O mundo de Mirryc foi criado há milhões de anos como exemplo de um mundo perfeito.
Nele habitavam os Viventes, criaturas mortais e sem poderes. Eles trabalhavam em conjunto, construindo casas, plantando seus alimentos e criando animais.
Mirryc era realmente o exemplo de mundo ideal.
Mas sua criadora não estava contente. Faltava alguma coisa em Mirryc.
Então, em um dia qualquer, Dimiourgós criou os Havemidyanos.
As criaturas imortais nasceram timidamente e demoraram séculos para se adaptar naquele mundo. A princípio, Havemidyanos e Viventes viviam em perfeita harmonia.
Eles compartilhavam tudo, comida, roupas, animais. Eles até procriaram entre si.
O fruto de uma união entre as duas espécies gerava um Aeryniano. Os bebês Aeryns eram considerados sagrados, e sempre um deles nascia ocorriam festas nas aldeias por semanas, porque a procriação entre as duas espécies era muito rara e ser abençoado com um bebê Aeryns era considerado uma honra.
Havemidyanos e Viventes viveram cordialmente por milhares de anos, mas quando os Havemidyanos começaram a espalhar por Mirryc que sua espécie era superior às outras por eles terem poderes, serem imortais e terem sangue puro; uma guerra começou.
Viventes e Havemidyanos passaram a ser inimigos e os Aeryns se tornaram amaldiçoados, sua existência era motivo de vergonha e os seres mortais começaram a queimar os bebês que nasciam, numa tentativa de extinguir a sua existência.
A guerra entre mortais e imortais durou séculos. Viventes nasciam e morriam com suas vidas girando em torno da guerra, e ela só acabou quando os Viventes se renderam aos Havemidyanos, tornando-se seus escravos.
Dimiourgós se arrependeu de sua criação. Mirryc já não era o exemplo de mundo perfeito.
Os seres imortais juntaram os seus poderes e criaram a sua própria divindade, o Regnum. Todos os Havemidyanos clamavam e depositavam a sua fé nele.
E junto ao Regnum também surgiram os reis Havemidyanos. Eles consagraram os seus poderes as suas coroas através de um pacto de sangue selado em suas respectivas coroações. Haviam quatro reis e eles governavam os reinos de forma absoluta. Nada aconteceria se não recebesse a aprovação dos reis.
Enquanto isso, os Viventes eram escravizados e amaldiçoavam a sua criadora, por criar os seres imortais e destruir o mundo ideal.
Como um ato de misericórdia aos seus seres mortais, a criadora libertou todas as criaturas que foram escravizadas e tirou grande parte dos poderes dos Havemidyanos e a imortalidade era apenas uma questão de perspectiva. Os Havemidyanos não passavam mais dos três mil anos, mas ainda era muito tempo comparado a expectativa de vida de oitenta anos dos Viventes.
Mas uma coisa Dimiourgós não conseguiu mudar.
Os reis ainda tinham plenos poderes. Eles não foram afetados pela impotência. Com suas coroas, eles eram as criaturas mais poderosas de toda Mirryc.
Numa tentativa de contornar as coisas, a criadora criou pedras dos poderes para combater os reis, mas elas nunca foram usadas. Ela temeu o que poderia acontecer com o mundo se essas pedras caíssem em mãos erradas. Sem ter como destruí-las, ela as escondeu no coração de Mirryc.
A guerra tão esperada entre Havemidyanos e Viventes não aconteceu.
Os reis estavam felizes por manterem os seus poderes e deixarem os seres mortais seguirem com suas vidas curtas e patéticas.
Milénios e mais milênios se passaram, os reis governavam harmonicamente. A ilha onde seus reinos habitavam passou a se chamar Ilha dos Quatro Reinos.
Tudo corria bem, e quando um jovem Havemidyano assumiu o seu lugar no trono. Um macho muito sábio se aproximou dele para lhe dar conselhos e seu reino prosperou mais do que nunca. Décadas depois, quando outro jovem assumiu o lugar de seu pai, ele também desejou a prosperidade do reino vizinho e pediu conselhos do macho sábio.
Os dois reinos prosperavam juntos.
Um dia, um tolo herdeiro, prestes a assumir o trono, propôs aos seus súditos um duelo. Ele se considerava o macho mais feroz já existente, e disse que quem o vencesse em seu duelo poderia tomar sua coroa por direito. Dezenas de machos se inscreveram, mas todos os outros amavam demais a sua vida para arriscá-la em um duelo com o príncipe herdeiro.
Um macho feroz, repleto de cicatrizes e com um tapa olho no lugar do seu olho esquerdo, derrotou brutalmente todos os seus oponentes, e em um piscar de olhos tinha degolado o príncipe herdeiro.
Esse duelo foi o mais comentado em toda Mirryc.
Um plebeu duelou contra um herdeiro de sangue e venceu! Isso era memorável.
Ao assumir a coroa, o novo rei também pediu conselhos ao macho sábio.
Os três jovens reis fizeram juntos os seus reinos prosperarem. Tudo estava indo bem.
Alguns séculos se passaram e um macho arrogante, primo distante do rei e seu único herdeiro - pois o rei não teve filhos - propôs um novo duelo.
Ele era brutal. Todos já tinham visto ou pelo menos ouvido falar de suas batalhas. Nem um inimigo havia sobrevivido para contar história. Ninguém ousou se inscrever para o duelo, ninguém exceto uma fêmea petulante.
Todos sentiram pena da jovem fêmea e rezavam para que o Regnum abençoasse a alma dela, pois sua morte era certa.
Mas todos ficaram surpresos com o que aconteceu.
Ao fim do árduo duelo a fêmea tinha saído como vitoriosa! Isso era chocante.
Uma fêmea se tornaria rainha pela primeira vez em toda a história da Ilha dos Quatros Reinos!
Após ser coroada, a fêmea também pediu conselhos ao macho sábio e, no final, todos os monarcas se tornaram grandes amigos, quase irmãos.
Os reinos prosperavam como nunca se viu e a paz reinava sobre toda Mirryc.
O mundo era perfeito, até não ser mais.
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A Rainha das Águas
FantasyHá dois séculos, após uma suposta traição, um rei foi expulso da Ilha dos Reinos. Atualmente muitas coisas estranhas começaram a acontecer em Mirryc e uma possível ameaça faz com que os reis tomem medidas drásticas. Maya, rainha das águas, é esco...