Sangue e Dever

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“Você está lindo, querido.”

A voz de Rhaenyra fez pouco para livrá-lo de seus pensamentos caóticos enquanto as empregadas o ajudam a terminar de se vestir de preto para o funeral de seu senhor marido. Eliminando rugas imaginárias em suas roupas e penteando cabelos que, afinal, não vão ficar intactos. Ele tem uma longa jornada nas costas de Arrax.

Em seu peito há um suspiro que quer se libertar por seus lábios, mas Lucerys consegue conter esse desejo e sorri para sua mãe através do reflexo de seu espelho. O sorriso não é totalmente sincero e seu olhar mostra seu cansaço, mas ela acha que é convincente o suficiente porque sua mãe retribui o pequeno sorriso da mesma forma.

 “Obrigado, mãe” – ele responde, movendo inconscientemente os dedos dentro de uma luva preta – “Embora eu continue firme em minha crença de que a melhor coisa para Aemon é permanecer em Pedra do Dragão com seus tios Viserys e Aegon, sei que Rhaenys cuidará deles por alguns dias.”

Lentamente o sorriso de Rhaenyra some do seu rosto e com um gesto firme de suas mãos, ela dispensa os servos que com um aceno de cabeça saem do quarto do ômega em silêncio. A porta se fecha com um som suave, quase inexistente, mas o toque faz Lucerys estremecer.

A filha mais velha do falecido rei Viserys fecha a distância com o filho e segura o rosto dele nas mãos. O toque é suave e amoroso, mas também firme. Diante de seus olhos, Lucerys acredita que vê a Rainha que ela está destinada a ser mais cedo ou mais tarde.

 “Aemon é seu filhote, o sangue dos Targaryen corre em suas veias. Já existe um dragão sob seu comando e um dia ele será o Senhor de Driftmark...” – diz ela com uma voz que não permite nenhuma discussão – “mas ele também é um Lannister e é seu dever estar com seu povo agora que seu pai está morto.”

Lucerys franze a testa e fecha os olhos por um segundo. Seu pai, sua mente repete a palavra enquanto ele pensa em outra pessoa. Merda.  

 “Ele é apenas um bebê.”

 “Não será para sempre” – diz Rhaenyra, com as mãos agora nos ombros dele. – “Além disso, tenho certeza que todos vão querer vê-lo novamente depois de tantas luas.” – Sua mãe é inflexível e Lucerys perde um pouco a batalha dentro de si, afinal ele duvida que possa faze-la mudar de ideia sobre Aemon. 

 “Talvez você esteja certa” – ele admite.

Rhaenyra acena com a cabeça, inclinando-se e beijando sua testa suavemente. 

Talvez não seja tão ruim, ele pensa com amargura cruel.

Lucerys mostra um rosto suave, uma leve carranca e um sorriso gentil para aqueles que o procuram para dar condolências vazias pela morte de seu senhor marido.

Um criado esguio enche sua taça de vinho, seus passos cuidadosos enquanto vários olhos maldosos os observam à distância. Seus cabelos loiros e fofos caindo livremente em suas cabeças, como verdadeiros leões. Auras frias e murmúrios mal disfarçados sob a brisa que se esgueira pela grande sala. 

Não é a primeira vez que ele visita a Casa Lannister, nem é a primeira vez que tantos senhores e senhoras Lannister vêm até ele ou seu filho toda vez que ele decide sair de casa, mas é a primeira vez que ela chega sem a companhia do marido, com vozes abafadas ao seu redor apontando com desdém para o pobre viúvo ômega de Driftmark. Estrangeiro é o que não dizem em voz alta. Uma pequena parte de Lucerys só quer ir embora, para nunca mais voltar. 

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