16. Deixe tudo queimar

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Os dias começam a se passaram como se fosse um só, com o tempo eu não conseguia mais sair da cama, para ser mais exata, eu não tinha forças pra isso, passei a maior parte do tempo dormindo, trocando o dia pela noite, quando todos pela manhã vinham ver como eu estava ou até mesmo Lesso vinha ver se eu estava bem, eu dormia, e a noite quando todos estivessem dormindo, no silêncio da noite os únicos sons que alguma poderia escutar eram os meus choros, meus gemidos de dor enquanto eu implorava para qualquer um que me escutasse que isso acaba-se de uma vez

Com o tempo o vazio foi se espalhando em mim, como se tudo tivesse se apagado, eu não sentia nada, nada além do vazio enorme, fiquei assim por dias, não comi nada por um longo tempo, e quando eu sentia que meu corpo não aguentava mais, pela noite eu me escondia para buscar algo pra comer, mas isso também parou de importa para mim, eu deixei a dor tomar conta de mim, depois de anos lutando contra isso, contra esse vazio, ele não foi embora então talvez essa era de fato o final da história, eu já estava cansada demais pra lutar de novo, era como se eu estivesse em alto mar e toda vez que eu subisse pra superfície para respirar, vinha outra onde e me afundava de novo

Durante esses anos todos lutando, minha família era o que me mantinha de pé, mas então meu pai se foi, agora minha mãe, Adhara apesar de toda essa guerra, tinha Luke e agora seu filho, eu sabia que Kaenna ficaria bem assim como Baelon porque Arkin e Lich cuidaria deles, assim como Dovey, e Blyanna teria Lesso e vice versa, eles poderiam ficar bem sem mim, até melhor, talvez eles ficassem tristes por algum tempo, mas iriam se recuperar, e eu não seria mais essa fardo culposo para eles

Em mais uma noite de silêncio, sentada em minha cama enquanto olhava para fora da janela, nem a lua brilhava mais, talvez ela também estivesse cansada.

As lágrimas escorriam silenciosamente pelo meu rosto queimando minhas bochechas, com a pouca força que eu tinha para ficar de pé, meu corpo inteiro queimando com a sensação, meus pés descalços tocaram o chão frio, assim como a camisola branca que eu usada, com dificuldade eu caminhei em direção a sacada, cada parte do meu corpo implorando para que isso acaba-se, mas antes que eu chegasse, eu parei no meio do quarto, com a respiração pesada, e então enquanto eu tentava puxar o ar, meu olhar caiu sobre o espelho pendurado na parede um pouco a minha direita, eu podia me ver depois de tanto tempo, meu cabelo estava uma bagunça emaranhada, e apesar da camisola grande eu consegui ver a finura dos meus braços, mas isso não importa, não mais

Enquanto eu me olhava no espelho, perdida em pensamento vazios eu ouvi um rosnado atrás de mim, e então meus olhos se concentraram no par de olhos vermelhos refletindo no espelho, eles me encaravam de volta com raiva, e então uma dor de cabeça me atingiu me fazendo fechar os olhos com força, uma dor enorme atingiu meu corpo mas logo foi embora, e então veio o alívio, quando olhei novamente para o espelho, os meus olhos estavam vermelhos brilhando, os dois, minha postura estava correta agora e minha respiração não parecia mais ofegante, mas aquela não parecia ser eu, até que percebi que não podia controlar meu próprio corpo

Minha cabeça se virou novamente para a janela, e cada passo que eu dava para mais perto o desespero me consumia, mas ao invés de me fazer parar, era esse o meu combustível para querer acabar com isso, minhas mãos seguravam as maçanetas frias antes de abrir as portas de vidro que davam abertura para a sacada, o vento atingiu meu rosto fazendo meu cabelo balançar, o frio atingiu minha pele me fazendo estremecer, com um pouco de dificuldade eu consegui subir na grade de concreto, ela era grossa o suficiente pra mim ficar ali em pé, meu olhar vagou por toda a floresta na minha frente, depois pro céu onde a lua começou entre as nuvens, mas ainda não tinha o céu brilho, e então olhei agora baixo, as árvores me proibiam de ver o chão, e eu senti meus olhos queimarem com as lágrima vindo mais uma vez

Todos sempre temem a morte, eu nunca entendi o motivo, mas talvez seja por que ela é o final de tudo, final de sonhos, de planos, de famílias, de vidas, mas quando você não tem nada a perder, não tem motivos pra temer, talvez esse seja o final de tudo afinal, o final da minha história, o final da minha vida

O vento bateu uma última vez no meu rosto antes de tudo envolta de mim escurecer, meus olhos se fecharam e pela última vez eu me senti viva quando o vento bateu forte enquanto eu caia.

A morte pode não ser tão ruim afinal.

Apricity  - Lady Lesso Onde histórias criam vida. Descubra agora