Capítulo 19 - Vinte e cinco anos

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No caminho do Salão Carmesim para o Palácio Imperial, Drastan se manteve calado e imóvel enquanto Alexander, ao se aproximar do seu destino, desceu precipitadamente da carruagem.

Em menos de trinta minutos, Drastan, acompanhado pelo conde, entrou na sala do trono, deixando um disfarçado olhar cair sobre Alexander. O Príncipe Herdeiro estava sem o feitiço de disfarce e de roupas trocadas ao lado do Imperador.

"Vejo que retornou, e que o Aislan está seguro." Comentou o Imperador,  insatisfação na sua voz.

Drastan ajoelhou-se:

"Todos os rebeldes foram mortos e nenhum dos seus apoiadores feridos, Vossa Majestade."

"Estou vendo que o Conde está com expressão assustada, me pergunto o que teria deixado-o assim."

Nem mesmo o longo a caminho para o Palácio haviam sido o suficiente para que homem parasse de tremer. Drastan amaldiçoou mentalmente a pedra em seu sapato, conhecida com Aislan.

"A filha de Mikeal está viva." declarou Aislan com um gaguejo.

Após muito tempo de silêncio, a risada sombria do Imperador vagou pelo salão como se não pudesse acreditar. Há muito ele havia queimado Cristalle. De fato, ele sabia que a garota tinha sobrevivido. Entretanto, não muito tempo depois ele garantiu que a garota morresse. Parecia uma piada de mal gosto.

"E, por que ela não está aqui Drastan? Lembro de ter ordenado você a trazer alguém com vida também. Por que não tem ninguém?"

Com o questionamento, Drastan sentiu uma aura fria envolvendo-o, seguida de um alto estalo e uma dor insuportável no seu antebraço esquerdo. Sua pele estava fria por baixo das roupas, a pressão fazia o príncipe ter a sensação de que uma pedra esmagava-o. Antes que pudesse perceber, Drastan gritou pressionando fortemente o seu antebraço pela dor. Ele queria que parasse. Ele tentou anular aquela magia. Desesperadamente, ele tentou.

Aquele era poder sombrio do imperador. Ninguém conhecia a fonte, mas algo todos podiam dizer: o homem era o mais cruel e poderoso do Império, com potencial até mesmo para quebrar ossos com um mero olhar. Entretanto, o que mais assustava Drastan era que a sua habilidade de negar a existência de mana e dispersar feitiços não afetava esse homem. À frente dele, Drastan estava a mercê, sem defesa alguma.
Drastan se forçou a pensar e construir uma mentira. Ele deveria arrumar algo, isso se quisesse sair somente com um braço quebrado.

"Eu falhei. Me distraí com outros rebeldes e permiti que ela escapasse em meio a um feitiço." A dor não diminuiu por nenhum segundo, mas ele se forçou a ignora-la.

Percebendo que uma explicação desse nível não seria o suficiente para acalmar a raiva do seu pai, Alexander se pronunciou.

"Pai, sei que a falha do meu irmão foi grave e merece uma punição à altura.  Contudo, se a filha de Mikeal for realmente tão poderosa quanto o Duque de Cristalle era, não há muitas pessoas no Império que possam a derrotar enquanto lidam com um grupo de revolucionários. Nós que temos o verdadeiro sangue puro correndo em nossas veias poderíamos, mas Drastan... Ele é só um estrangeiro."

O olhar de desprezo no rosto de Alexander era algo que Drastan raramente presenciava, muito menos para ele. No entanto, era uma chance.

"Me perdoe,Vossa majestade." O tom era baixo e respeitoso. "Trarei ela para Vossa Majestade. Imploro que me dê mais uma chance, lhe recompensarei pelo meu erro, pai."

Pai… essa palavra enjoava Drastan. Toda a vez que a pronunciava podia sentir uma corrente se apertando em seu pescoço; a corrente que o prendia a essa terra desconhecida.

"Quer voltar para Baraan Drastan?" A voz do imperador era gélida. "Como fiz com sua mãe, vou lhe propor um acordo…"

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No primeiro dia do ano novo em Baraan uma faísca de esperança surgia em meio a guerra: a rainha carregava o primeiro filho do reino. As comemorações se espalharam pelas ruas das cidades e vilarejos, instaurando um clima de festa e alegria. No entanto, não muito tempo após a notícia, toda a luz foi completamente apagada por uma ordem do Império Ashen.

Em toda a história, Baraan foi o principal reino que, no passado, havia se levantado contra Ashen e vencido, se mantendo um dos poucos reinos autônomos. Sua economia estava crescendo, bem com sua influência. Contudo, Baraan não chegava aos pés de Ashen. O tratado de paz era a única coisa que mantinha o pequeno reino de Baraan longe das garras do Imperador tirano de Ashen.

O nascimento de um herdeiro era inaceitável na visão do Imperador. Implicava uma linhagem, estabilidade e uma nova mentalidade. Temendo o futuro, o Imperador enviou um mensageiro ao Palácio Real de Baraan portando uma ordem absoluta. O decreto era simples: uma criança por vinte e cinco anos de paz. Se fosse cumprida, a rainha e o príncipe deveriam ser levados como reféns ao Grande Império; se desobedecida, sem piedade, Ashen atacaria Baraan.

Ao receber a notícia, a rainha se trancou no seu quarto, derramando incontáveis lágrimas durante uma noite. Mesmo o seu marido falhou em fazer sua esposa deixar seus aposentos. O sonho de ser mãe e criar o seu filho de forma pacífica tinha sido destruído. Por mais que ela amasse a criança e o rei, ela era mãe de um reino por completo. As lágrimas derramadas não foram por desespero ou indecisão; mas porque o seu filho cresceria longe de casa e na ponta de uma espada. No entanto, mesmo que o príncipe não vivesse em sua verdadeira casa e mesmo que ela nunca mais pudesse ver a pessoa amada, ver a sua pessoa amada, ainda aceitaria a proposta, salvando seu reino da desgraça iminente.

Na manhã seguinte, com o coração pesado, a rainha abraçou o marido pela última vez, dilacerando o coração de ambos. O rei perderia a sua esposa e filho; a rainha seu lar e marido. Porém, nada seria em vão, ambos cumpririam seu dever de proteger cidadãos.

Mesmo em desvantagem, a rainha não permitiria que seu filho perdesse a vida nas mãos daquele tirano. Então, corajosamente impôs um único termo ao Imperador, com um contrato de almas selando seu destino: a rainha jamais poderia deixar o Império de Ashen, mesmo suas cinzas deveriam permanecer. Em troca, durante vinte e cinco anos o imperador não deveria ameaçar a vida do seu filho. Ela não poderia garantir a segurança do príncipe após o vencimento do contrato, mas sabia que o seu garoto seria uma grande pessoa e escaparia por si só daquele tirano. E assim, abandonando quase tudo de mais precioso, a rainha embarcou na carruagem de Ashen em direção a sua nova vida: vida em que perderia tudo.

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Capítulo Revisado

A Herdeira do Ducado de CristalOnde histórias criam vida. Descubra agora