Três das quatro paredes do quarto de Anthony eram de vidro. Sua família perfeita morava numa das mais perfeitas casas de El Bonito, uma das poucas residências construídas sobre as falésias, com vista para o oceano. Seu pai era um respeitado juíz e empresário e sua mãe não precisava de emprego, então ela era linda. Seus irmãos eram brilhantes, e ele costumava ser mais que brilhante.
Anthony era perfeito.
Era.
Pelos últimos oito meses, todas as vezes que Anthony olhava para o horizonte ele se perguntava: "como alguém pode ficar deprimido com uma vista dessas?"
Justiça seja feita, ele passou muitos dias com as cortinas automáticas fechadas.
Recentemente, porém, Anthony estava se sentindo melhor ao olhar o brilho do sol nascendo sobre o mar, talvez até mais confiante. Talvez fosse o fato de poder voltar a estudar na Winston Prep, onde cresceu e basicamente se tornou quem é. Ou era.
Ele havia mudado muito nos últimos meses. Crescido, ele pensava. O nascer do sol havia se tornado seu momento favorito do dia, o cúmplice da rotina noturna pouco ortodoxa que Anthony levava há algum tempo. Consequência do acidente que havia sofrido durante um torneio de tênis no meio do semestre, combinado ao furacão emocional que o estava destruindo - ou reorganizando, como ele gostava de colocar. A fratura no tornozelo lhe causava dores todos os dias, o que consequentemente lhe deu acesso à codeína, uma substancia analgésica que o fazia sentir... Bem.
Todas as noites, por volta das dez, sua mãe parava na soleira da porta dos três filhos, desejando-lhes boa noite individualmente, lhes tecendo elogios e lhes presenteando com afirmações hippongas que nenhum dos garotos realmente entendia ou valorizava. Bem, Anthony valorizava. Depois da bênção materna, ele trancava a porta, usava seu vaporizador até sua pressão cair múltiplas vezes, assistia três ou quatro episódios de Mad Men, sua série de conforto, até perceber que "está muito tarde e ele precisa fazer alguma coisa para relaxar e dormir". Então ele escolhia entre xarope e comprimidos de sua substância de conforto, até ficar do jeito que gostava. Quando a codeína batia, o céu já era tingido de laranja e Anthony assistia o sol nascer.
Às vezes Anthony tomava codeína para outras dores: saudades, tristeza, tédio.
Algumas noites ele olhava as redes sociais de Diana por horas, enquanto ouvia Damien Rice ou Elliot Smith, até pegar no sono. Era como assistir "That 70s Show" quando Eric saiu da série, e a coisa não fazia mais sentido. O cenário era o mesmo, o elenco também, mas as piadas não eram assim tão engraçadas.
Anthony sentia falta de seu antigo ciclo de amigos, dos luxuosos prédios da Winston Prep, de ser o personagem principal, de ter Diana como par romântico na narrativa de sua vida. Nestas noites, lágrimas quentes rolavam sobre suas bochechas pálidas. Às vezes Anthony pegava o carro e dirigia pelo bairro de Di, ele via se a luz dela estava acesa e se lembrava de como era estar naquele mundo cor-de-rosa. Se lembrava da organização dela, lembrava como Di sempre o deixava escolher o que iam assistir, com alguma excessões, lembrava de passarem horas conversando sobre o que ele chamava de "coisas de verdade" — sobre as notas deles, os livros que estavam lendo, os planos do fim de semana, o caso que Anthony achava que seu pai estava tendo, o alcoolismo de sua mãe, o pai superprotetor de Di.
Outras noites, porém, quando seu pau falava mais alto que o coração, Anthony fazia sexo virtual com Mia, sua nova namorada ioiô da nova escola. Ele só havia conseguido transar com ela na vida real uma vez, e ele chorou quando ela foi embora.
Às vezes Anthony achava que Di havia roubado algo dele. Algo que só ela poderia devolver. Ele se perguntava o que fez ou disse de errado, o que a fez realmente odiá-lo tanto, odiá-lo para o que parecia ser para sempre.
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Imagine Being Yourself | luizapls
عاطفيةImagine superar um trauma. Imagine sofrer exílio social. Imagine descobrir sua sexualidade. Imagine deixar um vício. Imagine se apaixonar por alguém que não se pode ter. Imagine detestar seu namorado. Imagine ser verdadeiro com seus pais. Imagine a...