05. Inferno - Parte III

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Junho de 2010

Ana Beatriz ainda estava absorta em seus pensamentos e suas lembranças. A conversa com as amigas, em seguida, foi evoluindo para algo entre amenidades e recordações da infância e da adolescência. Haviam se passado minutos? Horas? Nenhuma delas sabia: estarem juntas era tão bom...

Vez ou outra, a ítalo-paulista reparava que as outras mulheres mantinham o olhar perdido, aflito. Não resistiu:

— Querem me dizer mais alguma coisa?

Houve mais uma troca ansiosa de olhares entre Ana Clara e Ana Flávia. Foi a primeira que começou:

— Temos que também te falar sobre algo... E é sério...

Beatriz odiou o tom empregado pela outra moça, mas não proferiu nada, permitindo, quase obrigando, que Clara prosseguisse. E assim ela o fez:

— É sobre o seu Francesco...

— O nonno... — Beatriz teve que se segurar para não protagonizar uma cena de choro de novo. — A gente focou tanto na minha mãe e nas famílias de vocês que mal falamos dele...

Fez uma pausa. Iria perguntar se o avô estava bem, porém voltou a analisar o rosto meio contorcido das outras. Desse modo, tratou de mudar o questionamento:

— O que tem ele?

— Ele...

Clara iria continuar a falar, mas um receio havia se apossado do seu ser. Envergonhou-se por isso, já que era uma profissional de saúde, embora não fosse de sua alçada dar aquele tipo de notícia para as pessoas.

— Ele...

Beatriz iria dizer algo mais... mórbido, contudo, foi interrompida por uma Flávia pouco menos paciente:

— Ele sofreu um infarto, Beatriz.

A mulher de cabelos castanhos estremeceu. Novamente, quis chorar. Limitou-se a tornar a perguntar com a voz entrecortada:

— Mas... ele está... bem?

— Seu Francesco foi submetido a uma cirurgia — respondeu a afrodescendente, dessa vez, demonstrando mais segurança nas palavras, até porque aquilo exigia mais de seus conhecimentos técnicos do que de seu lado humano. — Ele realizou uma ponte de safena.

Beatriz a olhou com certa confusão, denotando que não sabia acerca do que a outra falou. Clara, por sua vez, não se fez de rogada e tratou de explicar:

— É um procedimento em que os médicos retiram uma veia bem lateral de um dos membros inferiores e a implantam no coração. O infarto do miocárdio é ocasionado quando os vasos sanguíneos cardíacos estão entupidos e, com isso, o órgão deixa de receber oxigenação. Entende?

Ana Beatriz anuiu e tornou a perguntar pela segunda vez:

— Então isso quer dizer que ele está bem?

— Está vivo — afirmou Flávia. — O que não quer dizer...

Não continuou, pois Clara lhe deu um cutucão, pedindo de um modo não verbal que fosse mais cautelosa com os termos a serem usados. Foi justamente a mulher negra que tomou a frente do diálogo:

— O que a Flávia quis dizer é que a cirurgia do seu Francesco foi um sucesso, porém ele se encontra bem recluso.

— Na verdade, Beatriz — tornou a se pronunciar a nipo-brasileira —, o nonno já não é o mesmo desde... desde...

Compreendendo a mensagem da outra, Beatriz a completou:

— Desde que fui embora?

As duas assentiram com pesar. Em seguida, Flávia voltou a falar:

É pela dúvida ou... Uma história alternativaOnde histórias criam vida. Descubra agora