Neji fumava um cigarro vagabundo enquanto olhava para as vacas do pasto. Sua vida sempre foi muito calma e pacífica, seu mundo sempre foi apenas o que seus olhos eram capazes de enxergar. Hinata cresceu consigo, era uma garota sorridente e doce, sua irmã mais nova sempre foi a parte mais meiga e sensível da família.
Corriam pelos pastos e se escondiam no milharal, comiam maçãs escondidos e pulavam corda. Eram uma típica família do interior, Hinata foi educada em casa apenas o necessário para que não fosse uma garota burra e não soubesse gerir uma casa. No final, se casou com um homem de boa família da cidade.
No entanto, Itachi nunca teve tudo de Hinata.
Neji se lembrava bem do dia em que convidou-a para andar de bicicleta entre as estradas de terra vermelha. A garotinha aceitou na mesma hora, pegando sua bicicleta branca, um pouco suja de barro, andando atrás dele e de um amigo, Naruto.
Os dois garotos com seus doze anos de idade andavam muito mais rápido com suas "bikes" do que ela podia acompanhar, Hinata ficava vários metros atrás, com seus dez anos de idade, forçando suas panturrilhas para fazê-las funcionar direito.
Eles pararam de andar assim que avistaram a igreja católica da comunidade, deixando suas bicicletas perto da cruz de madeira que estava pregada na grama.
"Vamos." Neji tomou a frente.
"Onde?" Naruto olhou para os dois lados. "Aqui?"
"Que outro lugar teria?" Bufou. "O padre está ocupado demais todas as tardes, bebendo no bar do senhor Harry."
O Uzumaki olhou para Hinata, que encarava fixamente o chão.
"Vai você primeiro." Deu um passo para trás.
Neji deu de ombros, agarrando a mão da irmã que estava fria como gelo, entrando dentro da igreja junto dela.
Dentro da sacristia, Hinata sempre ficava da mesma forma: quieta e submissa. Ela não fazia barulho, pelo contrário, tapava o próprio rosto com as mãos como se estivesse chorando, mas não estava; seus olhos sempre permaneciam pálidos e sem vida, igualmente ao corpo que o recebia tão rigidamente.
Saiu da sacristia fechando o zíper de sua calça, quando saiu da igreja, apenas apontou para as portas com o polegar.
"Sua vez."
Naruto também ficou pouco tempo lá dentro, e quando saíram de lá, Hinata tentava a todo custo abaixar o seu vestido o máximo que conseguia. Antes de irem embora, a pequena garota de apenas dez anos sempre olhava fixamente para a virgem Maria.
Oito anos depois o Sr. Uchiha veio a casa deles, era um velho amigo de Hiashi. Disse que estava interessado em fazer de Hinata esposa de seu filho mais velho, para honrar a amizade e a palavra que tinha com o Hyuuga. Na mesma hora fecharam o acordo.
Para Neji, isso não fazia diferença alguma, ele não precisava mais da irmã: eles já tinham outra, Hanabi. Hanabi tinha quatorze anos e era ainda mais quieta.
Hinata foi embora de casa sem olhar para trás, nem ao menos olhou em sua direção durante a cerimônia do casamento, que aconteceu na mesma igreja onde Cristo pregado era testemunha dos atos na sacristia. Neji quase gargalhou no banco da igreja quando viu a irmã do meio entrando de vestido branco e grinalda como se fosse uma virgenzinha, usando a antiga correntinha de prata que carregava o crucifixo.
Neji teve oportunidade de conversar com Itachi algumas semanas após o casamento. Ficou satisfeito ao conhecer melhor o seu cunhado, pois aparentemente ambos eram muito parecidos, mesmo um sendo da roça e o outro da cidade. Porém, os olhos de Itachi quase se tornaram vermelhos sangue de ódio quando o Hyuuga insinuou o que fazia com Hanabi e Hinata. De certa forma, Neji sabia que não era por amor nem cuidado à esposa.
Os boatos corriam soltos, mesmo que a comunicação entre pessoas distantes fosse quase escassa. Dona Teresa disse para a vizinha, que contou para o leiteiro, que contou para o dono do armazém, que contou para a Srta. Tryne, que contou para sua tia que comentou com Hiashi, que a mãe de Itachi morreu quando ele tinha oito anos e ele sequer chorou, cuspindo no olho do defunto antes de lacrarem o caixão.
