POV Ana
Culpada. Era assim que estava me sentindo diante da cena que presenciava. O líquido escorrendo pela roupa de Mariana e encharcando o piso da sala de aula me deixou em transe, paralisada.
- Professora, Professora Ana, PROFESSORA! – retornei à realidade ao ouvir algum dos alunos desesperado tentando chamar minha atenção.
Aproximei de Mariana, segurando sua cintura e suas mãos, enquanto ela se contorcia de dor pelas contrações que provavelmente estava sentindo.
- Pablo, rápido, ligue para o Hospital Escola e chame imediatamente a doutora Norma, Mariana está entrando em trabalho de parto, RÁPIDO! – disse rapidamente, sentindo Mariana apertando cada vez mais forte minhas mãos, enquanto gritava de dor.
A Universidade Vilassa, como uma das mais estruturadas da região, oferecia o curso de Medicina há tempos, sendo conceituado como um dos melhores cursos do país. O Hospital Escola da instituição contava com todas as estruturas necessárias para estágio e residência dos alunos e médicos formados, além de uma equipe de professores médicos renomados no mercado, que coordenavam todos os programas de medicina disponíveis. Mariana estaria em boas mãos.
Pouco tempo depois da saída de Pablo, a sala de aula foi invadida por médicos e estudantes de medicina equipados. Mariana não soltava minhas mãos, e embora sua força descomunal me trouxesse uma dor incômoda, eu mantinha minhas mãos firmes.
- Mariana, você está entrando em trabalho de parto – disse Norma, a médica ginecologista obstetra – vou precisar de toda sua concentração agora, as contrações vão ficar cada vez mais fortes, já pedi para que preparassem a sala cirúrgica, aguente firme Mariana, seu filho ou filha está a caminho, já sabe o sexo do bebê?
- Sim..... é uma me-nina – Mariana respondeu com certa dificuldade, provavelmente pelas fortes dores. – Regina... o no-me dela... AAAAAAAII – enquanto a equipe a colocava na maca, posicionei-me melhor ao seu lado, ficando mais próxima ao seu rosto, acariciando de leve sua testa suada. Logo percebi o olhar desconfiado e perdido de Mariana em minha direção.
- Eu estou aqui com você, vai dar tudo certo, a Regina está a caminho – encorajei-a emocionada, sem entender minhas próprias reações diante da situação.
- Pablo, eu quero o Pablo.... por fa-vor, chame o pai da minha filha, eu..... – dizia com dificuldade e ofegante – quero ele do meu lado, por favor! – foram suas últimas palavras antes da próxima concentração que a fez contorcer sobre a maca. Soltei minhas mãos de imediato quando a equipe passou a movimentá-la para fora da sala, colocando a maca para dentro da ambulância universitária parada próxima ao local. Olhei ao redor em busca de Pablo diante da multidão de alunos, onde estaria esse garoto irresponsável? Sua filha estava nascendo!
- Conrado, Conrado – chamei o aluno que estava sempre acompanhando Pablo pela Universidade – onde está Pablo? Ele precisa acompanhar a Mariana URGENTE!– minha voz descontrolada assustou o garoto de imediato, que digitava alguma mensagem no celular logo na sequência.
- Desculpe professora, mas o Pablo não está mais no campus, ele.... disse que... – o garoto parecia procurar as palavras certas para me dizer.
- DIGA LOGO CONRADO, ONDE ESTÁ ESSE INFELIZ? – Não estava me importando com o tom de voz e nem com as palavras ditas. Meu único pensamento era em Marina.
- Ele disse que não sabe se está preparado para ser pai..... que estava ajudando e encorajando Mariana todo esse tempo enquanto grávida, mas que agora as coisas são diferentes.... – Conrado era muito próximo de Pablo, e com certeza não estaria mentindo. Eu não conseguia acreditar. Sem perceber, meus olhos ficaram marejados de forma repentina, enquanto algumas lembranças invadiam minha mente.
Flashback on
- Eu preciso de você, fica comigo, por favor, não me deixe! Eu não vou saber cuidar dessa filha sozinha – agarrava a camisa do pai da minha filha enquanto sentia as fortes contrações em minha barriga. Eu estava grávida de quase nove meses, do meu primeiro namorado. Éramos felizes, e apesar de tudo, planejamos todo um futuro com nossa filha, e agora eu estava numa maca, prestes a entrar numa sala cirúrgica enquanto o amor da minha vida se despedia de mim.
- Eu não posso, me desculpe Ana... – foram suas últimas palavras antes de correr para fora da sala.
Eu tinha apenas 20 anos. Eu seria mãe muito jovem, estava começando o sonho de cursar Publicidade e Propaganda e tive a vida arruinada por uma gravidez indesejada, pelo menos foi assim que pensei por muito tempo, mas o grande amor da minha vida naquele período, prometeu ficar ao meu lado, e foi por isso que eu prossegui com a gravidez, pela segurança que ele havia me passado.
Nunca imaginei que seria abandonada no momento do parto e que pouco tempo depois perderia minha filha, ainda recém-nascida.
Flashback off
- Professora.... Professora Ana, você está passando mal? – A voz de Conrado me trouxe à realidade, e sem esperar, corri o mais rápido que pude até meu carro que estava estacionado próximo ao prédio de Publicidade, saindo em disparada pelas ruas do campus em direção ao Hospital Escola. Deixei o carro na única vaga disponível, mesmo distante da entrada, correndo até a recepção do local. – Mariana, minha aluna Mariana Herrera, ela deve estar na sala cirúrgica, por favor, eu preciso saber dela – Estava tão afobada que nem percebi que as lágrimas ainda corriam por meu rosto.
- Mariana acaba de entrar na sala 6, segundo andar – Não deixei com que a recepcionista terminasse sua fala, e entrei rapidamente no elevador. Ao chegar no segundo andar, corri até a sala indicada, frustrada ao ler "acesso restrito" na placa fixada na porta. – Droga, droga, droga! – a porta se abriu e Norma, que estava com seus trajes cirúrgicos, aproximou-se de mim. Lembrei que no interior das salas cirúrgicas era possível ver a movimentação do lado de fora.
- Ana, onde está Pablo? Eu não posso mais esperar, as contrações estão aumentando, é um parto prematuro, Regina tem que nascer AGORA! – aumentou o tom de voz, e eu soube naquele momento o que deveria ser feito.
- Eu vou no lugar dele, só preciso das vestimentas necessárias para que eu possa entrar na sala – eu não poderia deixá-la sozinha, mesmo com todos os gatilhos que aquela jovem trazia em minha vida.
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Além da Vida
FanfictionMariana Herrera é uma jovem de vinte e dois anos. Sonhadora, começou a cursar Publicidade e Propaganda ao conseguir uma bolsa de estudos integral devido ao seu mérito ao longo do Ensino Médio. Sempre buscou exemplos de mulheres do mercado de atuação...