar para o Norte. Você entra no trem e não precisa se preocupar com nada até chegar ao fim da linha. Lá o maquinista lhe dirá aonde ir.

— Agora vamos, seja uma boa menina. — A mãe de Mary escondeu uma mecha loira de cabelo sob seu chapéu de veludo preto. — Será uma viagem tranquila. A hora da partida chega para todos. Mais cedo ou mais tarde, todos vão embora.

Mary fraquejou.

— Ah, certo, tudo bem. — Ela se deixou conduzir pelas forjas dos portões de ferro em direção à plataforma de cimento, onde o ar era puro vapor.

— Extra, extra — os jornaleiros anunciavam as manchetes, vendendo jornais nas portas do trem. — Extra... dez mil pessoas condenadas... mais de dez mil pessoas...

— Não é nada — sussurrou a mãe — nada de mais, não se preocupe.

Ela se enfiou no meio da multidão caótica e Mary seguiu seu rastro em direção ao penúltimo vagão do trem. Havia uma longa fileira de assentos felpudos vermelhos, a cor de vinho saltava sob as lâmpadas radiantes do teto, e o acolchoado do vagão era arrematado por pregos de cobre.

Mary Ventura e o nono reinoOnde histórias criam vida. Descubra agora