De acordo com os boatos, a Sra. Uchiha não era nenhuma santa, o barulho das cintadas era ouvido por toda a vizinhança. Todavia, ninguém sabia de fato o que acontecia dentro daquela casa gigantesca.
Itachi era mesmo um pobre menino rico.
Neji não viu Hinata por quase sete anos, encontrando-a de repente na sala de sua casa conversando com Hanabi, ela nem bebia o chá em sua mão, que se derramava de tanta tremedeira.
"Vou me divorciar." Contou para a irmã mais nova. "Eu e você podemos sair daqui, tenho muito dinheiro guardado que juntei dos trocos do mercado, dos bolsos de Itachi e que roubei de sua carteira sempre que não estava vendo."
Neji segurou o riso, entrando na sala de estar. Itachi jamais deixaria a praga de sua irmã ir embora tão fácil, ele sabia disso. Hinata tremeu dos pés a cabeça assim que o viu, olhando para o chão assim como Hanabi.
"Vou deixar os garotos com você, irmã." Disse em um fio de voz. "Por favor, cuide deles até eu buscá-los."
O Hyuuga sabia que a mais nova também estava inclusa. Quando Hinata foi embora, Neji fez questão de deixar bem claro para Hanabi onde era o seu lugar: ali, cuidando de Hiashi, o pai capenga e moribundo. Ele que não o faria.
Estranhamente, no dia seguinte, Hinata voltou sorridente. Disse que ela daria uma nova chance para Itachi e que ambos tentariam ser uma família feliz mais uma vez. Pegou as crianças, que foram cuidadas com olhos de águia de Hanabi durante todo o dia, e foi embora.
Quando a irmã bateu a porta da frente, Neji viu uma lágrima escorrer pela bochecha de Hanabi.
Ele não sabia por que ela era tão infeliz, o Hyuuga sempre a pôs em primeiro lugar. Quando se casou e sua nova esposa descobriu sobre seus casos com a garota, ameaçando e gritando aos quatro ventos que o denunciaria para os homens do vilarejo, Neji fez questão de espancar Tenten até ela nunca mais poder falar uma palavra em sua vida de merda. Naquele dia, Hanabi também chorou.
Por mais estranho que pareça, uma semana depois eles receberam a notícia de que Hinata "fugiu de casa", levando a maioria das roupas, sapatos e jóias, menos os filhos.
"Que onça, sua querida irmã te deixou aqui." Neji caçoou.
Hanabi não chorou, pelo contrário, um sorriso sorriu em sua face.
"Por que está sorrindo?" Questionou, se aproximando.
"Hinata morreu."
Neji ficou sem palavras. De onde ela havia tirado aquilo? Havia certeza absoluta em sua voz.
"Bobagem." Rosnou.
"Ela não deixaria os garotos com Itachi." Ela se explicou. "Itachi descobriu e a matou."
Neji estava mudo, completamente mudo. Mas ele não podia julgar o Uchiha, Hinata era a esposa dele, era seu objeto e ele podia fazer o que bem entendesse, inclusive descartá-la.
Neji queria pelo menos sepultar seu corpo.
(...)
O cheiro de Hinata ainda estava presente na sala de estar, mas logo o perfume de madressilva se tornou podre, como chorume. Após estapear três vezes sua face para garantir que estava realmente acordado, Itachi viu o filho menor entrar na sala onde estava, já com as roupas de dormir e esfregando os olhos.
"O que faz aqui, Naoki?" Ele perguntou.
"Eu ouvi a mamãe." Disse simplesmente, olhando para cada lugar da sala.
Pela primeira vez, ele não sentiu raiva pela fala do filho, mas sim terror: estava aterrorizado. Não falou nada, apenas pegou na mão do caçula e subiu as escadas.
Na manhã seguinte, Itachi não acordou por causa da luz solar em seu rosto, mas sim pela movimentação anormal em seu quintal. Aquele som era tão irritante, esgoelado e esfolado como pele e cascalho. Abrindo a janela descobriu que se tratava de um grupo enorme de corvos logo acima da cova de Hinata. A única coisa que se passou pela cabeça do Uchiha foi: a mulher não havia dito um a um? Havia pelo menos dez corvos pousados em seu jardim. Mas o que mais o assustou foi a presença dos vizinhos na janela, todos olhando e apontando o dedo para o ninho de corvos.
