Prólogo

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  Na minha opinião existem memórias tão fortes que nada, nem ninguém pode apagar. As vezes estão perdidas em meio a outras, mas ainda estão lá. E cada dia vão ficando mais turvas. Mas mesmo assim, você jamais se esquecerá delas.

Algumas são boas. Do tipo que você não consegue parar de sorrir só de lembrar. Boas de um jeito estranho. Como se fossem uma referência para analisar a qualidade de outras.

Algumas, nem tanto. Há memórias que te fazem chorar. Deixam cicatrizes, marcas. Que doem só de pensar nelas. Doer, arder, coisas ruins, sensações ruins. Mas geralmente, elas são associadas com as coisas boas que já vivemos. Tem aquelas que te arrancam gargalhadas. Essas, são ótimas. Mas geralmente, te dão somente uma alegria momentânea.

E,as minhas favoritas. Gosto de as chamar de verdades. São momentos únicos. Sensações únicas. Com uma beleza única. Continuam belos e te trazendo a melhor das sensações, não importa quantos anos passem. Aquele dia, foi um desses.

(...)

Estávamos em uma missa feita pela alma de nossos pais. Ambos usávamos preto. Lembro desse dia como se fosse ontem. Mas na verdade, fazem 15 anos. Da cabeça dela apoiada em meu ombro. Eu tentava ser forte, quando tudo que eu queria era desabar com a cabeça enterrada no ombro de minha mãe. E doía saber que isso jamais aconteceria novamente. Porque ela estava morta e ao menos podíamos enterrar seu corpo.

Tentava me auto consolar pensando que a situação de Esther era pior. Eu ainda teria meu pai. Mas ela... havia perdido o dela, juntamente com sua mãe e o irmão mais novo. Eu queria a abraçar. Dizer que tudo ia ficar bem. Mas não ia. Ia ser difícil. E tudo iria mudar para sempre.

No entanto, Esther tinha outras idéias sobre isso.

- Eli. - murmurou ela. Seus lábios tremiam. Seus cabelos estavam bagunçados. - feliz onze de setembro. - foi o que Es disse pra mim, ainda mergulhada em lágrimas. Seus cabelos ainda castanhos na época, estavam presos em um coque impossível. Uma bagunça. Apesar de tudo, estava linda. - O que tem de feliz? - eu perguntei, avarento. Meu humor estava uma merda, e sentia que nunca mais ia ser feliz. Porque a vida não teria mais sentido. Quem ia dizer que me amava todas as manhãs? Ou me colocar para dormir? E Seven? Quem faria isso por ela?

- Trouble, nós sempre teremos isso. - falou a garota magrela e miúda, passando o braço por minha cintura. Seus dedos estavam gelados. Ela tremia. Seu rosto estava inchado, assim como o meu. E as suas sardas, escuras e abundantes por todo o rosto pareciam maiores. Não sei explicar por que. - Agora está doendo. Vai doer amanhã. E na semana que vem. No ano que vem. Mas um dia, a dor vai virar lembrança. E vamos lembrar desse dia, como se fossemos uma espécie de sobreviventes a ele. E somos, não somos? - murmurou Es. - Vire para a frente. - pediu a menina. E percebi que estava a encarando.

- Eu não quero isso. - falei baixinho, e Esther enlaçou seus dedos nos meus. Estava com medo.

- Mas eu quero. Acho que quando o presente é ruim, seguimos em frente pensando no futuro. - A garotinha de nove anos falou tão sabiamente como uma de 20 não falaria. Como eu não falaria. - Você ainda tem Noah e Eve. Além de seu pai. Vão seguir, eu sei que vão. Então ela acabava de perder ambos os pais, mas estava me consolando? Foi nesse momento que percebi como ela era especial. E como colocava os sentimentos dos outros na frente dos dela. - E além de tudo, você tem a mim, bobinho. - sussurrou a garotinha, apertando minha mão. Seus olhos âmbar encontraram os meus, e um sorriso tímido abriu se em seus lábios em forma de coração.- Nunca vou te abandonar.

- Nem eu a você, eu te juro.

Naquele dia, fiz uma promessa. Na hora, não sabia o tamanho dela. Eu jurei jamais abandonar Esther. Logicamente, cuidar dela. E com os anos, cada vez foi ficando mais evidente minha falha. Eu a amava. E naquela época, não sabia quanto.

Eu jamais esquecerei.

Eu falhei. E não só quando a abandonei, anos depois. Eu estraguei sua vida para sempre.

Nem todas as desculpas do mundo seriam suficientes para Esther. E se hoje, eu pudesse dizer uma coisa para ela, não importando nossa distância, só falaria um "Eu falhei." . Pois todo o resto sobre mim, estou certo que ela sabe.

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