Quando voltei para a sala, meu pai estava sentado no sofá escutando música e bebendo. Ignorei ele e peguei meu tablet e fui ler, me deitei no sofá e ele se sentou perto de mim, mas no chão, ele bebeu tudo que tinha para beber e tinha dormido, eu ainda estava lendo quando senti sua mão na minha barriga e logo pensei: "Que fofo, acho que ele tá procurando minha mão." Antes que eu terminasse de pensar naquilo minha expectativa foi quebrada na mesma hora. A mão dele não estava ali para me fazer carinho, estava ali para me deixar com mais um trauma, a mão dele saiu da minha barriga e desceu para minha calcinha, mas antes que ele conseguisse tocar, eu empurrei sua mão e me levantei do sofá assustada, olhei para ele com os olhos cheios de lágrimas, mas ele simplesmente voltou a dormir... Ele tinha feito sem querer, foi culpa da bebida, ele não fez de propósito, tenho certeza! Enquanto eu repetia essas palavras na minha mente, fui para o meu quarto chorar, aquela foi a primeira vez que tive uma crise de ansiedade e novamente, estava me sentindo sozinha. Naquela tarde adormeci chorando, me acordei já era noite, minha irmã estava me chamando para jantar e o meu pai ainda estava lá, não fiz nada, não falei nada. Fiquei com medo deles não acreditar em mim, então só botei minha janta e fui comer, sem falar com ninguém.
- Tu sabe, né? - Meu pai fala rindo e vindo até mim, fiquei sem entender.
- Sei o que? - Perguntei confusa.
- Você foi o meu maior erro, e o meu maior arrependimento. Só falhei na vida porque tu nasceu. - Fiquei sem reação, minha única vontade era jogar meu prato de comida nele, mas nem isso eu conseguir.
- O que você tá falando?? Isso não é culpa dela, cala a porra da boca caralho! - Minha irmã falou com raiva.
As lágrimas começaram a descer, sem parar
- Mas é verdade, ela foi um atraso na minha vida. Por mim só tinha tido Sol. - Vênus foi a filha do primeiro casamento da minha mãe e eu fui a primeira filha dos dois.
Antes que ele falasse algo, me levantei e fui para o quarto e naquele dia eu tive minha primeira crise de pânico, minha vista ficou embaçada, minha respiração pesada, senti um grande aperto no peito, falta de ar e porra, aquilo foi demais para mim, eu estava prestes a surtar até que meu cunhado bateu na janela do meu quarto, quando abri, ele não falou nada só me abraçou e eu chorei feito um bebê, saiu tanto catarro na roupa dele que hoje dou até risada disso, mas o foda foi os pensamentos que eu tive, enquanto ele me abraçava e eu chorava só conseguir pensar:
"Por que ele não me ama? O que eu fiz para ser odiada dessa forma? O que eu fiz?? Por que é tão difícil me amar? O erro... O erro sou eu...?"
Meu cunhado falou que ia ficar tudo bem, eu não precisava me esquentar com aquilo, então voltou para ficar com minha irmã, me deitei na cama para dormir, mas não consegui, minha cabeça doía de tanto chorar, meu corpo estava pesado e eu não conseguia parar de pensar em tudo que aquele monstro havia falado para mim, fiquei até de madrugada pensando e chorando, então quando abri a porta do quarto para ir beber água e ir no banheiro, vi meu pai preso na área, minha irmã tinha trancado ele lá, talvez ela ficou com medo dele fazer algo comigo. Ele ainda estava bêbado e estava conversando sozinho, ele estava falando várias coisas nojenta e estava gemendo, bebi água e fui no banheiro, então corri para o quarto, no outro dia quando acordei ele não estava mais lá e minha irmã estava lavando a área.
- O que foi que ele fez? - Perguntei indo em direção a ela
- Fica aí! Ainda tá sujo, ele melou tudo aqui, não olha não. - Ela falou fazendo gestos para eu sair de lá.
Depois daquilo não demorou muito para minha irmã me mandar de volta para morar com minha mãe, ela disse que se eu ficasse lá meu pai iria para lá e ela não podia se estressar com isso. Então voltei a morar com minha mãe e novamente eu estava quebrada e sem conseguir lidar com tantos sentimentos negativos que estava dentro de mim. Voltei a beber, cheirar, fumar e bater na minha irmã, não conseguia falar que amava elas e antes dos meus 17 anos tive vários relacionamentos, incluindo o meu primeiro relacionamento com a primeira menina que eu me apaixonei. Vênus já tinha dado a luz ao meu sobrinho e se separou do meu cunhado e veio morar perto da gente, então eu fui morar novamente com ela para ajudar, e com tudo isso na minha mente, veio a primeira tentativa de suicídio, tinha muito ódio e rancor dentro de mim, eu sentia culpa por não conseguir mudar, por sempre me comparar a ele, por ser uma filha ruim, por sentir inveja de Sol por ela ter o amor deles e eu não, eu tinha mais raiva de mim mesma do que eu sentia dele.
Meu sobrinho estava deitado na cama, eu estava no chão com lâminas na mão e cortando os pulsos, eu chorava como um bebê e antes de desmaiar mandei mensagem para a minha irmã pedindo desculpas e falando que amava ela, eu tinha tomado uns calmantes também, a minha irmã estanhou o meu comportamento e falou para minha mãe, minha mãe veio correndo com o meu padrasto. Eu lembro do alívio que eu senti naquele dia, eu finalmente iria descansar, eu estava tão feliz por conseguir ter o meu descanso, porra, eu finalmente ia fazer minha mente parar. Quando eles chegaram, meu corpo estava no chão cheio de sangue, eu olhei para ela e vi ela gritando
- NÃO, MINHA FILHA NÃO!!! - Logo depois que ela viu, ela desmaiou e caiu no chão
Desmaiei e acordei no hospital, levei 24 pontos, 14 pontos no braço esquerdo e 10 no direito, minha mãe estava do meu lado, ela estava com uma expressão cansada, mas não brigou comigo, ela apenas me abraçou.
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A menina que busca o herói
Non-FictionEssa história se passa no mundo real, a protagonista vai enfrentar demônios da vida real. A sociedade, os julgamentos por causa da sua sexualidade e acima de tudo, o monstro que há dentro da sua mente. Alerta de gatilhos!!