"São animais antropofágicos" lembrou, com a testa brilhando o suor pelo terror. Num impulso, pegou a espingarda de baixo de sua cama e atirou diversas vezes no montante de pássaros, até todos se afastarem pela bala.
Todos os vizinhos voltaram seu olhar para sua janela, mas Itachi não ligava nem um pouco para isso. Menos frustrado, fechou sua cortina com força, entrando em seu quarto de banho para encher sua banheira. Pelo barulho, percebeu que os garotos já haviam levantado e agora a babá banhava Naoki.
Itachi começou seu dia em modo automático depois daquilo, comendo em silêncio, à mesa com os dois garotos. Ele não iria trabalhar naquele dia, mas mesmo assim levou os filhos para a escolinha. No caminho, um cheiro de madressilva tomou seus sentidos, e só havia uma pessoa com aquele cheiro de perfume em específico. O Uchiha sentiu a espinha gelar, dizendo para si mesmo que devia ter passado por um jardim florido, por isso o cheiro… abriu as janelas, mas não adiantou; o perfume vinha de dentro.
"Estou com frio…" Hayato bateu os dentes.
Itachi também estava, seu braço direito já congelava pelo frio que emanava do banco do carona, lugar que era de Hinata. A raiva cintilou em seus olhos, tirando a mão esquerda do volante para abrir ainda mais sua janela. Em apenas alguns segundos de distração, uma buzina alta e forte soou atravessando seus ouvidos como facas. Como um reflexo, girou toda a direção para o lado oposto, batendo o capô do carro em um poste.
O relincho foi ouvido por todo o bairro, o baque fez os garotos baterem seus rostos no banco de couro. O Uchiha suava, as gotas escorriam por sua testa e seu pescoço.
"Papai, eu estou com medo." Hayato confessou com a voz trêmula.
"A mamãe disse para ficar calmo." Naoki sussurrou, querendo que apenas o irmão ouvisse. Porém, Itachi também ouviu.
"Cale a boca." Mandou. "Saiam do carro."
Eles permaneceram sem se mover.
"Saiam agora!" Gritou.
Os dois saíram depressa, indo para a calçada. Muitas pessoas já estavam reunidas ali para fofocar.
Itachi estava com tanta raiva. Foi Hinata, havia sido Hinata quem fez isso, aquela vagabunda… seu coração batia descontroladamente, parecia querer sair pela boca. Como ela ousou fazer aquilo contra os próprios filhos?
Chutando a própria porta, também saiu do carro. Ele não gastaria seu tempo consertando o veículo ou chamando reboque, somente queria se livrar de tudo aquilo. Pegou os garotos pela mão, ignorou a multidão e caminhou em passos apressados até a escola dos dois.
(...)
Itachi queria dizer que não estava tão deplorável, mas estava. Naoki e Hayato foram deixados às pressas na escola, o Uchiha apenas deu as costas, sem se despedir.
Agora, dentro da igreja católica da cidade, imaginou ser o único lugar seguro o bastante para si. Hinata havia tentado contra a sua vida, contra a vida de seus filhos, Itachi ainda estava em choque.
"Eu sei que foi você." Sussurrou, sentado em um dos bancos em frente ao altar sagrado. "Eu sei que foi você, sua vagabunda."
"Não devemos falar palavras como esta, em frente a imagem da Santa Mãe de Deus." O padre o reprimiu, aparecendo no corredor entre os bancos, portando um candelabro em mãos. "Meu jovem, o que aconteceu?"
Itachi suava bicas, parecia ter acabado de correr uma maratona. Seu terno estava largado de qualquer maneira no chão, a gravata vermelha estava frouxa. O padre via claramente o terror no rosto do jovem, em seus olhos arregalados, a pele e boca pálidas, brancas como papel e o cabelo grudado em sua testa.
"Padre… o inferno existe?" Itachi questionou.
"Existe, sim, meu filho." Ele respondeu.
"Eu não quero que exista." O Uchiha se encolheu. "Vou rezar todas as noites para que o senhor esteja errado."
"O que está dizendo? É o que prediz a Bíblia sagrada!" O padre se exaltou.
Itachi apertou o tampo do banco com as mãos, estava prestes a surtar.
