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Com medo de escorregar na escada úmida e quebrar seu crânio no metal, Carolina foi a última a descer no submarino, abandonando a luz da Lua para enxergar só com as lanternas. Entre as paredes metálicas e a escuridão completa, sentia-se como Jonas dentro da baleia e o traje anti-radiação piorava a claustrofobia. Porém, Carolina não tinha escolha. Estava ali a mando da marinha.

Quando o submarino emergiu próximo a Salvador, parte da população entrou em pânico, temendo um ataque. A primeira tentativa da Marinha foi comunicar-se com a tripulação pelo sonar, mas não obtiveram resposta. Consultaram outros países para saber de onde ele veio, mas nenhuma o reconheceu como parte de sua frota embora acusassem uns aos outros de envia-lo secretamente. Seis horas se passaram e a tripulação do submarino não se comunicava, o que criava um novo problema ainda mais grave: se o submarino fosse nuclear, sem controle, ele poderia causar um vazamento radioativo na costa da Bahia ou até mesmo explodir e matar milhões de pessoas. Um grupo de pesquisadores, quase todos químicos como Carol, foi chamado para investigar o caso enquanto a prefeitura de Salvador iniciou um plano de evacuação provisória.

Quando o quinteto chegou à plataforma emersa do submarino e colocou seus trajes de radiação e mochilas com equipamentos, tudo estava coberto de algas escorregadias. De alguma forma, a escotilha estava aberta. Já dentro da baleia metálica, Carol viu dois de seus colegas, Beatriz e João retirarem os revólveres do coldre, prontos para o caso de haver tripulantes escondidos planejando algum tipo de ataque surpresa. Marcos, um químico, retirou seu contador geiger da mochila e o ligou, como havia feito na superfície. Os estalos e ruídos do aparelho lembravam o ranger de uma porta, como numa casa assombrada.

- Os níveis de radiação estão fortes como na superfície - disse - Realmente há algum vazamento.

- Olha - Carol apontou para a parede.

Todos observaram na direção da lanterna, vendo as algas grudadas na parede. Sua colega Elisa quebrou acidentalmente uma concha de caramujo. Pedaços de invertebrados marinhos estavam espalhados por todo o chão.

- Essa sala foi inundada - disse Carol - Talvez a tripulação tenha morrido afogada.

- Lembro de quando a Índia perdeu um submarino nuclear de última geração que custou 8 bilhões de dólares porque alguém esqueceu de fechar a escotilha - disse João.

Carol não conseguiu rir do ocorrido infame ao pensar nos tripulantes sufocando sob as águas. Carol desenvolveu talassofobia quando viu seu irmão mais velho ser levado pelo mar para nunca mais ser encontrado. Lembrava-se muito bem do terror em seus olhos castanhos escuros como os dela. Com o passar dos anos, ela se acostumou com o mar, até que, na época da faculdade de química, seu medo estava superado. Porém, todos aqueles demônios ressuscitaram dentro do submarino. Ela quase podia ouvir... "sussurros"?

"Não, estou ouvindo coisas", pensou. "É o barulho do mar. As paredes não são grossas o bastante para abafar o som. Ou são?". Carol relevou o fato de que ondas provavelmente não pareciam tanto vozes humanas e perguntou:

- Mas como esse submarino não está cheio de água? E como ele se moveu sozinho?

- Não devem ter morrido todos - respondeu Elisa.

A equipe continuou vasculhando. Havia uma porta circular de ferro na parede que guiava para mais um compartimento do submarino. Em situações normais, ela seria lacrada, impedindo que outros compartimentos fossem inundados, mas assim como a escotilha, estava aberta. À esquerda, duas enormes plataformas cilíndricas vazias cercadas de fios e hélices corroídas cobertas com mais algas e conchas.

- Lançadores de torpedos - disse Beatriz - Esse submarino disparou dois antes de afundar, mas não acho que foi abatido em combate. Não tem lesões externas.

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