Parte I

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As unhas de ferro não estavam visíveis quando ela percorreu a mão - numa carícia lenta - a barriga firme e já grande. Era um peso difícil de suportar às vezes, cansativo, e Manon já tinha sentido dores por todo o corpo desde que soubera estar esperando a bruxinha. Nunca havia passado pela experiência da gravidez antes, e nem tinha desejado. Até a guerra acabar e ela começar a vislumbrar um futuro ao lado de Dorian; quando refletiu sobre o que sentia pelo rei e decidiu que não teria nada a perder.

Às vezes Manon falava com a bruxinha; contava histórias antigas, de um mundo onde seres terríveis governavam e deixavam rastros de destruição por onde passavam. E também de bravos guerreiros, príncipes e princesas, reis e rainhas, de esperança e paz...

E quando seu ventre — a criança dentro dele — se mexia, isso quase a matava. O mundo parecia sufocá-la, informando que a filha seria muito forte; e que estava escutando.

Ela será amada. — Dorian tinha dito ao saber de sua gravidez em um dia em que ambos treinavam juntos sob uma tarde ensolarada. Um sorriso genuíno tinha contornado os lábios do rei antes de beijá-la e abraçá-la. — Mas sinto pena de quem cruzar o caminho dela.

Manon tinha apenas devolvido um olhar orgulhoso.

— Certamente estarão mortos.

Porque eu irei matar ou você? — perguntou Dorian, erguendo as sobrancelhas.

Ela o fará. — As palavras da bruxa saíram cortantes feito lâminas. — E comerá seus corações em seguida.

Os olhos safira do rei pareceram reluzir, revelando consentimento. Dorian sabia que a filha seria poderosa, sagaz e tão linda quanto uma armadilha para enredar homens. Ele sabia que muitos desejariam sua mão e se prostariam para consegui-la. Ou talvez a temeriam tanto que só de ouvir o seu nome, fugiriam como covardes.

Manon estaria pronto para eles. Para ela.

E naquele momento enquanto observava Forte da Fenda abaixo — fria, silenciosa e com pontos brilhantes e distantes na noite escura — ela percorreu a mão sobre a enorme barriga com carinho. A bruxinha logo nasceria e Manon não conseguia sequer imaginar como ela seria fisicamente; quais poderes ou dons teria. Se herdaria a beleza devastadora do pai ou se teria os olhos dela.

E como se ouvindo os seus pensamentos, a bruxinha dentro dela se moveu; um movimento sutil. O que fez Manon parar as carícias.

— O que foi, filha? — ela perguntou, baixinho. — Quer conversar?

Manon tinha pensado em alguns nomes para a filha das quais possuíam significado para ela, mas não os dissera a Dorian. Eles ainda não haviam tido aquela conversa. E naquele momento, o rei devia estar em algum canto do castelo resolvendo pendências do reino. Mas a hora de falarem sobre isso estava chegando.

Faltavam poucos meses agora. Poucos meses até a...

Manon ficou imóvel quando ouviu. Quando sentiu o local esfriando e a janela....

A bruxa franziu a testa para a fina camada de gelo que começou a se formar lentamente no vidro.

Contornos tortos a princípio, e depois arabescos e linhas.

E então todo o vidro estava congelado.

Manon olhou da janela para a barriga com algum espanto antes de chamar por Dorian.

❤️❤️❤️

A parte II ( e última) sai logo mais!😘

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