"Se o inferno existe, é para lá que pessoas como eu vão." Concluiu.
Sua mãe deveria estar no inferno. Se a justiça de Deus é justa e não-falha, aquela cachorra deveria estar lá. Isso significaria que Itachi a encontraria na vida após a morte…
Ele estremeceu, sua boca do estômago abriu.
"O confessionário está sempre a disposição, caso queira confessar os seus pecados." O padre afirmou, temeroso em pôr sua mão sobre o ombro do rapaz. "Pecado e inferno estão casados, até que o arrependimento anuncie o divórcio."
Aquela frase maturou na cabeça do Uchiha. Olhando para a estátua da Virgem Maria, riu estrondosamente.
"Esse é o problema, padre." Suspirou. "Eu não me arrependo."
(...)
Acordava.
Abria a janela; atirava nos corvos.
Tomava banho.
Levava os meninos para a escola.
Voltava para casa.
Jantava.
A encontrava.
Todos os dias se repetiam, como um loop infinito. Não soube quando exatamente Itachi passou a sentir a presença de Hinata ao seu lado na cama, mas se tornou tão contínuo que sabia exatamente que presença era aquela que movimentava o seu colchão e respirava ao pé do seu ouvido.
Ela respirava calma, profundamente como fazia em vida.
Ficava sempre tão frio, sua respiração o congelava até a ponta dos dedos dos pés, mas era melhor do que sentir o seu cheiro.
Ele havia parado de se importar com ela, com o passar das semanas. Era o seu fardo, mas era melhor suportar sua respiração de bosta em sua nuca do que ver a vida de seus garotos em risco novamente.
Itachi mais parecia uma bomba relógio prestes a explodir. A raiva acumulava gradativamente, os corvos não o deixavam em paz, Hinata não o deixava em paz… o ódio o consumia como fogo.
Esse era o único sentimento em seu ser, até conhecer Izumi, a filha do banqueiro. Ela apareceu em seu escritório de advocacia apenas para cumprir o determinado por seu chefe. Izumi era uma bela secretária, trabalhando por seus ideais feministas e empoderadores, dizendo para si mesma o quão independente era, correndo atrás de seus direitos. No entanto, Izumi continuava sendo uma garota de família rica que trabalhava para o próprio pai.
Ela o irritava. O irritava de uma forma tão particular que o lembrava a Hinata. A diferença é que sua antiga esposa sabia o seu lugar, diferente de Izumi.
Izumi caminhava para lá e pra cá com sua calça cáqui, se assemelhando a um homem. Nesse quesito, a Hyuuga sempre foi muito superior, sendo uma bela amostra da feminilidade. Itachi queria subjugá-la, assim como fez com a esposa.
Odiava ver o rosto tão confiante daquela mulher…
Foi fácil demais levá-la para a cama.
Mulheres como ela, sem honra alguma, precisavam apenas de uma palavra gentil e um elogio elaborado para abrirem as pernas. Agora, entre suas coxas, enterrando-se dentro dela como quem doma um animal malcriado, Itachi sentiu vontade de perguntar onde estava sua independência.
Izumi gemia como uma vagabunda em seus ouvidos. Itachi levou a mão até a sua boca, querendo que se calasse: seus filhos estavam dormindo no quarto ao lado. Sem seus gemidos, ouvia apenas o barulho de seu corpo se chocando ao dela: era tão bom se abrigar em um corpo quente após tantos meses.
"Ah, ah, ah." Novos gemidos foram ouvidos, e dessa vez não vinham de Izumi.
Os olhos da vadia estavam esbugalhados, ela soluçava de prazer contra sua mão. Itachi estava confuso, mas logo sentiu o arrepio tomar seu coração na mesma hora em que o cheiro de madressilva tomou suas marinas. Era o cheiro de Hinata, droga! Era o cheiro de Hinata!
Olhou em volta.
"O que foi?" Izumi perguntou.
"Não é nada." Grunhiu, mas ainda estava estático.
Foi repentino, o corpo frio como gelo tocou suas costas como sua própria sombra; como se quisesse se fundir a ele.
"O que foi? Não vai continuar?" Ouviu a voz doce e sarcástica ao pé do seu ouvido. "Itachi… você sempre esteve com outras mulheres, inclusive quando eu ainda estava viva. Para mim, restava apenas uma ereção quase flácida."
