prólogo.

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⋆·˚ ༘ *

Estar em Pandora pode ser aterrorizante para um humano. Banshees, com suas asas imensas e gritos lancinantes, Direhorses, com seus cascos pesados e velocidade impressionante, e Tukruns, ágeis e implacáveis, todos eram criaturas capazes de matar num instante. Mas, se eram tão letais, por que também eram tão fascinantes?

Winter Farrington apoiava o queixo na palma da mão, os olhos fixos na janela reforçada à sua frente. A selva bioluminescente se estendia como um oceano vivo, pulsante. Cores vibravam sob a luz de Pandora, e cada movimento entre as árvores a fazia prender a respiração. Ela queria tocar aquilo tudo. Sentir o vento no rosto, pisar naquela terra úmida, ouvir os sons sem que um vidro separasse seus ouvidos do mundo real. Mas ela nunca esteve lá. Nunca.

O máximo que conhecia de Pandora eram os relatórios científicos, os vídeos de expedições e as histórias dos soldados que voltavam das missões – sempre contadas com um tom cruel, desdenhoso, como se falassem de um lugar sujo, perigoso, indigno de ser preservado. Mas Winter não via assim. Para ela, aquele planeta era uma obra-prima, um milagre de vida. Um paraíso do qual foi mantida afastada a vida inteira.

"Srta. Farrington."

A voz suave de Poppy a fez piscar e voltar à realidade. Virou-se devagar, encarando a mulher parada ao lado da mesa.

"Oi." Ela endireitou a postura, tentando parecer mais atenta. "Tudo bem?"

Poppy sorriu de leve, cruzando os braços.

"Tudo, mas seu avô quer falar com você."

Winter suspirou, recostando-se na cadeira. "Diz pra ele que eu já vou."

A outra ergueu a sobrancelha, ainda sorrindo. "Vai mesmo ou vai me enganar igual da última vez?"

"Eu não—" Winter desviou o olhar de volta para a janela, mordendo o lábio. "Desculpa, Poppy. Te meti em encrenca, não é?"

"Não, mas poderia."

Winter fechou os olhos por um instante, sentindo a culpa se espalhar pelo peito. Poppy sempre foi gentil com ela, uma das poucas pessoas ali dentro que não a tratavam como um fardo ou como uma peça preciosa que precisava ser protegida a todo custo. Ela era quase como uma irmã mais velha, e Winter detestava decepcioná-la.

"Certo."

Poppy se aproximou e pousou uma mão no ombro da garota. Sua voz era suave, mas firme. "Ele só quer o que é melhor para você, meu amor."

Winter respirou fundo, o coração apertado. "Ele quer me levar de volta pra Terra. E eu não quero voltar. Não quero."

Poppy hesitou por um instante, como se quisesse dizer algo mais, mas apenas apertou levemente o ombro dela. "Só... fale com ele, certo?"

"Tá bom." Ela forçou um sorriso. "Só porque você pediu."

Antes de sair, Winter lançou um último olhar à janela. A selva lá fora continuava vibrante, hipnotizante. Como algo tão lindo podia ser considerado um território hostil? Nunca conseguiu sair para ver Pandora com os próprios olhos, sentir seu cheiro, seu toque. Apenas observar através do vidro blindado da base.

Seu avô, Scout Farrington, presidente da RDA, tinha feito questão disso. Depois que o coronel Miles Quaritch perdeu a luta contra Jake Sully, a base da RDA teve que ser abandonada e destruída. Mas não totalmente. Alguns remanescentes permaneceram, mantendo operações secretas no planeta. Winter nasceu ali, sua mãe, filha de Scout, era uma bióloga em missão, ela morreu precocemente.

Winter cresceu entre paredes metálicas e corredores impecavelmente brancos, cercada por tecnologia de ponta e janelas que lhe mostravam um mundo que nunca poderia tocar. Nunca deixou a base. E tudo que mais queria era sair dali, pelo menos por cinco minutos.

Ela caminhou pelo corredor até o escritório do avô. O som de seus próprios passos ecoava pelo chão esterilizado, e seu coração batia rápido. Bateu na porta e esperou.

"Entre."

Winter girou a maçaneta e entrou.

"Oi. Queria me ver?"

Scout Farrington ergueu os olhos do que quer que estivesse escrevendo. Era um homem idoso, mas vigoroso, com olhos duros como aço temperado. Mesmo quando sorria, havia algo de implacável nele, como se seu olhar carregasse o peso de décadas de decisões impiedosas.

"Sim." Ele indicou com um gesto. "Venha me dar um abraço."

Ela caminhou até ele e o abraçou. O cheiro amadeirado familiar a envolveu, mas não trouxe conforto algum.

"Me diga." Ele começou, afastando-se levemente. "Consequentemente ou perpendicularmente?"

Winter franziu a testa, mas sorriu. "Perpendicularmente soa mais acadêmico."

"Então será perpendicularmente." Ele anotou a palavra em um caderno. "Estou quase terminando o livro sobre a fauna desse lugar."

Ela riu alto, sem querer.

"Por que a risada?" Scout ergueu a sobrancelha.

"Bem, seus soldados ainda nem entraram no coração da floresta. Aposto que nem metade da fauna desse lugar tá nesse livro."

"E o que quer que eu faça em relação a isso? Sabe que não podemos ir mais a fundo."

"Pois deveriam. Qual o ponto de virem para outro planeta se têm medo dos nativos?"

Scout respirou fundo, como se estivesse contendo a paciência. "Eles são monstros, já te disse."

Winter sustentou o olhar. "Eu não acredito no senhor."

O silêncio entre eles era quase sufocante.

"Você vai para a Terra amanhã."

Ela sentiu o estômago revirar. "Amanhã? Por quê?"

"Porque você precisa ter uma vida normal."

"Eu tenho uma vida normal."

"Não, não tem."

O coração dela batia como um tambor. "Não pode me mandar embora. Eu cresci aqui! Minha vida é aqui!"

Scout se recostou na cadeira, exausto. "Amanhã começa uma nova operação."

Winter sentiu um calafrio percorrer sua espinha. "O que quer dizer com isso?"

"Pandora será nossa."

Ela prendeu a respiração. "Nossa?"

"O povo da Terra."

O horror tomou conta de seu peito. "Vocês vão atacar os Na'vi, não vão?"

"Você é muito fraca, Winter." Scout suspirou. "O povo lá de fora é cruel. Merecem a morte, não a sua empatia."

Ela engoliu em seco. "Acho que ninguém merece a morte."

Scout riu, mas sem humor. "Pare de me fazer rir."

A garota respirou fundo, o desespero começando a dominá-la.

"Posso... pedir uma coisa antes de voltar?"

Scout estreitou os olhos. "Fale."

Winter se virou para a janela, observando a floresta viva lá fora. "Eu queria vê-la pessoalmente. Sentir o vento, ouvir o chiar das árvores..." Ela o encarou. "Só por cinco minutos."

Por um instante, o velho hesitou.

"Tudo bem." Sua voz saiu baixa. "Amanhã cedo. Cinco minutos."

Winter sorriu, o coração acelerado. "Obrigada!"

Scout a beija singelamente na testa. "Vai tomar cuidado, né?"

"Claro." Ela se desvencilha do abraço. "Mais uma coisa. Goose pode vir também? Ele adoraria sentir a atmosfera de onde nasceu."

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Only You || Lo'ak Onde histórias criam vida. Descubra agora