closure - prt 1

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A neve, impiedosa, criava um grosso tapete branco do lado de fora do aeroporto. Sarah mexia em seu celular, procurando notícias sobre a nevasca que as prendia ali dentro. O Aeroporto de Bar Harbor não se comparava ao de Portland, mas Bar Harbor não era nada como a cidade mais populosa do Maine. Rolando o dedo preguiçosamente pela tela, Sarah ouvia enquanto a outra mulher andava para lá e para cá, seus saltos altos fazendo barulho enquanto ela quase gritava em seu celular. Mas, se fosse juliette freire, Sarah também estaria bastante nervosa.

Quando o convite para o reencontro da classe de 2007 do Kingston High chegou, Sarah cogitou não ir. Sempre tinha sido deslocada, a que não se encaixava em nenhuma das panelinhas do colégio. Ela não era talentosa o suficiente para o clube de artes, não era tão bonita para ser popular, não era particularmente boa em esportes e, para completar a lista de seus pecados adolescentes, eles sabiam que ela era diferente.

As pessoas notaram que Sarah era diferente antes que ela mesma percebesse. Sua mãe sempre a tratou com mais delicadeza, sua irmã sempre a considerou estranha e todo a população de Bar Harbor parecia notar que algo nela era fora de sua querida – e hipócrita – normalidade. E, aos quinze anos, Sarah confirmou o que todo mundo sabia que aconteceria, uma hora ou outra: ela era lésbica.

Não que fosse anormal por isso, muito pelo contrário. Custou, mas a sua mãe acabou aceitando que a sua filhinha não queria namorar garotos. Sua irmã deu de ombros, Jocelyn tinha descoberto antes de todo mundo o segredo de sua irmã. E Jocelyn não se importava se a sua irmã caçula beijava garotos ou garotas, contanto que a deixasse em paz. Mas, fora de sua casa, a realidade era bastante diferente.

Kingston High não era moderno o bastante para deixar que seus alunos fossem eles mesmos. Também não ajudava que a diretora do colégio fosse a mulher do pastor da cidade. Sarah era reprimida o bastante dentro da escola, temendo, é claro, que a sua sexualidade fosse rechaçada. E seus temores não eram, ao todo, infundados.

Adolescentes farejam fraqueza como um tubarão sente o sangue na água. A reservada, sempre quieta e tímida Sarah era, como já é de se imaginar, um alvo em cheio para aqueles que apenas conseguiam se sentir bem ao colocar os outros para baixo. Mas estava longe de ser a única homossexual da escola, disso ela sabia bem. Não era possível que todos aqueles adolescentes fossem heterossexuais. Ao menos alguma outra pessoa do colégio devia ser como ela.

Mas, na época, Sarah não conseguia saber. Ela não conhecia outras lésbicas assumidas, a não ser que contasse suas amigas virtuais, onde conversavam através de um fórum sobre os problemas de suas vidas. Ela não conhecia nenhum outro rapaz gay que não fosse o seu melhor amigo. E, para dizer a verdade, ele era bem fácil de notar. Gilberto nunca foi muito discreto sobre a sua sexualidade, ao contrário dela.

E, entre a multidão de alunos do último ano, a classe de 2007, havia diversas outras pessoas que contribuiriam para a falta de vontade que sentia de atender à reunião: Paul, seu ex-namorado, o cara com quem ela se forçou a ficar porque achou que poderia esconder quem era; juliette , sua ex-melhor amiga superpopular, que se tornou sua pior inimiga durante o ensino médio; Jake, o jock babaca que a atormentava todos os dias; Kelly, a capitã do time de corrida que fazia, também, questão de atormentá-la; entre tantos outros que fizeram do seu ensino médio um verdadeiro inferno.

Sarah sobreviveu. Ela frequentou uma boa faculdade, formou-se, arrumou um bom trabalho e pagava a hipoteca de um bom apartamento, que ela dividia com sua melhor amiga da faculdade em Nova York. Ela não deveria se sentir tão insegura agora. Sua personalidade tímida conseguiu se adaptar na faculdade. Ela conseguiu ser quem ela realmente era, namorou (mulheres, dessa vez, com quem ela realmente queria estar), fez amigos, frequentou festas e viveu de verdade. Sarah não mudou da água para o vinho, mas aprendeu a se impor e a não se sentir inferior por ser diferente do que o pastor e sua esposa tinham ensinado como certo durante toda a sua vida. Ela não tinha mais medo daquelas pessoas. E ela sentia muita falta de Gilberto . Queria saber tudo sobre ele, o que ele tinha feito, se ele ainda morava em Bar Harbor. Por isso que, quando o convite chegou, Sarah discutiu o assunto com Thais e ambas concordaram que não só ela deveria atender à reunião, como também mostrar que, apesar de todos aqueles idiotas, ela tinha conseguido se erguer. E, ainda segundo Thais , Sarah precisava de algum tipo de encerramento para aquela época de sua vida. Sarah não queria discutir com a psicóloga. Ela precisava mesmo disso..

one shot - SarietteOnde histórias criam vida. Descubra agora