A gravidade da situação fez o álcool evaporar do meu corpo e o sangue sumir do meu rosto em um instante. Senti como se eu estivesse entrando em um daqueles filmes de terror onde a garota legal fica perambulando sozinha pelos cantos até esbarrar com algo ruim e ser morta de maneira fria e brutal. O cenário e o meu estado de embriaguez contribuíam para que eu me parecesse com esse tipo de personagem, só que eu não sou legal como essas garotas que protagonizam esse tipo de cena nos cinemas. Qualquer pessoa normal que estivesse no meu lugar ou que passasse pelo mesmo que eu se sentiria ansiosa e aterrorizada, esse é o tipo de reação que as pessoas devem ter ao se deparar com eventos estranhos e situações embaraçosas. Porém, eu não estava me sentindo ou reagindo dessa forma. Eu não sentia como se estivesse correndo risco de vida e, por alguma razão que até então eu desconhecia, o meu instinto interior estava me ordenando a permanecer naquele lugar. Havia uma pequena fagulha de rebeldia incendiando o meu coração, essa fagulha estava instigando-me a seguir em frente, a desafiar a razão e a desvendar os mistérios inimagináveis que aquelas paredes escondiam do mundo. Então é isso que o álcool é capaz de fazer com uma jovem garota? Ele é capaz de fazê-la se sentir tão poderosa ao ponto de pensar que pode enfrentar qualquer coisa? Cerrei bem os meus punhos e dei um passo a frente. Esse foi o meu primeiro passo em direção a morte.
Alcoólatras e adolescentes tem algumas características em comum que fazem deles completos idiotas. Eles acham que estão no topo do mundo, que nenhuma consequência pode ser dolorosa o bastante para destruí-los ou que são tão extraordinários que nada pode afetá-los. Naquele momento eu estava sendo uma junção vergonhosa de ambos. E, não, eu não me orgulho nenhum pouco disso. Nunca pensei que seria tão ingênua ao ponto de achar que seria capaz de investigar um suposto grito que ouvi em um corredor completamente vazio e sem nenhuma fonte de iluminação. Além de estar sozinha e fora dos meus sentidos, eu não carregava nenhuma arma comigo ou era forte o suficiente para me defender de qualquer tipo de ataque.
A medida que eu avançava os sons diminuíam. Eles foram reduzindo gradativamente até restar somente eu e o silêncio. Depois de um tempo, a única coisa que se podia ouvir no corredor era o som da minha respiração agitada. A minha reação foi ficar chateada, claro. Afinal, fui tão longe para nada. Eu deveria ter agradecido por isso. Não encontrar nada em um local como aquele era motivo para comemorar e chorar de alegria. Eu só percebi a importância de agradecer por livramentos assim quando uma mão grande, de toque quente e um pouco áspera tocou sutilmente a parte nua das minhas costas. Essa mão desconhecida, mas muito habilidosa, afastou carinhosamente os fios desgrenhados do meu cabelo do meu pescoço, permitindo que o seu dono tivesse livre acesso a parte esquerda do meu pescoço. Me dei conta de que era um homem por causa da fragrância amadeirada que emanava de seu corpo e da aparente diferença de altura que havia entre nós.— Você está perdida?
Essas foram as palavras dele para mim. Sua voz firme e poderosa tinha um tom surpreendemente sensual.— Talvez eu esteja.
Eu não confiava nele o bastante para reconhecer que estava perdida, mas também não queria ser rude com a única pessoa que encontrei naquele buraco.— Onde você acha que está?
— No caminho para o banheiro...
— Oh... Isso é sério?
Ele riu da minha resposta, parecia estar se divertindo.— Não pareço estar falando sério?
Por impulsivo - e costume - me virei abruptamente para encontrar seu rosto e mostrar-lhe toda minha ira. Contudo, a escuridão na qual estávamos enterrados impediu que eu visse seu rosto.— Sendo bem honesto, não parece.
— Isso é porque nós estamos presos nesse imenso breu. Se você estivesse vendo o meu rosto agora, saberia que deve ficar na sua e bem quieto.
Cuspi essas palavras para fora com uma agressividade desnecessária. Esse é o tipo de reação que um pinguço da pior espécie certamente teria em um briga qualquer de bar. Pensei que ele iria se sentir ofendido e dar as costas para mim, mas ao invés disso, ele riu, parecendo estar tão divertido quanto antes. Enquanto eu estava parada de frente para ele, tentando enxergar seu rosto no meio daquele nada, senti os dedos de sua mão entrarem em contato com a pele sensível do meu rosto.— Esse não é o caminho pro banheiro.
— Então o que é?
— Esse é o corredor dos desejos. As pessoas vem aqui para viver as fantasias que elas não podem viver lá fora.
O som que ouvi mais cedo invadiu a minha mente.— Que tipo de desejo?
— Todo tipo de desejo.
- Então o que eu ouvi era...- Eram gritos de prazer.
Ele conseguiu dizer isso de uma forma tão simples que nem pareceu ser algo obsceno.
- Descarado.
Cruzei os braços abaixo do peito e virei o rosto para o lado. Eu não estava vendo o rosto dele, de qualquer modo, então virar o rosto para outra direção não fazia a menor diferença, pelo menos era isso que eu achava.
Ele segurou o meu queixo e trouxe o rosto para próximo do meu. Nesse momento o meu coração disparou e os meus joelhos fraquejaram.
- Vou considerar isso um elogio.
Como se soubesse exatamente em que direção me levar, o estranho e excitante desconhecido envolveu o meu corpo em seus braços e me deixou contra a parede. Estávamos próximos. Muito próximos um do outro.
- Esse não foi um elogio.
Respondi com arrogância. Meus lábios quase rasgando os dele a cada palavra que eu dizia.
Posso te convencer do contrário?
- Tente.Me peguei fazendo mais uma das coisas que eu abominava; estava flertando com um completo anônimo. Anne estava certa, essa é a noite de quebrar as regras.
Os lábios dele encontraram os meus, mas não me beijaram. Os braços fortes dele me seguravam, mas não me prendiam. O espaço entre nós era pequeno, mas não me deixava desconfortável. O calor do corpo dele incendiava o meu, mas não me fazia querer pedir ajuda. A presença dele era impetuosa, mas não me intimidava. Tudo que ele fazia parecia certo. Tudo que havia nele me deixava enfeitiçada. Tudo. Sem exceções.
Nossos lábios uniram-se um beijo em repleto de sensualidade e os nossos corpos entrelaçaram-se em um nó cego. Não sei em que momento ele me prendeu em sua teia de aranha, mas agora eu sei que estou perdida. Não sei que em direção devo correr. A atração que estou sentindo agora é tão devoradora, tão intensa e devastadora que sinto que a qualquer momento os meus pulmões vão explodir. Sinto que se me desvencilhar de seus braços eu irei entrar em abstinência.
Esse foi o meu segundo passo em direção a morte.
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No Name
Vampiro"O céu inteiro parecia estar ansiando pela minha morte naquela noite. As estrelas, que até momentos atrás brilhavam graciosamente, esconderam-se com toda sua extravagância atrás de nuvens densas e escuras que eu, honestamente, não sei de onde surgir...