Me vi sozinha com Kari na base da floresta, temi que ficássemos sem assunto ou algo do tipo e por isso tratei começar uma conversa, ainda que tola.
— Obrigada por ficar. Espero não estar atrapalhando sua diversão.
— Não se preocupe, eu falei sério quando disse que não sou muito fã da caça. Será um prazer te fazer companhia. — ele fez sinal para que eu o acompanhasse — Venha, podemos ficar em um lugar bem mais confortável.
— No avião? — Pronto, minha mente se agitou com a ideia de que ele fosse tentar me seduzir como parecia ser o habito do Dimitri.
— Há um restaurante aqui perto, eles caçam e preparam para os visitantes. É bem tranquilo e aquecido, acho que vai conseguir tirar essa blusa.
Quebrei a cara, onde eu estava com a cabeça para achar que ele ia tentar me seduzir?
— No rio as temperaturas do verão são bem mais altas. Também não costuma ventar tanto. Mas eu me acostumo, essa blusa é bem fininha.
— Eu espero que sim — Kari me deu um curto sorriso — como estou acostumado aqui, nem inverno nem verão são um problema para mim e hoje é um bom dia para sair de casa e aproveitar o sol. Por isso ver alguém vestir uma blusa em um dia como o de hoje é... diferente.
— É estranho você pode dizer. — Falei sorrindo. Acho que consigo imaginar minha cara se visse alguém de regata em dia de chuva cuja temperatura marca 8ºc. Mesmo se eu não sabia o que um dia frio significava para alguém como Kari, eu tinha certeza de que ele não se incomodaria.
— Como veio parar aqui? — Ele quis saber.
— Sempre gostei de países frios e sempre quis morar em outro pais. Achei a combinação justa.
— Mas tinha que ser o Alasca? — Percebi uma leve ruga em sua testa, como se ele realmente tivesse dificuldades para entender porque alguém que mora em um pais consideravelmente mais quente, escolheria o Alasca como lar.
— Bem, Anchorage não é a cidade mais fria do mundo, e também não é muito populosa. Achei que seria legal. Minha nova casa por exemplo, tem vista para uma floresta, um alce de estimação e um formato triangulo charmoso que jamais vi em qualquer outro lugar. Seja honesto, acha que existe outras cidades que não no Alasca com casas triangulares e alces na porta?
— Alces talvez — disse ele rindo — mas admito que nunca ouvi falar de outro lugar com essa estrutura para moradia.
Não caminhamos por muito mais tempo até avistarmos o restaurante. Com uma estrutura toda de madeira e largas e longas janelas de frente para floresta, o lugar era realmente aconchegante. E bonito.
Entramos e escolhemos uma mesa de canto perto da janela, Kari cumprimentou os funcionários que ficaram felizes por vê-lo ali. Pedimos uma porção de costelas e fritas e ficamos conversando com o dono do restaurante, que parecia conhecer bem meu companheiro, até que a comida foi servida.
— Então, sem querer ser curiosa, mas me disseram que você tinha um helicóptero e nós viemos de avião. É seu também?
Kari me sorriu recostando-se na cadeira.
— Sim, tenho um avião, um helicóptero e meu pai tem um barco de pesca.
— Que legal! É algum tipo de negócio de família?
Eu tinha que perguntar, primeiro porque estava realmente curiosa, e segundo, porque eu ainda estava pensando no desafio que me foi proposto, queria ver como Kari reagiria, se falaria abertamente, ou se fugiria das minhas perguntas. Mas ele não fez nem uma coisa nem outra. Respondeu minha pergunta de forma bem casual.
— Meu pai e meu tio são pescadores, eu também na verdade, mas depois de um tempo percebi que podíamos ter um alcance maior se entregássemos nós mesmos as pescas aos compradores. Assim, eu fui atrás de um helicóptero e depois de um avião. Vai descobrir que é bem complicado chegar em alguns lugares sem um transporte aéreo por aqui. Especialmente no inverno.
— Bem, imagino que para você seja mais difícil já que não deve se ater somente a Anchorage em suas viagens. Eu pretendo ficar por aqui, e só voltar para o Brasil de vez em quando para algumas visitas, sabe? Até seria legal explorar outros lugares no Alasca, mas pretendo estabelecer minha rotina nessa cidade mesmo.
— Bem, aconselho então a ir visitar sua família antes do inverno. Muitas estradas ficam fechadas nessa época, mesmo em Anchorage, e dependendo das temperaturas, os aeroportos também não funcionam.
— Não funcionam? Como assim?
Senti meu coração apertar um pouco no peito. Eu estava feliz por finalmente estar no Alasca realizando um sonho antigo de morar em outro pais, em um lugar frio, mas era bem mais simples conceber essa ideia partindo do princípio de que eu não estava presa e poderia voltar para minha casa sempre que eu desejasse. Somente saber que eu não estava presa já me dava segurança em relação a decisão que tomei. Por isso as palavras de Kari me fizeram estremecer.
— As tempestades de neve se tornam muito intensas e os ventos muito fortes para se pilotar um avião Anne. O risco de acidentes é grande, por isso eles não funcionam.
— Mas você pilota não?
— Só em casos extremos. E mesmo assim, é preciso ter bastante atenção.
Não consegui disfarçar minha preocupação com o assunto, Kari no entanto, preferiu falar de outra coisa, perguntando mais sobre como estava sendo minha adaptação e o que eu estava achando do novo emprego.
Aceitei o rumo da conversa com facilidade, no fundo, apensar de não ter gostado da notícia, eu só precisaria me organizar melhor para lidar com o inverno. Eu esperava poder passar o Natal com minha família, mas talvez o carnaval fosse uma opção melhor. Podíamos ir para alguma praia todos nós e curtir uns aos outros debaixo do sol. Eu ia gostar disso.
Ficamos um bom tempo jogando conversa fora, e vez ou outra o dono do restaurante, Phil, se juntava a nós. Mal vi o tempo passar, só reparei que já era tarde quando ouvi as vozes animadas de Aspen, Fiona, Eira e Dimitri se aproximando. Aparentemente Aspen foi quem ganhou a aposta, e estava bastante orgulhoso de si.
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Temido Inverno
RomanceAne decidiu que era hora de realizar seu sonho, uma viagem para o Alaska sem data para voltar. Contudo, apesar de já ter viajado antes para países gelados, a garota tem dificuldades para se adaptar ao clima, e a estação de inverno se aproxima a amea...