Irmãos sem ligação sanguínea

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Ainda de olhos fechados, Meredith sentiu o coração acelerar e uma pressão terrível segurando os seus membros superiores e inferiores contra a cama. Ela não queria abrir os olhos, pois sabia o que veria e, definitivamente, não queria ver, não mais. Cada vez era um rosto diferente e todos estavam muito machucados e seus corpos mutilados e ensanguentados. Ela não sabia  quem eram e muito menos porque estavam aparecendo para ela de madrugada, flutuando sobre a sua cama, durante os episódios de paralisia do sono que tinha. Não eram tão frequentes, mas quando vinham, eram muito intensos, e ela geralmente acordava gritando e acordando junto todas as meninas do alojamento, que no total eram quinze. Haviam vários alojamentos nas alas do orfanato, que eram separadas em ala masculina e ala feminina. Tentavam separar por faixa etária também quando dava, então as meninas que estavam no mesmo alojamento que ela, tinham entre quinze e dezessete anos. Evelyn Meredith Brooks, tinha dezesseis anos e tinha esses sonhos desde os dez, quando perdeu seus pais em um acidente de carro. Como o único parente vivo que ela tinha era o seu avô que morava em um asilo, ela teve que ser encaminhada para o orfanato católico de São Bento, que era referência no quesito conforto para jovens órfãos, de modo que, aqueles que não conseguiam ser adotados, tinham suporte para alcançarem a vida adulta prontos para se virarem sozinhos.

— O que era desta vez, Eve — Chris perguntou, na mesa do café. Pelo visto, o episódio noturno da Meredith Louca, já tinha chegado na ala masculina e Chris, seu melhor amigo, não podia deixar de lhe pedir detalhes —, homem ou mulher? Disseram alguma coisa dessa vez?

— Olha Chris, eu não olhei tá — ela respondeu, mordendo o seu pãozinho doce —, me forcei a ficar com os olhos fechados até conseguir gritar.

— Droga, Eve — ele protestou, com a boca cheia —, você tem um dom e não quer usar!

— Já chega, né Chris? — Annie disse, sentando-se à mesa — A Eve tem um dom sim, e é desenhar. Eu consegui permissão para usarmos uma das salas de computação no período da tarde e o meu padrinho disse que a mesa digitalizadora chega hoje junto com os outros equipamentos, então a nossa história em quadrinhos vai sair.

— Que maravilha, Annie! — Eve disse empolgada — Eu tenho que falar com a doutora Lauren depois da aula, mas encontro vocês lá.

— Eu só vou deixar passar, porque a notícia da Annie é realmente boa — Chris disse, após dar mais uma mordida no pão —, mas ainda vamos conversar direito sobre esse dom mediúnico. Isso é quase um super poder!

— Pois eu queria ter o poder de te fazer parar de conversar com a boca cheia, Chris! — Annie disse, deixando-o envergonhado, enquanto as duas riam alto.

— Vejo que a Meredith está de bom humor — Kristen disse, com tom sarcástico, se aproximando da mesa deles.

— Talvez seja porque ela não foi acordada no meio da madrugada pelos gritos de uma garota louca — Lúcia completou a ironia visivelmente combinada para atingir Eve.

— Claro que não foi, Lúcia — Kristen continuou, com seu sarcasmo venenoso —, afinal ela é a louca que acorda todo mundo!

— Sabe de uma coisa, meninas — Annie se levantou, falando com as duas —, todo mundo aqui é órfão e a maioria perdeu os pais, mas convivendo com vocês duas, eu tenho cada vez mais a certeza de que os pais de vocês as jogaram fora, quando viram que na verdade eram víboras venenosas!

— Pelo visto a loucura pega, Kristen — Lúcia disse, enquanto os jovens das mesas ao lado riam delas —, vamos procurar uma mesa mais afastada!

— E a vencedora por nocaute é, Annie Marie Stevens! — Christian exclamou, como se fosse um locutor de luta livre fazendo os jovens das mesas vizinhas aplaudirem completando a encenação, enquanto Kristen e Lúcia olhavam para eles com uma expressão de ódio no olhar.

O Orfanato de São BentoOnde histórias criam vida. Descubra agora