15 de julho.

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Por mais que fosse inverno, o tempo estava bem quente hoje. A máxima era de 32° e eu já podia sentir o cheiro ruim que os transportes públicos ficariam.

Eu estava no meu horário de almoço, conversava com um colega sobre diferentes assuntos, até que ele tocou em um que me deixou bem animada. - Vai ter uma festa, de um cara que eu conheci.

- Que cara é esse que você conheceu? No grindr só tem homem estranho. - Disse enquanto tomava um suco natural de manga - Mulher, ele não é estranho não! - Exclamou - Só é um pouquinho excêntrico.

- Aah...

- Presta atenção! - Disse puxando o meu rosto para ficar colado no dele, franzi as sobrancelhas por estranheza - você está solteira, é uma sapatona maravilhosa, e lá vai estar cheio de mulheres bonitas e que você pode beijar e quem sabe ter algo a mais! A sua paixonite do metrô está te deixando encalhada!.

- Ela não é só uma "paixonite" - falei baixo a última palavra - eu ainda vou namorar ela.

- É, amor, - riu - mas primeiro ela precisa saber que você existe.

Ri dele enquanto revirava os olhos e saímos andando porque ainda faltava três horas de expediente. [...] Eu não diria que era feia, pelo ao contrário, eu me achava muito linda, não tanto como a minha paixão do metrô, mas eu era bonita. Tinha o cabelo raspado e descolorido, era apaixonada por tatuagens, então tinha mais de trinta espalhadas pelo meu corpo. Minha pele era negra, mas não retinta. O meu rosto tinha algumas sardas que passavam por toda a minha bochecha e nariz, havia um piercing no septo com uma jóia bem delicada, meus olhos eram castanhos claros e meus cílios eram enormes e bem preto, então eu nunca passava rímel. Para fechar, a minha boca era rosada em formato de coração e um pouco grande, mas que combinava perfeitamente comigo, resumindo, eu sou linda.

Tive algumas namoradas pelos meus vinte e dois anos de vida. Sempre foi algo que durava menos de seis meses, nunca me apaixonei por nenhuma delas, esse foi um dos fatores determinantes para isso. Elas não queriam apenas sexo, o que era meu caso, então sempre que cobravam muito de mim eu dizia para cada uma seguir o seu caminho e continuava com a minha vida. Entretanto, desde que vi ela, ninguém despertou mais o meu interesse e para beijar alguém eu tinha que estar muito carente ou muito bêbada - geralmente a segunda opção vencia - mas mesmo assim eu ainda sentia pouquíssimas coisas. Todo dia era uma euforia diferente para ver o que ela estaria vestindo, já que ela nunca repetia nenhuma roupa. Tinha muita vontade de chegar nela e falar que eu a achava maravilhosa e se ela aceitaria sair comigo, porém pensando nas opções prováveis, ela certamente não aceitaria sair com uma estranha que acabou de conhecer no metrô, pelo menos era o que eu pensava e achava o certo.

Quando deu a hora do meu expediente, exatamente às cinco e meia da tarde, me despedi de alguns amigos e marquei com eles o ponto de encontro para aquela festa que iríamos no dia seguinte, já que hoje era sexta. Caminhei tranquilamente pelas ruas enquanto nos meus fones de ouvido tocavam Malandragem da Cássia Eller, cantarolava algumas partes da música até que cheguei ao ponto de ônibus. Enquanto eu esperava, a fila de pessoas só aumentava e eu torcia para conseguir ir sentada no ônibus e estudar algumas coisas da faculdade, infelizmente isso não aconteceu. Quando o ônibus chegou, ele tinha mais gente do que o de costume, então eu fui em pé até chegar na CPTM, isso já era seis horas da tarde, tentava focar na música que passava pelos meus ouvidos, mas a minha cabeça só pensava em vê-la. Minhas mãos ficavam geladas, e a barriga se revirava em antecipação. Assim que o meu metrô chegou, me encaminhei para o "nosso" ponto de encontro, porém ela não estava lá. Duas pessoas totalmente aleatórias estavam sentadas na onde eu e ela sentamos diariamente por seis meses.

Fiquei um pouco envergonhada pelo modo que estava agindo, então apenas suspirei pesadamente e encostei na parede. Algumas paradas depois, um cheiro muito bom invade as minhas narinas. Era um perfume doce, mas ao mesmo tempo agradável de se sentir, quando olhei para os lados tentando descobrir de quem era, eu vi que o cheiro vinha dela. Foi impossível não formar um pequeno sorriso no meu rosto quando a vi. Ela devia ser, pelo menos, 3/4 centímetros menor que eu e tecnicamente eu gostava dessa diferença. Hoje ela se encontrava com os cabelos soltos e descoloridos, da mesma cor que o meu e sorri por conta disso, o rosto estava sem maquiagem e se encontrava usando uma armação de grau. No corpo vestia um cropped marrom, com uma calça bege larga e um tênis preto que parecia ter um salto. Nas mãos se encontrava com um livro, Carol, fiquei surpresa já que era um livro lésbico e sem querer, as minhas expectativas subiram lá encima.

Como estava cheio de pessoas, ela olhou para os lados tentando achar algum lugar que pudesse ficar e consequentemente, na minha frente estava livre. Ela olhou e pareceu exitar, mas por fim veio e ficou na minha frente. Sua cabeça ficava na altura do meu pescoço, então ela tinha que olhar um pouco para cima se quisesse falar comigo.

Fiquei paralisada pelo fato de como estávamos próximas, a música nos meus ouvidos passava distante e tudo que eu conseguia fazer era olhar para ela e ver seu rosto lindo. Tudo era perfeitamente colocado em seu rosto, fiquei ainda mais atordoada pelo cheiro de coco que estava presente nos seus cabelos. Com a voz baixa, disse: - Com licença, teria algum problema se eu ficasse na sua frente?. - Tirei os fones de ouvido e com um pequeno sorriso respondi - Não, problema nenhum! Está mais cheio que de costume hoje.

- Sim, verdade..

Eu queria muito puxar assunto com ela, mas não sabia o que dizer. Então para não ser incoveniente me forcei a ficar calada e apenas aproveitar aquela proximidade que estávamos tendo. Enquanto ela se encontrava lendo e segurando em um ferro que estava atrás de mim, uma mulher muito agitada passou empurrando todo mundo e empurrou ela também fazendo com que seu corpo batesse com tudo sobre o meu. Minhas mãos foram diretamente para sua cintura e as suas se prenderam na minha blusa. Nossos olhares se encontraram e ficamos paradas nos olhando por pelo menos um minuto.

Eu agradeci imensamente pela agitação daquela mulher.

Seus olhos castanhos escuros se arregalaram quando percebeu a situação que estava. Se soltou de mim e a minha mão passou devagar pela sua cintura e a pele quente e macia fez as minhas mãos formigarem. Ela se arrumou e um pouco envergonhada pediu desculpas, eu ri e disse que não tinha problema algum. Um tempo depois, a estação dela chegou. Ela se despediu e pediu desculpas e obrigado novamente, eu sorri e fiquei com esse sentimento de felicidade até a hora que cheguei em casa e fui descansar.

26 de janeiro. Onde histórias criam vida. Descubra agora