Quando eu era menor a vida era mais fácil, acredito eu que não seja a única que pensa isso, mas como todo mundo, eu cresci e junto disso veio o peso de ser inocente no passado. Claro, eu lembro de tudo que aconteceu comigo quando eu era pequena, todos os traumas, talvez eu lembre pelo o fato de que eu sempre fui vingativa... Não sei, mas lembro! Obviamente eu lembro no dia que papai me levou para a casa do seu amigo e ficou bebendo com ele e ele me levou no quarto dele, me colocou no colo com a desculpa de que era para eu pegar um brinquedo em cima do guarda-roupa. Enquanto ele me levantava, senti suas mãos passar pelas as minhas pernas e indo em direção na minha parte intima, ele alisou ela e eu fiquei paralisada... Porra, eu tinha só 7 anos, como eu iria me defender? Logo depois disso, ele me colocou no chão e olhou nos fundos dos meus olhos e falou:
- É o nosso segredinho, tá? Se você contar para o seu pai, ele vai brigar com você.
Obviamente, não contei para ninguém até agora.
Eu também me lembro de quando o meu herói se tornou o meu maior monstro, e lembro que no mesmo dia me tornei a heroína de alguém. Primeira vez que me tornei heroína de alguém, a minha mãe estava no quarto chorando e implorando para que parasse e eu estava com minhas duas mãos cobrindo os ouvidos da minha irmã mais nova enquanto ela me abraçava até adormecer. Lembro que fiquei feliz que ela dormiu rápido naquele dia, mas também lembro o tom cansado na voz da minha mãe implorando para o meu herói parar porquê estava doendo... Eu lembro que naquela noite só consegui adormecer depois que o barulho parou e eu lembro que sempre repetia na minha mente:
"E quanto a mim? Quem vai me salvar? Quem vai tampar os meus ouvidos?"
Ninguém, ninguém, ninguém me salvou, ninguém tampou meus ouvidos, nem eu mesma os fechei. Lembro que eu tinha tentado fechar meus ouvidos, mas não conseguia fechar com muita força, então os gritos ainda chegava até mim, lembro de olhar minha irmã mais nova se encolhendo na cama e tentando fazer o mesmo que eu, tampar os ouvidos e era visível que ela também ainda escutava, então fui até sua cama e tampei para ela, olhei nos olhos dela e falei:
- Vai ficar tudo bem Sol, só me abraça e fecha os olhos.
Sol logo fez o que mandei e dormiu.
Eu também lembro quando chorei feito um bebê para que minha irmã mais velha não fosse embora de casa, eu sentia que ela estava me abandonando, por qual motivo ela iria me deixar sozinha ali? Meu pai tinha quebrado a minha mãe, eu tinha que esconder os remédios para minha mãe não morrer, eu tinha que proteger minha irmã e mesmo eu fazendo isso tudo, ainda não era suficiente. Então um dia com os olhos cheios de lagrimas olhei para o meu pai e falei:
- Papai, por favor... Para de beber, o senhor vai perder a sua família, o senhor quer isso? - Falei com lágrimas nos olhos
- Desculpa Lua, papai vai parar. - Falou com um olhar sério.
Ele não parou, e obviamente, ele nos perdeu. Minha mãe pediu o divórcio depois de 15 anos tentando dá certo com ele. E para quem achou que o meu inferno iria acabar, se enganou. O meu pai não tentou pegar nossa guarda, ele sabia que não ia conseguir. Para minha mãe conseguir fugir dele, ela teve que deixar a gente lá, eu tinha 11 anos, minha irmã mais nova tinha 6 e a mais velha 16. Vênus tinha se casado no mesmo ano que minha mãe separou, ela se casou com 16 anos. A minha mãe foi para a casa do seu pai, fugiu do meu pai por causa que ele tinha trancado ela em casa para ela não fugir dele. Ele não batia na gente e nem nela, mas controlava a gente, ele nunca deixou claro, mas amava mais Sol do que eu, sempre que eu queria algo e pedia eles não me dava, agora quando Sol pedia minha mãe ou pai comprava, talvez porquê ela era a mais nova, não sei, mas sempre que eu queria algo eu tinha que pedir para ela e eles sempre dava. Agora voltando para o divórcio, minha mãe tinha ido para casa do meu avô, eu e sol ficamos com o meu pai, Vênus sempre ia ver se ele estava cuidando da gente direito, uma vez ele levou a gente para um bar, enquanto ele bebia a gente jantava carne e refrigerante. No caminho para casa, ele estava dirigindo bêbado, estava indo na maior velocidade do mundo, ele olhou para mim pelo o retrovisor, eu e Sol estava com um olhar de medo, ele olhou para mim e falou:
- Quando sua mãe me deixar de vez, não vou ter mais filha. - Ele estava com um olhar tão frio e egoísta
- Mas pai, por quê? - Sol perguntou com lágrimas nos olhos.
- Porquê eu não quero ter filhas. - Falou olhando para mim.
- Isso é coisa que você diga para as suas filhas??? - Falei chorando feito um bebê.
- Eu já avisei. - Ele seguiu o caminho calado.
Naquela noite quando chegamos em casa, ele ficou na sala bebendo, eu e sol entramos dentro do quarto e trancamos a porta. Eu não tinha notado, mas acho que foi depois desse dia que eu me tornei o monstro de sol, ela pediu para dormir comigo e eu disse que não. Ela estava com os olhos cheios de lágrimas, mas eu? Eu estava com raiva e inveja, ele falou aquilo olhando nos meus olhos, ele tinha me rejeitado, não ela! Aquilo ficou repetindo milhares de vezes na minha cabeça por dias, por noites. Eu que sempre implorei para ele parar, eu que sempre protegi ela, eu que escondia os remédios, eu que aguentava tudo deles e não reclamava, eu era a rejeitada. Eu senti como se eles não me quisessem, eu me senti sozinha e minha mãe não estava lá para me explicar o que ele queria dizer com aquilo.
Capítulos todos os domingos, espero que vocês curtam o segundo também.
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A menina que busca o herói
Non-FictionEssa história se passa no mundo real, a protagonista vai enfrentar demônios da vida real. A sociedade, os julgamentos por causa da sua sexualidade e acima de tudo, o monstro que há dentro da sua mente. Alerta de gatilhos!!