Escrever me salvou

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Do mais profundo da minha alma saem palavras que não consigo controlar. São versos de uma poesia só minha, colcha que vou tecendo a cada vocábulo escrito mas não proferido, sentimentos que vou amontoando bem no canto, empilhando para não demonstrar fraqueza. Um conjunto só meu de sonhos, cores, amores, dores. Carrossel diário que gira em um universo de emoções que contenho com medo de espantar os que gosto. São cartas escritas, escondidas, intocáveis que eu nunca mandarei, tentativas desesperadas que jamais revelarei, vontades que pra sempre eu ocultarei. Nesse templo individual no qual desenho uma história a cada dia, uma vida que poderia ter sido e que não foi, eu me resguardo de todo o julgamento do mundo, toda flecha pronta pra estourar meu balão de ilusões. Inúmeros desejos barrados na garganta, olhares contidos, com receio de expor minha intimidade. Sinto como se nunca conseguisse tocar o céu de possibilidades, como se estivessem elas presas no concreto, liberadas apenas com o tocar do sino da minha finitude. Eu me petrifico enquanto elas ganham vida, procurando me encontrar também. Somos um desejo eterno que vê sem nunca se concretizar. São tempos passados tão presentes que mostram o futuro. Um futuro de monotonia rasa, eclipse de sensações, assassino de possibilidades. Sou uma falha nos futuros promissores, um caos interno silenciado com sorrisos.

Na mente de uma ansiosa as coisas parecem não ter pontos vírgulas fins começos tudo é um grande amontoado de pensamentos que sufocam assim como essa frase
Cansa né?
Imagina viver assim todos os dias?
Consome aos poucos, machuca
Cada vírgula, cada ponto, vira uma escuridão abissal
As entrelinhas são cuidadosamente destrinchadas para encontrar algo que pode nem existir
Cada olhar gera uma miscelânea de sentimentos ambíguos
O não dito é indagado constantemente
Fanfics são criadas, destruídas, repensadas
Isso tudo enquanto você me dá um bom dia
É por isso que escrevo
Pra desenrolar o novelo complicado dentro da minha mente Trazer a realidade, mesmo que dolorosa
A arte salva, eu já disse
Me salvou e continua salvando
Não enlouqueço porque derramo, vomito vocábulos
Pausados
Pensados
Organizados

Estou navegando no meu mar interno ainda sem rumo, mas vejo esperança no horizonte. Remo contra as correntes que insistem em me afastar da calmaria, meus pensamentos autodepreciativos. Sigo orgulhosa lutando e remando, saindo de casa todos os dias e enfrentando meus medos mais obscuros. Quem diria que uma futura médica, cuja felicidade é ajudar o outro, se esbarraria no medo de conversar, no medo das pessoas, na ansiedade social. O constante sentimento de apreensão por imaginar que estou sendo julgada continua, mas sigo derrubando os muros que eu mesma construo, lidando com os plantões da melhor forma que eu consigo. Lidar com situações de emergência/urgência ainda é difícil para mim, mas eu sigo firme, porque sei que valerá a pena

Auto-mar, auto-lar, amar
Expresso meu oceano de sentimentos nos textos que escrevo.
Tornaram-se meu lar,
minha fuga,
minha catarse.
E nesse mundo caótico destrutivo, automático e sem sentido
é o que me mantém sã,
mesmo com meus devaneios e surtos. Remando no meu mar desconhecido, percebendo a preciosa barreira de corais, que são os meus pensamentos,
eu viajo e me reconstruo.
O piloto automático tenta tomar as rédeas, mas eu busco meu casulo interior
me transformo em borboleta.

Amo em demasia escrever, principalmente palavras que reflitam meu sentimento de frustração com esse mundo egoísta, apático e determinante. Meus textos são filhos do tédio, da inconformidade ou da raiva, são letras solitárias que se encontram, dão as mãos e constroem um palco que desmascara utopias, que desmistifica verdades absolutas, são frases quase melódicas que retiram o véu dessa sociedade hipócrita. Posso soar amarga, desesperançosa e fria, mas construo cobertores que acalentam minha alma, mesmo que não cubram meus pés, escrevo para que eu reflita sempre, e, algumas vezes, para que outros reflitam também, para que eu não caia no limbo passivo novamente. São formas de me desconstruir e reconstruir diariamente, moldar meus valores éticos e trabalhar com arte (que particularmente amo). Tenho sim esperança e é por isso que crio textos como quem desenha, como quem compõe, como quem toca, porque a arte é o alimento da vida. Sonhadores têm sido silenciados por muito tempo, a pós-verdade tem reinado e as utopias de Orwell tornam-se mais próximas do que acreditávamos. Não me calo! Enquanto minha arte me ajudar a prosseguir, me acalentar, nunca me calarei, não me deixarei ser amarrada em camisas de forças alienantes.

Tantas coisas que sinto e não posso revelar compõem os diferentes oceanos do planeta Marina, segredos naufragados, tesouros esquecidos. A capitã aqui não abandona seu jeito de ser, percebe que o iceberg dos julgamentos a persegue, podendo naufragá-la. As ondas dos pensamentos agitados chegam e quebram-se na rocha que é você, que nem por um momento imagina ser a causa e a resolução da tormenta.

Ser Marina é
Martirizar-se por questões pequenas Inativar suas vontades
Mascarar o que sente
Rigidez em excesso
Navegar em rios turbulentos
Mas também é
Maravilhar-se com as trivialidades da vida Inabalável amor pela arte
Magnânima essência empática
Risada única
Natural gosto pelas pessoas
Mar - Ina
Ma - Ri - Na
Marina

O Silêncio da Inquietude Onde histórias criam vida. Descubra agora