"Do que está falando?! Saia daqui!" Rosnou para ela, virando a cabeça para trás.
"Itachi?" Izumi chamou sua atenção novamente.
Ele balançou a cabeça. Não deixaria aquilo acontecer, ele não botaria tudo a perder. Hinata não faria mais parte de sua vida.
Voltou a estocar para dentro dela.
"Pelo menos ela é mais bonita do que nossa antiga empregada." Hinata ponderou. "Foi um ultraje para mim ser traída com uma mulher de beleza inferior."
"Hinata!" Chiou seu nome, irritado e demasiadamente frustrado. "Pare com isso…"
Izumi tapou a boca com a ponta dos dedos. Itachi, o viúvo rico e bonito que encontrou, ainda parecia lembrar da antiga esposa, até mesmo gemia o nome dela…
"Para um homem que não gosta de mulheres, você as fode até demais." A Hyuuga levou as mãos para o seu pescoço. "Ah, deve por isso. É só assim que você sabe lidar com as mulheres, não é? Porque era o único contato que você tinha com a sua mãe."
"Cale a boca, cale a boca!" Itachi finalmente saiu de cima de Izumi.
Ela se levantou, assustada. Apressada, começou a vestir sua roupa. Talvez fosse cedo demais para o viúvo se envolver com alguém, concluiu.
Itachi não conseguiu prestar atenção nela, pois foi nesse momento que Hinata se revelou para ele. Com suas roupas recatadas, cabelo perfeito mas pele pálida, olheiras roxas e olhos mortos, ela se ajoelhou à sua frente.
"É tão interessante, eu tenho sua atenção total apenas depois de morta." Riu baixo. "Itachi, como pôde se deitar com alguém como ela?"
"Era só até que a morte nos separe, era só até que a morte nos separe!" Ganiu como um cachorro.
"Que engraçado… eu morri, mas o meu ódio não." Ela concluiu, finalmente olhando em sua direção. "Não acha que o seu ódio também irá transpor a sua existência material?"
Itachi tentou tapar sua intimidade, levando um cobertor à frente de seu pênis.
"Eu não sou uma criatura tão patética quanto você." Retrucou.
Hinata sorriu, e foi quando o Uchiha pode ver a podridão em seus dentes.
"És tão perfeito que o ódio não lhe atinge?" Ela arrancou a coberta de suas mãos, deixando-o nu e exposto. "E sua mãe? Por que não a visita?"
Nu em seu próprio quarto, Itachi ficou frágil como uma donzela. Hinata estava lá, o tinha em mãos e não havia nada que pudesse fazer.
De repente a lembrança de quando ficava nu, da mesma forma que estava naquele momento, ajoelhado aos pés de Mikoto, sendo forçado a lamber "como se fosse um cachorro", de acordo com as palavras de sua mãe.
Por sorte ele não se recordava bem, durou somente até os oito anos, quando Sasuke passou a receber mais atenção. Segundo ela, Itachi estava crescendo e sua graça indo embora junto com sua juventude.
"O cachorro comeu a sua língua?" Hinata estava muito próxima ao seu rosto.
"Cachorro?" Itachi rosnou o nome do animal.
Odiava aquela palavra, odiava aquela palavra mais do que tudo no mundo…
"Essa conversa perdeu a graça." A Hyuuga se levantou. "Vou conversar com Izumi, acredito que ela seja mais calorosa que você."
Demorou alguns segundos até Itachi finalmente entender o que ela estava falando. Paralisado, sentiu o frio de Hinata o atingir, mesmo que ela não estivesse mais ali.
Apenas o barulho de algo caindo da escada o fez voltar para a realidade.
Correu para fora do quarto, cruzou o corredor e viu a cena que provavelmente seria o seu fim. Izumi estava aos pés da escada, com sua calça estúpida e a cabeça virada de uma forma anormal; seu pescoço estava totalmente retorcido. O pior de tudo era que nela estava o mesmo olhar de Hinata: sem vida.
Era o seu fim, aquele era o seu fim.
Acordou.
Abriu a janela; atirou nos corvos.
Tomou banho.
Levou os meninos para a escola.
Foi para a delegacia.
Itachi não podia ter sumido com o corpo de Izumi. Todos a viram entrar em sua casa, inclusive o bartender do bar onde estavam escutaram o seu convite. E mesmo que pudesse dar um fim na mulher, o Uchiha jamais colocaria seu corpo no mesmo solo onde estava Hinata.
