Prólogo

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Dentre todas as dúvidas que afetam a sociedade, a pergunta "o que pode ser considerado uma casa ou um veículo?" com certeza não é uma delas. No entanto, "em qual dessas categorias a Perua-Castor se enquadra?" poderia facilmente estar entre as questões sem resposta concreta.

Aqueles que observam por fora a descreveriam como "apenas uma van" com rodas carecas, pintura velha de cor bege e áreas descascadas ao longo dos seus 4 metros de comprimento. No entanto, por dentro, a Perua-Castor era definitivamente maior.

A entrada principal se dava pela porta lateral, levando a um pequeno saguão de passagem. A direita via-se a cozinha, equipada com fogão, geladeira, bancada, armários e uma mesa de jantar para quatro pessoas. Seguindo a frente do saguão havia a sala de estar, um confortável ambiente cilíndrico com sofá, poltronas, mesa de centro, cômodas e armários embutidos até o teto do segundo pavimento. Não fosse suficiente, as acomodações internas ainda contavam com quartos, banheiros, escritório, lavanderia, depósito e cabine de motorista.

Certamente a Perua-Castor não era um veículo ou uma casa normal, nem para os padrões de uma casa em um veículo. Toda essa esquisitice, no entanto, estava longe de ser anormal para a família Castor.

Fernando e Jana eram um casal com grande histórico de bizarrices e, nomear uma kombi como "Perua-Castor" nem sequer entraria na lista das coisas mais estranhas que o casal já havia feito.

O principal culpado pelo nome inusitado do veículo era Fernando Castor. Fernando teve uma infância marcada por acontecimentos que não tinham explicação, quando ficava bravo, pratos e xícaras se jogavam sozinhas no chão e quando ficava impaciente, as folhas do jardim rodopiavam em redemoinhos que insistiam em entrar em casa.

As coisas começaram a fazer sentido quando, aos 11 anos, a família de Fernando recebeu uma visita inusitada de um senhor com roupas engraçadas e coloridas que se identificava como representante de um tal "Ministério da Magia do Brasil", ministério esse que não aparecia nos jornais, como o ministério da fazenda ou o ministério da cultura, e apesar do nome, tampouco fazia parte do governo brasileiro.

Fernando descobriu que esses acontecimentos estranhos de sua infância eram manifestações de sua essência mágica. Mesmo filho de um casal inteiramente normal, Fernando nascera bruxo.

Junto a revelação desse mundo de bruxos escondidos das pessoas comuns, Fernando recebera a oportunidade de ingressar em uma pequena escola de magia e bruxaria local, onde aprenderia a realizar feitiços e azarações, preparar poções com propriedades mágicas, dentre várias outras coisas que o fariam "Definitivamente anormal".

Ao longo de seus anos escolares, descobriu uma forte vocação pelo estudo de fragrâncias e poções mágicas, tornando-se um bem-sucedido boticário e pocionista. O pequeno sucesso de Fernando, porém, sempre esbarrava em uma expectativa frustrada de nome "Castelobruxo".

O roteiro acontecia quase sempre na mesma ordem. Fernando conhecia um novo parceiro comercial ou cliente, os impressionava com seus conhecimentos vastos e, logo em seguida, ouvia alguma frase do tipo "Impressionante! Você estudou em Castelobruxo, aposto!"

O rumo certo dessas conversas era a decepção, uma vez que Fernando, mesmo sendo fruto de uma excelente educação e dono de uma mente brilhante, era obrigado a explicar que nunca havia colocado os pés na escola de magia e bruxaria de maior prestígio da América Latina.

Agora, em sua meia-idade, Fernando tornou-se um homem alto e magro, facilmente distinguível por seus dois dentes frontais separados e seu grande nariz achatado, e mesmo sem Castelobruxo em seu histórico escolar, se orgulhava em dizer que fora convidado para ser o mais novo colunista da renomada revista sobre poções e suas propriedades mágicas, O Caldeirão de Ouro.

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