Mais um dia na universidade e o professor anuncia que teremos um trabalho individual sobre drogas ilícitas e os riscos que elas causam. Falar sobre drogas não é um assunto novo. Uma pesquisa no Google resolveria isso para mim em segundos, visto que noventa por cento dos jovens na universidade usam, ou em algum momento, usaram drogas. Então, para a maioria, está resolvido! Eu, Elena Tyner, sou parte dos dez por cento que nunca usou isso. Podem me chamar de careta, mas nem maconha eu fumei e, sinceramente, me orgulho disso. Me orgulho de ser a garota certinha que vai para a universidade apenas a fim de estudar, conseguir boas notas e um diploma. Curso psicologia. E não vejo a hora de atuar na área.
Escuto o professor dar as últimas instruções. Ainda não há nada para se preocupar. Eu, como a nerd que sou, tirarei de letra esse trabalho e já imagino ganhar a melhor nota da sala, o que não será novidade alguma.
Nada com o que me preocupar, repito mais uma vez, até ele dizer que temos que fazer um trabalho de campo, e isso inclui uma entrevista completa com um viciado.
Como assim?!
Em uma universidade de classe alta, onde a maioria é “filhinho de papai”, você não chega e diz:
— Ah, oi, sei que você é um viciado em drogas. Pode me dar uma entrevista para o trabalho de psicologia?
Bom, agora há com o que me preocupar. Droga! - Sem trocadilhos.
Moro no campus que fica a horas da cidade grande. Não seria problema ir para alguma instituição que acolhe viciados em drogas e conseguir uma entrevista. Não seria se eu conhecesse a cidade, mas eu vim do interior e para variar não tenho amigos aqui. Na verdade, só tenho a turma dos nerds mesmo, que são os melhores. Porém, isso arruína mais as minhas chances.
Após a aula, meus “amigos” até especularam a ideia de irmos para uma instituição, mas quando chegou o “grande dia”, eu estava com uma cólica de matar. Não consegui nem me levantar da cama, o que acabou com minha última chance. Porém não estou disposta a desistir assim tão fácil.***
Os dias no calendário me assombram, estão voando. Falta apenas uma semana para entregar o trabalho. E claro, o meu trabalho já estaria completo se não fosse essa maldita entrevista.
Não me restaram muitas alternativas. Foi aí que tive a brilhante ideia de tentar conseguir uma entrevista com Maycon. Mas, assim como sua turma de viciadinhos, ele é “filhinho de papai”. Na verdade, ele é “o” filho do papai, porque seu pai é dono de uma das maiores empresas da cidade. Inclusive, ela é uma das patrocinadoras das pesquisas do campus, motivo pelo qual acredito ser o porquê de Maycon estudar aqui.
E apesar de estudarmos há um ano na mesma universidade, tudo que sei sobre ele foi através de terceiros. Então, na realidade, só ouço falar. Maycon é lindo, admito, tem um sorriso de tirar o fôlego, e apesar de ser bem popular, está sempre cercado com mesma turma, então acredito que ele seleciona os seus. Pensei em algo do tipo “só aceito viciados como amigos” e ri da minha imaginação idiota. Bem idiota por sinal, visto que ele já havia comido a maioria das patricinhas daqui. Não sei por quê, mas elas amam esse tipo de cara – lindo, um tanto atraente e um verdadeiro perigo. É como se sobre ele estivesse uma placa enorme escrita: Estrada sem saída. Se der mais um passo, estará sujeito ao vício. Todos sabem que ele usa drogas, e ele mesmo parece não querer esconder de ninguém. Sempre está com um cigarro na mão ou uma garrafa de bebida, cercado de gente. Confesso que o tenho observado por um tempo, afinal, ao contrário de mim, um cara como ele não passa despercebido. Ele é um aluno regular, apesar de as vezes sumir por uns dias, tem o corpo coberto de tatuagens, alguns piercings, aquele olhar penetrante e o sorriso, bom eu já disse como é perfeito, mesmo que não tenha recebido um diretamente para mim. Nos cruzamos algumas vezes pelos corredores, mas como ele sempre está com aquele ar patético de superioridade, nunca tentei aproximar. Sou tímida demais para isso. E vamos ser realistas, garotas como eu e garotos como Maycon Sebastian, definitivamente, não se misturam. Não que eu me importe, claro. Mas esse motivo me fez desistir da minha “brilhante” ideia... Droga!***
Faltando apenas um dia para a data limite da entrega do trabalho, meu desespero sobe à cabeça. Parece que vou me ferrar de qualquer jeito mesmo. Em uma tentativa frustrante e picareta, pego minha caneta e agenda. Saio do campus decidida a pensar como uma usuária. Eu que nunca, sequer bebo algo com teor alcoólico, pensarei como usuária. O plano é um fracasso, mas é o último.
Está um pouco frio. Devido a isso, eu estou com um conjunto de moletom.
Pense como um usuário, pense como um usuário, repito mentalmente, mas nada me ajuda a pensar.
Que tal um cigarro? A ideia vem à mente. Só que cigarro não é uma droga ilícita. Mas posso fingir que é e descrever as sensações. Pronto, resolvido.
