Flores no Regaço

Capítulo Único

Tão sutilmente Dr. Santiago se sentara ao nosso lado. Sua esposa, Capitolina, nos fitava de maneira calculada. Enquanto isso, Lídia parecia imersa em pensamentos, num devaneio intenso que parecia ininterrupto.

Capitolina e Dr. Santiago tinham se conhecido de uma forma simples e logo se casaram. De fato, eram de famílias distintas e soavam como inimigas, contudo, o matrimônio ocorrera com sucesso, mesmo que certos boatos corressem desmedidos.

Se eram boatos ou não, pouco se sabia. Lídia disse, certa vez, com escárnio excessivo, sobre as tardes tomando chá na casa de Escobar. Talvez os chás fossem algum código diferente para o que quer que fizessem. Não rendi, mesmo que tivesse uma curiosidade mórbida por um segredo que Lídia desejava contar e não tinha espaço para tal.

Quincas, tragando fumaça do cachimbo, permanecia em uma conversação quase destemida com Dr. Santiago. Eram de praxe os encontros tarde da noite, às sextas-feiras. Os homens ficavam a jogar baralho, as mulheres passeavam juntas, por assim dizer.

Havia me casado com Quincas. A muito contragosto e pressão de ambos os pais. Quisera e muito desistir do casório de última hora, contudo, a coragem me faltou. Aos poucos aprendi a sobreviver com uma relação fatídica. Era um homem generoso, ao menos. Entretanto, irritavam-me profundamente as críticas e a vontade tão grande de que eu gerasse um filho.

Lídia havia sido a primeira a fazer parte das nossas noites, juntamente com Brás Cubas. Sabia-se, por baixo dos panos, sobre o caráter duvidoso de um Cubas mulherengo e charlatão. Pouco se falava, entretanto. Eram um casal distante, frio e regado a álcool. Havia ali mais casamentos falidos que qualquer outra coisa. Todavia, era um Cubas!

Nunca pude compreender com tanta clareza como funcionavam os casamentos. Os que observava de perto eram nada além de um pedaço de papel que permitia bons dotes e uma vida tocada a dinheiro. Até mesmo o meu funcionava assim. Minha família e a de Borba se entendiam bem e ambos desejavam nada além de uma boa quantia de dinheiro, no fim das contas.

Acostumei-me a ver as coisas sob uma nova perspectiva. Sabia que me casei com um sovina de primeira. Então, nem mesmo a condição financeira era tão importante. Tínhamos de manter as aparências, mesmo que soubesse de como ele desejava Lídia ou qualquer outra mulher na qual colocasse os olhos. Não me era novidade que Quincas estava frequentemente com outras mulheres. Mas não me importava o suficiente para agir em favor disso.

Ao menos assim as pressões sobre a chegada de uma criança diminuíram. E os seus toques ásperos não eram tão frequentes. Soava como um alívio, ainda que a reputação baixasse a cada dia. Contudo, fingia-me de boba, como se nada visse, sentisse ou ouvisse. Fingiria surpresa se preciso fosse.

Qualquer coisa para estar, no mínimo, distante de Quincas.

Eu sabia que não estava sendo desgostoso somente para mim. Ora... Lídia e Brás se olhavam como se pudessem se matar a qualquer momento. Ela parecia odiá-lo com toda a força que o pequeno e franzino corpo podia guardar. Seus olhos taciturnos às vezes também eram expressivos e quentes. O calor poderia variar entre o ódio, o desejo, a felicidade e toda a variedade de tons de bom proveito para as mulheres.

O Dr. Santiago amava a companhia de ambos. Era um homem um tanto quanto retraído na companhia de mulheres. Trocava, constantemente, cartas e palavras com os sujeitos. Contudo, via-se que a principal presença que lhe enchia o peito de alegria era a de Quincas, este recíproco de muito bom grado. Tratavam-se como reis, em uma dinastia impositiva para conosco.

Assim eram as noites, preenchidas por um clima fútil e vazio. A conversa dos homens era um retrato daquilo que tanto criticamos no mais profundo de nossos íntimos. Recordava-me de como tentavam nos excluir de tudo que fosse ligado à política, economia e o que mais tivesse. O Dr. Santiago enxergava Capitolina como uma completa ignorante e assim o faziam Quincas e Brás com as respectivas esposas.