ㅡ O que você quer dizer com "vamos terminar"?
Kaveh rugiu, parecendo indignado com a situação. Uma resposta abafada passou pelas paredes finas da casa, mas Haitham não foi capaz de ouvir claramente o que a outra pessoa dizia por causa dos fones de ouvidos.
Ele ponderou se deveria tirar o fone e ouvir melhor o que estava acontecendo. Ainda que tivesse desligado a música, os fones permaneciam no ouvido, o que dificultava apenas o suficiente o som de passar, fazendo difícil entender quando as pessoas não estavam gritando. Que, no caso, Kaveh estava.
ㅡ Mas que caralhos? Se você está preocupado com essa idiotice, então tudo bem! Vamos terminar! ㅡ Haitham conseguia imaginar a cara que seu sênior fazia no momento. Os olhos provavelmente estava cemicerrados, incrédulos com a audácia da pessoa em inventar uma desculpa qualquer. Ao mesmo tempo, ele estaria com uma aparência cansada, de quem não aguentava mais sempre a mesma coisa.
Porque, aparentemente, nenhum dos seus relacionamentos parecia funcionar. E quando eles terminavam, seus parceiros se recusavam a dar explicações que fizessem sentido.
Haitham tirou o fone por um segundo, ouvindo a porta da frente abrir e fechar, e massageou as orelhas levemente, colocando-os de volta e ligando a música outra vez, vestígios de sorriso escondidos em seus olhos.
Ele saiu de seu quarto e caminhou de forma casual pela sala até a cozinha, olhando de canto para o seu sênior sentado no sofá, os cotovelos apoiados nas pernas, as mãos nos cabelos, bagunçando-os, e com uma expressão raivosa que fazia os cantos dos seus olhos avermelharem levemente.
Haitham se recostou no balcão da cozinha com um copo de água na mão, tomando pequenos goles enquanto vislumbrava as costas quase nuas de seu sênior.
Kaveh levantou do sofá de repente e Haitham baixou os olhos, concentrando no copo de água, como se sequer tivesse percebido que ele estava lá. Ele conseguia ver com a visão periférica conforme Kaveh se aproximava dele, mas não ergueu os olhos do copo d'água até que os pés descalços do loiro estivessem em seu campo de visão.
Ele olhou Kaveh nos olhos, erguendo uma sobrancelha de forma indiferente, como se perguntando o que o seu sênior queria, e Kaveh indicou que ele tirasse os fones de ouvido.
Haitham atendeu seu pedido, pendurando-os ao redor do pescoço, deixando o som alto espalhar no pequeno espaço entre os dois.
Kaveh suspirou. Pelo volume do som, Haitham provavelmente não tinha ouvido nada, ele pensou.
ㅡ O que, Kaveh? ㅡ Haitham perguntou. Seu tom era plano, como sempre, sem demonstrar nenhuma emoção.
ㅡ Eu acabei de terminar com meu namorado. Quer beber um pouco?
ㅡ Outra vez? O que aconteceu agora? Ele te deixou porque a cor dos olhos dele e dos seus não fariam filhos bonitos? ㅡ Ele ironizou. Kaveh riu baixo.
ㅡ Não. Pior. Ele ficou bravo porque eu não queria me mudar daqui. ㅡ Haitham franziu o cenho, confuso. Essa era nova. ㅡ Segundo ele, você não me vê como colega de quarto!
Haitham pausou no meio do ato de tomar outro gole de água e estreitou os olhos.
ㅡ De qualquer forma, isso é apenas desculpa! Por que todos eles são covardes? Eles não poderiam simplesmente dizer que não gostam de mim? ㅡ Kaveh continuou. Haitham conteve um suspiro. Se Kaveh não levou a sério o que o último disse, então estava bem. ㅡ Então, desde que é sua culpa dessa vez, você bebe um pouco comigo? Eu realmente não estou com coragem de sair, mas se eu ficar sozinho eu vou enlouquecer de ódio. Por favor? Por favorzinho?
Haitham olhou para seu sênior que tinham olhos pidões, e deu de ombros.
ㅡ Claro. Desde que é minha culpa dessa vez. ㅡ Ele disse divertido. Kaveh, entretanto, enxergava cinismo nas palavras de seu júnior ao invés de divertimento. Não era sua culpa. Haitham quase nunca demonstrava emoções. Das poucas vezes, a maioria eram vistas quando os dois estavam brigando um com o outro, como sempre.