Caminho um pouco e chego a um barzinho próximo à universidade. Entro e todos me olham como se eu fosse um zumbi. Talvez seja porque essa é minha primeira vez aqui.
— Um cigarro, por favor — falo, determinada.
O barman me olha com cara de espanto.
— Você quer um cigarro? — questiona, com sorriso debochado e odeio isso.
— Quero! — revido com firmeza.
— Você ao menos fuma?
A pergunta me desarma. Não sei mentir em situações como essa. E, para não pagar mico, afinal todos aqui, por algum motivo idiota, ainda olham para mim porque, talvez, saibam que sou santinha demais até para um cigarro, então, engulo seco e digo de maneira firme:
— Sempre tem a primeira vez. — Termino pegando um maço e saindo do lugar horrendo.
Uma chuva se inicia, ainda fina, mas a tempestade já está anunciada. Dou passos largos e o máximo que consigo chegar é a um ponto de ônibus. Sento-me e olho para o cigarro.
O que adianta ter cigarros se não tem isqueiro? Penso, já descartando a minha ideia.
Olho as perguntas, todas sobre o porquê de entrar nesse mundo obscuro, efeitos e tudo o mais.
Meu professor é esperto demais para que eu tente enganá-lo.
— Oi. — Escuto e levo um susto. Olho e lá está o bendito, sozinho, bem na minha frente. Provavelmente se escondendo da chuva. Mas espere aí, sozinho? – meu subconsciente alerta.
Ele nunca está sozinho.
Olho à minha volta para saber se o “oi” é comigo mesma, já que nunca fui notada por ele antes.
— Não fala com estranhos? — Ele questiona, ainda me encarando e caramba, nunca estive tão perto assim antes e juro que Maycon é ainda mais lindo. Até sua voz é linda.
— Desculpa — digo, sem graça. — Oi.
— Você fuma? — ele pergunta, olhando para o cigarro.
— Não. Na verdade, não. — Balanço a cabeça.
— Posso pegar um? — Refere-se ao maço de cigarros.
— Pode ficar com ele — digo, frustrada.
— Valeu. Acho que te devo uma — ele diz e dá um sorriso tão lindo que me paralisa.
— Não por isso. — Retribuo sem jeito.
E após um silêncio constrangedor, ele continua:
— Nunca te vi por aqui.
— Estudo na mesma, quer dizer, estudamos na mesma universidade.
— Sério?
— Sim, inclusive já tem um ano que nós estudamos juntos. — Falo, e ele parece surpreso. É, eu sei, sempre fui invisível para você.
— Faz o quê? — Ele ignora meu comentário.
— Psicologia.
Maycon tira o isqueiro do bolso e acende o cigarro.
— Por que o cigarro? — ele pergunta, dando a primeira tragada e se sentando ao meu lado. Vejo a fumaça tensa escapando de suas narinas. Estando tão perto é quase impossível não notar seus braços cobertos por tatuagens. Ele está usando uma touca preta, assim como uma camiseta do Nirvana, calça jeans escura e tênis. — Por que o cigarro? — Repete a pergunta e sei que pareço uma idiota.
— Tentativa frustrada em terminar um trabalho. — Bufo.
— Sobre?
Maycon é lindo e sabe disso. Lindo e direto, apesar de olhar para chuva e não para mim.
— Drogas ilícitas, uma entrevista com um viciado — sussurro, envergonhada e com receio de ofendê-lo, mas acabo arrancando uma gargalhada dele.
— Cigarro? Jura? — Ele finalmente me olha de relance e percebo o porquê de ter tantas garotas a fim dele. Maycon é aquela mistura de adrenalina e perigo. Intenso demais para uma garota como eu...
— Para alguém que nunca sequer bebeu álcool, é um começo.
Ele dá outro sorriso. Fica em silêncio, dá mais uma tragada e finalmente me encara. Morde seu lábio inferior e olha diretamente em meus olhos, como se me lesse.
— Faça as perguntas — ele diz, ainda com o olhar fixo em mim.
Respiro profundamente. Ou pelo menos, tento. Eu sei que não deveria, mas é minha única chance e não posso desperdiçá-la.
— Prometo manter sua integridade — aviso, tentando desviar o olhar, mas falho na tentativa e forço um sorriso.
— Não sei por quê. Não estou nem um pouco preocupado com ela — ele diz e levanta a sobrancelha. Caramba ele é realmente lindo.
Olho minha agenda. Mas não consigo ir além disso, não consigo falar, merda, pois estou tão insegura, inquieta, e minhas mãos suam frio. Estou fazendo um papel ridículo, eu sei. Sinto um misto de emoções que não sei descrever. Após alguns minutos, ele se aproxima, pega a agenda da minha mão, assim como a caneta, e o simples toque entre nossas mãos faz meu corpo arrepiar. Responde às perguntas, enquanto eu mantenho meu olhar no chão. Ao terminar, me entrega, agradece novamente pelo cigarro, e antes que eu possa agradecer, ele sai na chuva, me deixando sozinha.
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Meu vício
Ficção AdolescenteElena Tyner é uma garota certinha que acredita estar no caminho certo, até que seu caminho se cruza com Maycon, o bad boy da universidade e que todos sabem, é encrenca na certa. Elena acha que sabe muito sobre Maycon: que ele é problema, o tipo err...