O1 - Desencontros.

245 39 37
                                    

Contado um mês após a chegada de Simone ao hospital, seu estado era estável. O medicamento fez efeito como previsto, diminuindo suas funções cerebrais em setenta por cento. Uma enfermeira checava os sinais vitais a cada três horas, a pedido da médica responsável pelo caso, Leila Barros. O que acabou mudando após a primeira semana, passando a ser observada apenas duas vezes ao dia. A loira acreditava que não havia saída, a cirurgia era complicada demais, e não realizá-la também não era uma boa opção.

Não tinham ideia de quem se tratava, quem era a mulher misteriosa deitada naquela maca. Quantos anos teria? Pelas características físicas davam acima de quarenta anos. Era casada? Os dedos não indicavam o uso de aliança ou anel de compromisso. Nacionalidade? Impossível, já que chegou inconsciente. O acidente foi nos arredores do aeroporto, não tinham como garantir se a moça era turista ou apenas retornava ao país. Então descartaram a informação, pois não podiam criar expectativas ou sequer cogitar veracidade.

Nos primeiros dias até tentaram contato com o número de emergência, Miguel Arantes, mas o homem garantiu que não tinha como ajudar com mais detalhes, apenas deu assistência desde o momento do acidente.

'Longe dali ─ não do hospital, e sim das explicações médicas ─, Simone era abraçada por um completo vazio; a mente estava presa e seu corpo servia apenas para guardá-la. Pode soar estranho, pode ir contra a medicina e ou até mesmo contra a religião. Porém, estava ali, de olhos abertos, encarando o nada, um infinito de incertezas, que fisicamente parecia uma caixa com o interior esbranquiçado.

Não havia um teto, nem paredes, tampouco chão. Não havia nada. Apenas ela. Ela em sua mais dolorosa confusão.

Na verdade, não sentia muito. Entendia que alguma coisa estava estranha, diferente, só não sabia o quê. Poderia passar a questionar sobre estar viva, morta, ou desmaiada. Porém, sua mente não conseguia formular esses questionamentos. Simplesmente existia ali, no meio, ou na ponta talvez. Era difícil dizer.

Queria falar; ou não.

Precisava respirar; ou não.

Não haviam vontades ou ações, apenas ela. Era como se algo não estivessem funcionando. Como se não pudesse se mover. Como se não quisesse. O tempo era como o espaço físico; indiferente, escasso, apagado. Minutos? Horas? Dias? Anos? Há quanto, exatamente, estaria ali? Um milésimo de segundo? Um piscar de olhos?

O silêncio não machucava, não preocupava, mas pairava como uma nuvem escura de uma tempestade, bem acima da cabeça. Martelava, chegava a ser ensurdecedor. Incômodo, constante.

E o que significava tudo isso, afinal?'

x

O calendário marcava exatos nove dias de fevereiro, a hora era a menor das preocupações, Soraya só queria mesmo deitar a cabeça contra uma superfície firme para poder descansar. O que não seria possível enquanto estivesse em meio a uma fila extensa, esperando o momento de entrar no avião.

Bom, não iria reclamar. Recebeu os trinta dias de férias ─ mesmo negando até o último segundo; não queria deixar o hospital ─ no meio do primeiro mês do ano e passou quase duas semanas em New York, dividindo o tempo entre lazer e pesquisas relacionadas ao trabalho. Conheceu pessoas incríveis, sem falar da companhia de uma certa loira, que lhe caiu como uma luva.

A médica descansou o máximo que conseguiu, pois seria um voo longo, e não queria passar muito tempo jogada na cama. Por isso se despediu da moça um dia antes de viajar, caso contrário faria qualquer coisa até entrar no avião, menos dormir.

A manhã passou rapidamente, até mais do que imaginava, e já estava prestes a pegar o último voo do dia, que ia, finalmente, até o Distrito Federal brasileiro. O celular tocou algumas vezes antes da mulher resolver atender.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Feb 10, 2023 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Enquanto você dormia - [ Simone x Soraya ]Onde histórias criam vida. Descubra agora