01 | F de muito ferrada

376 56 282
                                    

Renascimento

Em algumas religiões, acredita-se que uma alma encarna diversas vezes em corpos diferentes, até que as dívidas de suas vidas passadas estejam quitadas e seus erros consertados. Entretanto, quando eu morri para o meu antigo eu e renasci para o meu novo, definitivamente não queria ter que reviver uma vida na qual já havia passado, mas, ainda assim, cá estava eu, encarando meu rotineiro inferno particular.

Ritter Beard High School.

A escola à minha frente tem uma arquitetura moderna e inteligente, aproveitando bem cada espaço do prédio. Sendo considerada o melhor colégio de ensino médio do condado de Nova York, Ritter Beard foi frequentada pelos maiores empresários e filantropos do estado. Aqui, ou você estuda como um desgraçado ou vende sua alma para o diabo e passa de ano. E, internamente, sinto que sempre vou estar inclinada para a segunda opção.

Parando em frente à porta de madeira lustrosa da professora Diana, nem sequer tive que bater para que ela pedisse que eu entrasse.

— A senhora me chamou?

Diana é minha professora de cálculo avançado e uma das mentoras que escolhi para as cartas de recomendação da faculdade.

— Bom, Ivy, antes de fazer a devolutiva da última prova, decidi conversar com você — disse ela, depositando uma folha de papel em cima da mesa, com um grande "F" em vermelho estampado. — É sua segunda nota vermelha seguida, Ivy. Está acontecendo algo que queira conversar? Talvez algum problema familiar?

Fechando meus olhos por um instante, esmaguei o tecido da saia xadrez que vestia, tentando mascarar minha frustração.

— Não, professora, acho que só estava no mundo da lua no dia da prova — falei, vendo-a assentir.

— Você é uma das minhas melhores alunas, Ivy, se não a melhor. Se sua nota não subir para pelo menos um B, você será rebaixada para a turma básica.

Merda.

— Estarei novamente no quadro de alunos de destaque no próximo bimestre, não se preocupe, professora — falei, sorrindo para ela, que finalmente me liberou daquele ambiente sufocante.

Caminhando pelo corredor de maneira atordoada, uma memória distinta rondava meus pensamentos. Uma vez, quando mais nova, ensaiava pela vigésima vez o mesmo acorde, e papai, já um pouco impaciente, se aproximou e me perguntou por que eu o estava repetindo tantas vezes, se a melodia já soava bem. Minha resposta até hoje ronda meus pensamentos: "O bom não basta, papai, tem que ser perfeito." E desde então, minha opinião não mudou.

Demorei muito tempo para aperfeiçoar minhas técnicas de ser a filha perfeita, a aluna perfeita, a neta perfeita, a pessoa perfeita. Isso soa um tanto engraçado, já que eu definitivamente estou longe de ser perfeita, mas, se faço as pessoas acreditarem que sou, isso basta. Porque não ser perfeita significa ter falhas, e ter falhas faz de você fraco, e, se você é fraco, será facilmente apunhalado. E eu nunca mais aceitaria ser apunhalada.

Voltando à realidade, senti meu corpo esbarrar em algo, e o que eu acreditava ser uma coluna na qual eu não havia prestado atenção se revelou um peito duro como pedra, irradiando um calor humano quase infernal. Jackson me encarava com o cenho franzido. Seu cabelo estava bagunçado e seu uniforme de esporte moldava seu corpo, revelando um físico que, com certeza, custou meses para ser construído.

— Devia tirar uma foto, dura mais, Raio de Luz — sorriu sacana, fazendo-me recuar com nojo e revirar os olhos com desdém.

— Acho que anda treinando muito o ego e pouco as canelas — disparei, ácida.

— E você tem treinado muito a língua e pouco o cérebro, não é mesmo, Ivy? — respondeu, inclinando-se na minha direção. — Alguém vai sair da turma de cálculo avançado — sussurrou, saboreando cada palavra.

Meu rosto esquentou, e eu tinha certeza de que minhas bochechas estavam vermelhas. Jackson sabe como me tirar do sério e se diverte muitíssimo com isso. Desde quando pisei nesta escola, ele nunca me deixou em paz.

Dois anos atrás

Quando o sinal bateu, indicando que era hora de ir embora, eu quase agradeci a Deus. Caminhar pelos corredores se tornara um tanto irritante. Não é como se eu não estivesse acostumada com atenção, mas aquilo, em excesso, estava começando a me tirar do sério. Meu primeiro dia de aula de volta a Manhattan se tornou um porre.

Parando em frente ao meu armário, guardei meus livros com cuidado e, quando fechei a porta, me deparei com Jackson escorado no armário ao lado, com os braços cruzados. Chegava a ser patético o quão alto ele havia se tornado, como seu rosto ficou tão anguloso, ou até mesmo o quão bem delineado seu corpo é. Tudo nele era tão diferente agora.

— Por que você voltou, Blake? — sua pergunta curta foi feita em um tom que transmitia um ódio reprimido, o que internamente despertou em mim uma sensação que pinicava as palmas das minhas mãos.

Jackson Scott, estava novamente à minha frente. Aquele que um dia foi meu melhor amigo, agora me encarava como se eu fosse um verme, uma pedra no sapato que precisava ser eliminada.

— Da última vez que chequei, não lhe devia nenhuma explicação — respondi.

Impulsionando seu corpo para frente, Jackson se afastou do metal e caminhou em minha direção, parando perto o suficiente para que as pontas dos seus sapatos roçassem os meus.

— Tsk. Essa língua ainda te trará problemas, Blake — sorriu maníaco, erguendo a mão. Franzi o cenho quando ele segurou uma mecha do meu cabelo, a qual enrolou em seu dedo sem pressa. Era como se quisesse ter certeza de que eu era real. — Agora responda à pergunta — pediu ele, com uma suavidade que contrastava com sua postura anterior.

— Eu já lhe disse. Não. Te. Interessa — pontuei cada palavra, vendo seus olhos brilharem pelo desafio.

— É assim mesmo? — perguntou, e eu cruzei os braços, sentindo-os tocar sua pele através do uniforme. — Certo... então, deixe-me avisar que você cavou sua própria cova, Blake. Eu vou destruir você e essa atitude.

Rindo, como se estivesse louca, aproveitei sua proximidade para sussurrar em seu ouvido:

— Eu quero ver você tentar.

Minha resposta fez seus lábios se curvarem em um sorriso.

Você está tão ferrada, Raio de Luz.

— Você está tão ferrada, Raio de Luz

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

_____

Depois de meses sumidas olha só quem voltou 🤭

Foi quase dois anos sem atualizações, mas agora estou de volta, espero que gostem dessa nova versão e que se divirtam lendo tanto quanto eu me divirto escrevendo.

XOXO 💋

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: 5 days ago ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Um plano quase perfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora