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A infância de Enid havia sido uma desgraça por conta da separação precoce de seus pais, ela tinha somente oito anos de idade quando tudo aconteceu, e conforme ela foi crescendo, a desgraça foi se transformando em inferno e é assim até atualmente, na sua adolescência. Murray, seu pai, após pedir o divórcio, tentou lutar para conseguir a guarda de Enid e dos outros dois filhos mais novos, mas Esther, de alguma forma, conseguiu burlar a justiça e provar que o desequilibrado era seu ex marido, e não ela, quando na verdade é ao contrário.

Por Enid ser a filha mais velha e ser mulher, toda a responsabilidade que deveria ser somente da mãe, caiu sobre as suas costas muito cedo, e Esther acha que Enid deve cuidar de seus irmãos por obrigação, acatar tudo o que eles fazem em casa porque, segundo ela, "são meninos e mais novos, eles são assim mesmo". Esther sempre ignorou tudo o que Enid sentia e sente, não liga por coisas que a filha passa ou deixa de passar, parece que Enid é apenas uma servente particular que deve estar disponível a qualquer momento, inclusive à noite, quando Esther invadia o quarto de Enid, reclamava que o bebê estava com fome, aos berros, e isso atrapalhava o sono dela. Enid então passou a trancar a porta de seu quarto para que ela e nem ninguém invadisse seu quarto dessa maneira, até que um dia, voltando da escola, Enid percebeu que a porta de seu quarto havia sumido, Esther apareceu e disse que aquela era a casa dela, que todo mundo deveria seguir as regras dela, que se não estivesse satisfeito, que saísse, não existia privacidade sob o seu teto.

Aquilo tinha sido a gota d'água para Enid, estava no começo de sua adolescência, então começou a guardar tudo o que sentia, quase não trocava uma palavra com sua própria mãe dentro de casa, fazia tudo apenas na base do ódio. Começou a arranjar lugares e conhecer pessoas para ocuparem o seu tempo, então assim ela saía de manhã cedo para a escola e só voltava no fim da tarde, praticamente todos os dias, foi quando começou a onda de pichações e ingerir bebidas alcoólicas.

- Vou ao banheiro rapidinho, já volto.

Enid avisou aos amigos entrando no lugar, tinham duas meninas na frente do enorme espelho, se arrumavam e se enchiam de coisinhas, coisa que ela não tinha muita paciência as vezes. Entrou na última porta da fileira, os últimos eram um pouco maiores, fechou a porta, jogou a mochila no chão, desceu as suas calças e agachou sobre o vaso.

- Arh, que inferno de útero.

Reclamou ao ver uma breve mancha de sangue no fundo da calcinha, terminou de fazer seu xixi, se limpou por algumas vezes realmente vendo que sua menstruação tinha resolvido descer naquele dia, revirou toda a sua mochila e viu que não tinha uma unidade sequer de absorvente ali dentro, o que a fez revirar os olhos em frustração. E ela fez o que a maioria das pessoas que tem útero já fez, enrolou um monte de papel higiênico juntinho, pôs no fundo da calcinha como um absorvente improvisado e subiu sua calça outra vez, aquilo era incômodo, mas era a única alternativa no momento.

- Hum, limparam isso aqui de novo, então vou ter que contribuir com arte outra vez.

Sorriu de um jeito sacana, tirou uma pequena nécessaire de dentro da mochila, pegou uma das canetas que fabricou em casa, aquelas que tem a ponta de esponja e começou a passar por toda a divisória larga, acinzentada e insossa que tinha em todos os banheiros. Era sempre alguma ilustração sobre chato e desnecessário era o autoritarismo dos pais de forma exagerada e tóxica, o quanto que muitas regras era uma merda e que ninguém gostava de seguir aquilo, mas que a maioria seguia por medo.

Enid ouviu a porta do banheiro abrir algumas vezes, mas não se abalou por pensava ser aquelas meninas que estavam lá antes assim que ela chegou. Continuou sua pichação, estava concentrada porque o banheiro era um dos poucos lugares onde ela poderia elaborar mais uma pichação porque podia usar como desculpa que estava passando mal ou algo assim.

X4dr3z 3scol4r. |Wenclair|Onde histórias criam vida. Descubra agora