Não enterraria uma meretriz junto de sua esposa, não. Ele ainda tinha uma fagulha de respeito por ela, mesmo que tivesse sido a Hyuuga que a empurrou.
Agora, afirmava sem parar que Izumi tinha caído, que ele nem ao menos estava perto do incidente. Os policiais apenas disseram "vamos investigar o ângulo; não saia da cidade." E só.
Era o castigo de Hinata? Ela queria colocá-lo na cadeia? Ela queria que seu corpo fosse finalmente encontrado pelos policiais que investigariam-no sem parar? Ela estava o punindo por se deitar com outra mulher? Hinata sempre foi muito ciumenta.
Pela primeira vez desde o incidente, desejou não ter apertado o seu pescoço. Hinata era intragável, irritante e odiosa, mas não valia a pena o seu cansaço e estresse. Devia ter se forçado a permanecer casado com ela, apenas pelos filhos. Ao menos teria uma serva com valor próprio, e não uma vagabunda qualquer como Izumi.
Céus, como ele faria para se livrar daquilo?
(...)
Seus filhos estavam cada vez mais estranhos, Naoki mais do que Hayato. Hayato estava pálido, o olhava com descrença, perguntou pelo menos duas vezes se ele era um assassino. Naoki era diferente, simplesmente não olhava em seu rosto. Não era para ser diferente, afinal Itachi já havia dado a ordem que não o olhasse nos olhos. Odiava encarar os olhos perolados de Hinata.
Mas Naoki exagerava. Não apenas não mantinha contato visual, ele virava o rosto para o pai. Quando podia, ficava de costas e não respondia suas perguntas.
"Naoki, como foi a escola hoje?" Itachi questionou, tentando obter alguma resposta pelo terceiro dia consecutivo.
Nada.
"Naoki, estou falando com você." Repetiu.
Novamente, nada.
Agarrou seu braço pequeno, forçando que olhasse para si. Em meio a isso, seu copo caiu na toalha branca da mesa.
"Naoki! Me responda, eu sou seu pai e não admito esse tipo de comportamento!" Grunhiu, exaltado.
O pequeno se encolheu, Hayato pela primeira vez correu em favor do irmão, se levantando de sua cadeira para tentar apaziguar as emoções dos dois.
"Você não é mais o meu pai!" Naoki choramingou, fungou enquanto seus olhos enchiam de lágrimas. "Você matou a mamãe, não é?"
Perplexo, Itachi soltou seu braço.
"Vá para o seu quarto. Agora!" Gritou, possuído pela fúria.
Naoki correu, subiu as escadas rapidamente. Enquanto isso, Hayato o encarava com medo latente.
Itachi contou mentalmente até três. Então, saiu da mesa e subiu alguns degraus da escada.
"Onde vai, papai?" Hayato perguntou com a voz estrangulada e falha.
"Dar uma lição em seu irmão." Respondeu com simplicidade, já retirando o cinto de sua calça.
Ele não era um homem agressivo, não mesmo. Mas se não desse uma lição no garoto agora, seria impossível fazer isso depois.
Naoki estava sentado em cima da cama com os pés repousados no chão, com os braços encolhidos no peito. O quarto estava escuro, a luz que entrou pelo corredor revelava apenas a silhueta do pai, com o cinto dobrado em mãos.
"Naoki, eu não quero que fale o que disse agora a pouco nunca mais." Pronunciou, entrando no quarto. "É uma mentira e eu não deixo que meus filhos mintam."
"Está chamando a mamãe de mentirosa?" Tentou se impor. "Foi ela quem me disse. Hayato ouviu também."
"O que está falando? Sua mãe não está aqui." Itachi rosnou, se aproximando.
"Ela nos visita todas as noites." As lágrimas vinham nos olhos do pequeno como cascata. "Ela nunca foi embora…"
Play, plaft.
Itachi não soube onde seu cinto acertou, apenas escutou Naoki chorar desesperadamente.
"Pare de chorar, você é um maricas?" Grunhiu.
"Mamãe estava certa!" A criança berrou. "Você não ama a gente!"
Os dentes do Uchiha trincaram e ele levantou a mão novamente, disposto a acertar suas costas.
