Capítulo 11 - A cortina desabou, o sonho acabou

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Levou pouco tempo para Gael e Jace se tornarem melhores amigos. A princípio, os pais do garoto rico não eram a favor de que ele fizesse amizade com o filho dos trabalhadores da fazenda, no entanto a insistência do pequeno acabou fazendo com que eles cedessem. Prometendo que só sairia para brincar depois que fizesse os trabalhos da escolinha, Jace sempre ia encontrar Gael depois do almoço, trazendo consigo alguns de seus brinquedos caros e que o outro não conhecia, assim como alguns doces no bolso. E então, por horas e horas, eles corriam pelos imensos campos da fazenda, pulavam nas poças de lama e mergulhavam no lago nos fundos da propriedade. Aqueles dias eram repletos de felicidade, tanto para o garoto que vivia em condições precárias quanto para o garoto rico que nunca havia tido um amigo como aquele.

E assim, os meses foram se passando.

Jace se tornou frequentador da casa de Gael e nunca se importou com o quão simples ela era, pelo contrário, se sentia mais confortável ali do que em sua casa enorme. Quando nevava, os dois brincavam lá dentro, em frente ao fogão à lenha. Jace tinha uma coleção de guardas feitos de plástico, enquanto Gael tinha providenciado seu próprio exército com arames, tampas de garrafa e tudo o mais que ele encontrou. No fim das contas, os bonecos feitos por ele eram mais potentes que os de plástico comprados, por isso não era incomum que os pais de Gael pegassem os dois brigando sobre quem ficaria com o exército de arame e tampinhas.

No sexto aniversário de Jace, Gael deu a ele seu próprio exército de arame e tampinhas e depois disso eles nunca mais brigaram. Naquele aniversário ele também ganhou um monte de presentes caros de seus familiares, mas nenhum deles tinha superado o do amigo. Naquele dia, depois que todos os parentes tinham ido embora, Jace pegou um pedaço grande de bolo e o levou para os fundos do terreno, para comer junto de Gael e celebrar seu aniversário com o melhor amigo.

Na primavera, Gael perdeu o medo de cachorros depois de Jace insistir que os animais da fazenda eram bondosos. Quando os dias se tornaram menos frios, Jace costumava visitá-lo depois da escola com seus livros para ensinar a ele o que ia aprendendo. Ele já era letrado, enquanto Gael não sabia ainda o alfabeto, afinal de contas nunca tinha frequentado uma escola. Ao invés disso, passava o tempo todo criando coisas com o lixo que encontrava, se mostrando muito inteligente desde jovem. Graças a esse tipo de inteligência, ele tinha pouco ou nenhum interesse em aprender a escrever, mas Jace lhe jurava que para ser uma pessoa bem-sucedida no futuro e comprar a liberdade de seus pais, ele precisava aprender aquilo. Então, ao invés dos trabalhadores se depararem com as duas crianças correndo por toda a fazenda, Jace se dedicou a ensinar Gael a ler e escrever naquela primavera.

Quando chegou o verão, Jace teve férias da escola, o que significava mais tempo para brincar ao ar livre. Não era incomum que os pais de Gael tivessem que gritar por ele na hora do jantar, enquanto os empregados da fazenda vinham ordenar que Jace se recolhesse. Quando fazia sol, eles brincavam no lago o dia inteiro, até suas mãos ficarem murchas. Quando chovia, eles pulavam nas poças d'água à procura de sapos, que sempre assustavam o garoto rico, mas encantavam o pobre. Para evitar que Gael ficasse doente, Jace tinha até lhe comprado uma capa de chuva amarela igual a sua, então tudo o que se via naqueles dias completamente cinzentos eram dois pontos amarelos correndo de um lado ao outro.

Com a intimidade, os pais de Jace até mesmo se acostumaram a ter Gael na casa deles, seja para brincar ou mesmo para o almoço. Eles não eram do tipo que tinham repulsa de seus empregados, claro que também não queriam nenhum deles perto de sua casa. No entanto, Gael era apenas uma criança e não fazia mal algum convidá-lo para algumas refeições e deixá-lo aproveitar um pouco das regalias que ele nunca tinha. Naquela casa, ele comeu todo o tipo de comida requintada que nunca antes tinha provado, ouviu música clássica pela primeira vez e dormiu em um colchão confortável, dividindo a cama com seu pequeno amigo quando as noites eram chuvosas e turbulentas, os dois debaixo do cobertor fazendo dele um forte que os protegeria dos monstros da tempestade. Aquela era uma vida que ele nunca imaginou que viveria, mas que amava mais a cada dia.

Reinos de Ouro e Sangue II - O Príncipe do GeloOnde histórias criam vida. Descubra agora