1. Instrumentos de produção e formas de propriedade

    ...Do primeiro, decorre a premissa de uma divisão do trabalho já desenvolvida e de um extenso comércio; do segundo, a localidade. No primeiro caso, os indivíduos têm de ser reunidos, no segundo caso descobrem-se, a par do instrumento de produção dado, a si próprios como instrumentos de produção. Entra aqui, portanto, a diferença entre os instrumentos de produção naturais e os que foram criados pela civilização. A terra (a água, etc.) pode ser considerada como um instrumento de produção natural. No primeiro caso, no caso de um instrumento de produção natural, os indivíduos são subordinados à natureza; no segundo caso, a um produto do trabalho. No primeiro caso, a propriedade (propriedade da terra) surge, por isso, também como domínio natural directo, no segundo como domínio do trabalho, em especial do trabalho acumulado, do capital. O primeiro caso pressupõe que os indivíduos se encontram ligados por algum vinculo, seja a família, a tribo, a própria terra, etc.; o segundo caso, que são independentes uns dos outros e apenas unidos pela troca. No primeiro caso, a troca é principalmente uma troca entre os homens e a natureza, uma troca em que o trabalho de um é trocado contra os produtos da outra; no segundo caso, ela é, predominantemente, troca dos homens entre si. No primeiro caso, chega o senso comum dos homens, a actividade manual e a intelectual não estão ainda separadas; no segundo caso, tem de estar já consumada na prática a divisão entre trabalho intelectual e manual. No primeiro caso, o domínio do proprietário sobre os não proprietários pode assentar em relações pessoais, sobre uma espécie de comunidade; no segundo caso, ele tem de ter assumido uma forma concreta num terceiro elemento, o dinheiro. No primeiro caso, existe a pequena indústria, mas subordinada à utilização do instrumento de produção natural, e por isso sem repartição do trabalho por vários indivíduos; no segundo caso, a indústria existe apenas na e pela divisão do trabalho.

    Até aqui temos tomado os instrumentos de produção como ponto de partida, e já aqui se revelou a necessidade da propriedade privada para certas etapas industriais. Na industrie extractive, a propriedade privada ainda coincide completamente com o trabalho; na pequena indústria, e em toda a agricultura até aos nossos dias, a propriedade é consequência necessária dos instrumentos de produção existentes; na grande indústria, pela primeira vez, é produto desta a contradição entre o instrumento de produção e a propriedade privada, e para produzir tal contradição tem de estar já muito desenvolvida. Por isso, só com a grande indústria é também possível a abolição da propriedade privada.

   2. A divisão do trabalho material e intelectual. Separação da cidade e do campo. O sistema das corporações

     A maior divisão do trabalho material e intelectual é a separação da cidade e do campo. A oposição [Gegensatz] entre a cidade e o campo começa com a transição da barbárie para a civilização, do sistema tribal para o Estado, da localidade para a nação, e estende-se através de toda a história da civilização até aos nossos dias (a Anti-Corn-Law League)

    Com a cidade, está ao mesmo tempo dada a necessidade da administração, da polícia, dos impostos, etc., em suma, do sistema municipal [des Gemeindewesens] e, assim, da política em geral. Aqui se revelou primeiro a divisão da população em duas grandes classes, a qual assenta directamente na divisão do trabalho e nos instrumentos de produção. A cidade é já a realidade da concentração da população, dos instrumentos de produção, do capital, dos prazeres, das necessidades, ao passo que o campo torna patente precisamente a realidade oposta, o isolamento e a solidão. A oposição entre cidade e campo só pode existir no quadro da propriedade privada. É a expressão mais crassa da subordinação do indivíduo à divisão do trabalho, a uma actividade determinada que lhe é imposta, uma subordinação que de um faz um animal limitado da cidade, do outro um animal limitado do campo, e que dia a dia de novo produz a oposição dos interesses de ambos. O trabalho é aqui, de novo, o principal, o poder sobre os indivíduos, e enquanto este existir tem de existir também a propriedade privada. A abolição da oposição de cidade e campo é uma das primeiras condições [42] da comunidade, uma condição que, por seu turno, depende de um grande número de premissas materiais e que a simples vontade não consegue preencher, como qualquer pessoa vê à primeira vista. (Estas condições têm ainda de ser aqui desenvolvidas.) A separação de cidade e campo pode ser também tomada como a divisão de capital e propriedade fundiária, como o começo de uma existência e desenvolvimento do capital independente da propriedade fundiária, do capital, ou seja, uma propriedade que tem a sua base meramente no trabalho e na troca.

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