Cascão

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Acordei com o barulho alto do despertador no pé do meu ouvido. Um som agudo e angustiante que me fez rolar para fora da cama e beijar com tudo o chão frio. Proferindo algumas palavras que não podiam ser ditas em voz alta, encarei ainda sonolento o pequeno objeto que apitava. Ele marcava 6:59 da manhã, o que significava que eu estava totalmente atrasado. Não que aquilo fosse uma novidade, é claro. Pontualidade, com toda a certeza não era o meu forte.

Juntei todas as forças que tinha e me levantei do chão, seguindo apressado para o banheiro. Eu havia passado a madrugada inteira de bexiga cheia e precisava esvazia-lá urgentemente. Assim que terminei, joguei uma porção generosa de água gelada sobre meu rosto, apenas para constatar segundos depois o quão péssima fora aquela ideia. Na minha cabeça aquilo me ajudaria a acordar mais rápido, porém tudo o que consegui fazer foi piorar meu próprio mal humor...

Mesmo que eu não quisesse admitir, ainda estava chateado com Cascuda. O modo como ela havia agido noite passada me fazia sentir coisas estranhas que não eram do meu agrado. E se ela tivesse falando realmente sério? E se o nosso namoro terminasse de verdade? Confesso que Cascuda podia ser complicada às vezes, mesmo assim ela ainda continuava sendo a garota com quem eu namorei por anos. Aquilo contava alguma coisa, tinha que contar… certo?

Acabei de fazer minhas necessidades no banheiro e quando saí peguei a primeira roupa limpa que encontrei pelo quarto. Logo desci para a cozinha que ficava no primeiro andar. Não tinha tempo para tomar café da manhã, então roubei uma maçã verde da mesa e tomei um pouco de leite da geladeira. Minha mãe não gostou muito, mas o que eu poderia fazer? Não podia me dar ao luxo de receber mais uma advertência por atraso, pois já estava encrencado no colégio o suficiente... Me despedi dos meus pais e saí apressado pela rua.

– Pensa rápido!– uma bola de futebol foi jogada contra minha cabeça e graças aos meus reflexos desviei e a agarrei no ar.

– Não foi dessa vez querido Xaveco.– debochei, jogando a bola de volta para o garoto loiro com toda a minha força. Quando a esfera de couro chocou contra seu braço ele gemeu de dor.

– Isso vai ter volta!– ele prometeu, logo após ter se recuperado da pancada.– E então, a Cascuda ficou muito brava por você ter se atrasado?

Xaveco sabia do meu atraso pois a culpa foi justamente do mesmo. Ele havia me chamado para treinar um pouco no campinho, e foi aquilo que me fez perder totalmente a noção do tempo.

– E como.– suspirei.– Ela até terminou comigo... mas é melhor a gente continuar o papo lá no colégio porque não quero pegar advertência de novo.

– É verdade!– Xaveco levantou o pulso e encarou seu relógio.– A gente tá muito atrasado!

– Corrida até lá?– desafiei, e ele concordou com a cabeça.

– Quem perder paga o lanche de hoje.– acrescentou.

– Fechado.– me preparei para correr, mas antes que pudesse contar até três o picareta do Xaveco saiu correndo na frente. Determinado o segui, pulando alguns bancos e muros para cortar caminho. No fim acabei o ultrapassando, deixando o pobre coitado comendo poeira.

Quando finalmente cheguei no colégio já estava quase sem fôlego. Minha garganta estava pior que o deserto do saara, e meus pulmões imploravam por oxigênio. Não consegui esperar por Xaveco, deixei ele para trás e atravessei o mar de alunos que tomavam conta de todo o corredor. Estava em busca do bebedouro mais próximo e o encontrei após alguns minutos de insistência. Sem hesitar bebi água suficiente para me manter satisfeito pelo resto do dia. Apos recuperar minhas forças, levantei as vistas e me deparei com os mais variados tipos de avisos pregados em uma grande lousa branca na parede. Um deles me chamou a atenção, por ser bastante chamativo. Era o comunicado das Aulas Extracurriculares.

Amizade Quase PerfeitaOnde histórias criam vida. Descubra agora