vermelho, branco e el(l)a. || rabia

1. London, Luck & Love

Storytelling Point Of View.

No terraço da Casa Branca, escondido em um canto da varanda, há um painel meio solto bem no canto do Solário. Se bater do jeito certo, dá para puxar o painel o suficiente para encontrar uma mensagem que foi entalhada com a ponta de uma chave, ou talvez com um abridor de cartas roubado da Ala Oeste. 

Na história secreta das primeiras-famílias — uma indústria exclusiva de fofocas que devem permanecer eternamente em segredo, sob pena de morte —, não se sabe ao certo quem escreveu aquilo. A única certeza que as pessoas parecem ter é que só o filho ou a filha de um presidente teria a audácia de vandalizar a Casa Branca. Alguns juram que foi Jack Ford, que tinha discos do Hendrix e um quarto de dois andares anexo ao terraço para fumar de madrugada. Outros dizem que foi a jovem Luci Johnson, que prendia o cabelo com uma fita grossa. Não importa. A frase se mantém, um mantra secreto para quem for esperto o bastante para encontrá-la. 

Bianca a descobriu na semana em que se mudou para a Casa Branca. Ela nunca contou para ninguém. 

Diz assim: 

REGRA N° 1: NÃO SEJA PEGO

Os Quartos Leste e Oeste no segundo andar costumam ser reservados para a primeira-família. Foram projetados para ser um enorme salão de aparato para as visitas do marquês de La Fayette durante o governo Monroe, mas, depois de um tempo, foram divididos. Bianca dorme no Leste, de frente para a Sala do Tratado, e Vitoria, no Oeste, perto do elevador. 

Quando eram crianças, no Texas, elas tinham quartos na mesma configuração, um de cada lado do corredor. Na época, dava para saber com o que Vitoria andava sonhando só pelo que cobria as paredes do quarto dela. Aos doze, eram pinturas em aquarela. Aos quinze, calendários lunares e tabelas de cristais. Aos dezesseis, recortes do The Atlantic, uma bandeira da Universidade do Texas, Gloria Steinem, Zora Neale Hurston, e trechos de ensaios de Dolores Huerta. 

Já o quarto de Bianca era sempre o mesmo, só que cada vez mais cheio de troféus de lacrosse e pilhas de trabalhos de matérias avançadas. Está tudo juntando poeira na casa que elas ainda mantêm na cidade. Pendurada em uma corrente no pescoço, sempre escondida, ela guarda a chave daquela casa desde o dia em que se mudou para Washington. 

Agora, do outro lado do corredor, o quarto de Vitoria é todo decorado em tons de branco, rosa claro e verde mentolado. Ele foi fotografado pela Vogue e é famoso por ter velhos periódicos de design de interiores dos anos 60, que ela encontrou em alguma das salas de estar da Casa Branca, como inspiração. O de Bianca pertencera à Caroline Kennedy quando bebê e depois se tornou o escritório de Nancy Reagan — motivo pelo qual Vitoria fez uma purificação energética no cômodo. Ela manteve as ilustrações de natureza em uma linha simétrica sobre o sofá, mas cobriu as paredes cor-de-rosa de Sasha Obama com cimento queimado. 

Pelo menos nas últimas décadas, os filhos do presidente não costumam morar na Residência depois dos dezoito anos, mas Bianca começou a faculdade em Georgetown no mesmo mês de janeiro em que sua mãe tomou posse e, pela logística, não fazia sentido dividir os seguranças nem os custos entre a Casa Branca e o apartamento em que ela iria morar. Vitoria veio no mesmo ano, recém-formada na Universidade do Texas. Ela nunca disse, mas Bianca sabe que ela se mudou para ficar de olho nela. Vitoria sabe melhor do que ninguém que ela adora estar tão perto da ação e, mais de uma vez, chegou a arrancá-la à força da Ala Oeste. 

Dentro do quarto, ela pode sentar e escutar Hall & Oates na vitrola do canto, sem que ninguém a ouça cantarolando "Rich Girl", como seu pai fazia. Pode usar os óculos que sempre finge não precisar para ler. Pode fazer todos os guias de estudo detalhados e cheios de post-its coloridos que quiser. Ela não vai se tornar a congressista mais jovem a ser eleita na história moderna senão fizer por merecer, mas ninguém precisa saber o quanto ela se esforça para isso. Senão seu status de sex symbol cairia por terra.