Chloe Decker é uma garota sortuda. Ela se casou com um rapaz como ele, mora em um apartamento luxuoso em Manhattan e possui uma carreira razoável. Eles a parabenizam por essas conquistas. Mas eles não confessam que ela o colocaria para fora se soube...
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Ela ia à lavanderia todos os sábados. Bem, desde que sua máquina de lavar por pouco não causou um incêndio em todo o andar há dois meses. Ela poderia ter comprado outra no mesmo instante em que o fogo fora controlado e seu apartamento liberado pelos bombeiros, mas havia algo peculiar e levemente nostálgico ao frequentar um lugar como àquele. As moedas antes desprezadas no fundo da bolsa, amontoavam-se em meio as chaves na tigela que fica na mesa de centro. Tornou-se meio que um ritual acordar às 8h, vestir o seu moletom mais surrado, calçar o tênis e com o cesto de roupas sujas transbordando, atravessar o quarteirão até o local. E com apenas algumas daquelas mesmas moedas, ela encontrou a desculpa perfeita para passar uma hora sentada no mesmo banco do Central Park com seu café preferido e um livro em mãos, esperando o trabalho ser feito.
A vista era linda e respirar um pouco de ar fresco na cápsula de prédios e fumaça que era Nova York, um privilégio conquistado por poucos. De onde estava sentada, ainda podia ver o sr. e a sra. Honey administrar o carrinho do melhor café das redondezas: Mrs. Honey Café. Algumas crianças correndo por entre as árvores e bolhas de sabão, bem como uma adestradora de cães passear com meia dúzia destes praticamente sendo arrastada por eles. Ela sorriu e voltou a se concentrar no livro. É mais um daqueles romances impróprios para se ler em público, mas ela não sabia disso até quase se engasgar com a bebida apenas cinco parágrafos depois e uma descrição bastante detalhada de uma posição sexual que ela nunca viu ou fez em sua vida. Ela com certeza mataria Linda.
E ela também esperava que ninguém a reconhecesse com seu velho boné do LAPD e uma bagagem de filmes que concorreram à Framboesa de Ouro como legado nas costas. Ela estava longe dos holofotes há quase três anos, mas vez ou outra encontrava fãs nos lugares mais aleatórios e sim, aquilo a lembrava de que premiada ou não, ela tinha uma carreira e pessoas torcendo por ela, mesmo que uma nuvem carregada de dúvida pairasse sobre sua cabeça em relação ao futuro.
O acidente a tinha tirado qualquer perspectiva de retorno às telas e a culpa, uma capa pesada sobre seu corpo, a impedia de seguir em frente. A memória do seu pai se engasgando com seu próprio sangue, cacos de vidro perfurando a pele que tanto lhe aquecia como um casulo em noites de tempestade quando criança, viva em sua mente.
Ela deveria estar grata, afinal, sua mãe havia sobrevivido. Poderia ter sido pior, ela poderia ter perdido as duas pessoas que mais amava no mundo ao invés de uma. É o que a sua terapeuta e melhor amiga tenta convencê-la desde então. Esse olhar para toda a coisa só a deixava com mais culpa e raiva. Por não ter levado o carro para a manutenção antes de pensar em atravessar o país, por não ter prestado mais atenção na estrada, por não ter os convencido a comprarem as malditas passagens de avião, por não ter morrido no lugar dele.