Ele simplesmente não conseguiu. Seu braço estava paralisado no ar, por mais força que fizesse. O pior não era isso, mas sim o aperto de gelo que se fazia em seu antebraço.
"Itachi, tenha mais paciência com as crianças." Ouviu a voz dela, irônica e sacana.
Tão rápido quanto Hinata apareceu, ela sumiu. Nem ao menos Naoki parecia ter notado a sua presença.
O Uchiha não tinha cabeça para mais nada. Com um rosnado gutural, deixou o quarto das crianças.
(...)
Hinata estava mesmo aparecendo ou era apenas fruto de sua imaginação? Ele preferia pensar que sim, seu espírito retornava. Qualquer coisa era melhor do que admitir sua própria loucura.
Itachi não aguentava mais, não aguentava…
Sentia seu cheiro todos os dias, sentia sua respiração morta em seu pescoço sempre que ia dormir, os corvos não apareciam mais somente a noite. E finalmente perdeu todo o respeito, amor e admiração de seus filhos. Naoki não o encarava mais, muito menos Hayato. Nenhum dos dois respondiam suas perguntas, muito menos respondiam seu bom dia.
Itachi foi demitido quando o escritório descobriu que estava sendo investigado pela morte de Izume. A morte dela não iria passar em branco, uma menina rica, mimada e defensora dos supostos direitos das mulheres; totalmente diferente de Hinata.
Hinata.
Ela havia tirado tudo de si, mesmo depois de morta. Perdeu seus filhos, perdeu seu emprego, perdeu sua dignidade… e estava prestes a perder sua liberdade.
Os policiais reviravam sua casa, até finalmente encontrar alguns corvos em seu quintal. Itachi pegou a espingarda para matá-lo, mas o policial já estava lá, encarando a terra remexida.
"Hinata, o inferno existe?" Ele questionou em voz alta, vendo o policial chamar outros cinco, que correram com uma pá.
"Não sei, eu nunca fui para lá." A voz dela surgiu atrás de si.
Itachi, que estava de frente para a janela, se virou lentamente para a esposa da mesma forma que o fez em seu último dia de vida.
Dessa vez, ela estava com a pele totalmente manchada, em cada parte. Sua pele sempre branca, estava infestada de manchas negras, amarelas e verdes. Sua boca estava roxa, deixando líquido putrefato escorrer pelo seu pescoço. O cheiro de madressilva foi substituído pelo cheiro de podridão.
No entanto, seus olhos continuavam no mais belo perolado.
"Eu não quero ir para o inferno…" Ele confessou. "Hinata, me desculpe. Por favor, não deixe que descubram…"
Hinata olhou pela janela. Os policiais finalmente encontravam, finalmente seu corpo fora descoberto no túmulo maldito.
Os corvos voavam em círculos ao redor da casa.
"Está chorando?" Ela questionou, levando a mão podre até o seu rosto. "Não pensei que era um maricas."
"Hinata…" Ele gemeu, desesperado.
Hinata se ajoelhou aos seus pés no exato momento que os policiais entraram dentro da casa, prontos para algemá-lo e prendê-lo.
"É melhor tomar alguma providência logo." Pegou a espingarda de sua mão assim que ouviu os policiais subirem as escadas, apressados. "Itachi… faça."
A Hyuuga virou a boca da espingarda para o Uchiha. Itachi se curvou, abrindo a própria boca e mordendo o cano de metal. Pegou a arma das mãos de Hinata, colocando seu dedo no gatilho.
As lágrimas escorreram quentes e gordas por suas bochechas. Foi impossível para Itachi não se lembrar de como era seis meses atrás, quando seus filhos brincavam pela casa e sua esposa acendia seu charuto. Talvez ele devesse ter deixado o ódio de lado, mas o homem frio e calculista que era não o deixava ver a luz.
"Vai ser rápido." Hinata afirmou, com a voz abafada pelos pontapés que os policiais davam na porta de madeira grossa.
Ele apertou o gatilho.
A última coisa que Itachi viu foi os olhos perolados de Hinata.
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O corvo preto
TerrorItachi odiava muitas coisas. Odiava quando chovia pela manhã, odiava quando as grossas nuvens negras escondiam a iluminação solar, odiava quando seus filhos faziam birra e principalmente, odiava sua esposa. Um casamento por obrigação que não lhe tr...