Eram raros momentos em que eles poderiam ter uma conversa civilizada como agora.
ㅡ Ótimo. ㅡ Kaveh disse, pegando uma garrafa de licor e dois copos do armário.
Haitham o seguiu para a sala e os dois sentaram no chão, as costas encostadas no sofá. Kaveh serviu a bebida para os dois e virou seu copo de uma vez, engolindo tudo. Em seguida, ele encheu o próprio copo e repetiu a cena mais umas três vezes, parecendo estar fumegando de raiva. Haitham não o impediu, observando seu sênior descontar o ódio na bebida por cima do seu próprio copo cheio, do qual ele só tinha tomado meio gole no momento em que Kaveh virou o quinto copo.
Após o quinto, ele pareceu se acalmar um pouco e voltou a beber como uma pessoa normal. Embora fosse meio tarde agora. Haitham já conseguia ver suas bochechas completamente coradas da bebida. Ele estava provavelmente ficando bêbado já.
ㅡ Você comeu alguma coisa hoje?
ㅡ Não! Eu estava ocupado com meu projeto quando aquele pedaço de merda fumegante chegou, então nem lembrei de comer. ㅡ Kaveh resmungou. Haitham suspirou e levantou. Kaveh o segurou pela calça.
ㅡ Onde você vai?
ㅡ Solte. ㅡ Ele colocou a mão na cabeça do seu sênior. ㅡ Vou pegar pelo menos um aperitivo para você preencher o estômago. Se você vomitar na casa inteira, eu vou ter que realizar o desejo do seu ex-namorado e te chutar pra fora dessa casa.
Kaveh soltou a calça dele obedientemente e ficou quieto esperando enquanto Haitham voltava.
Quando o acinzentado sentou outra vez ao seu lado, ele sequer perguntou o que exatamente era a comida apenas engoliu tudo. Quando ele terminou tudo, mostrou o prato vazio para Haitham, que apenas assentiu. Então, ele voltou a beber como se fosse seu último dia em Teyvat.
ㅡ Haitham, será que eu sou insuportável e ninguém aguenta ficar perto de mim? ㅡ Ele perguntou depois de um tempo. Hatiham olhou para seu sênior, seu pobre sênior, que tinha os olhos marejados, e conteve um suspiro em seu coração.
ㅡ Claro que não. Eu não estou aqui? ㅡ Haitham disse de forma gentil. Se Kaveh estivesse são, com certeza iria notar que havia algo estranho com aquele Haitham de hoje.
ㅡ Não é a mesma coisa. ㅡ Ele protestou. ㅡ Não é como se você fosse namorar comigo.
Haitham ficou sem palavras para responder. Namorar com Kaveh? Claro que ele queria. Deuses, ele queria tanto. Mas Kaveh nunca o viu como nada além de seu júnior. Suspirando, ele virou o copo de bebida em sua boca. Depois, ele disse:
ㅡ O fato de que eu moro com você esse tempo todo não serve pra nada? Se você fosse realmente insuportável, você acha mesmo que uma pessoa que sequer namora com você, e não ganha nada em dividir o espaço, continuaria a viver assim?
Kaveh o encarou, o cenho franzido em confusão.
ㅡ Mas nós estamos sempre brigando. Nós brigamos tão feio daquela vez que não nos falamos por anos. Tenho certeza de que você só me deixou morar com você porque sentiu pena de mim, porque, no final das contas, você estava certo.
ㅡ Kaveh... ㅡ Haitham suspirou outra vez e colocou a mão no cabelo dele, acariciando seus fios de forma suave. Poderia ser um pouco perigoso, mas Kaveh estava com aqueles olhos de quem começaria a chorar a qualquer segundo. ㅡ Eu nunca senti pena de você. Eu estava apenas feliz que você sentiu que poderia confiar em mim outra vez. Eu não deixaria meu querido sênior desamparado em uma situação dessas.
O toque de Haitham era tão gentil que Kaveh sentia cada vez mais vontade de chorar. Até mesmo em seu estado embriagado, ele conseguiu notar que Haitham estava diferente.
ㅡ Estar me consolando assim... É tão diferente de você, Haitham. ㅡ Ele murmurou. Haitham pausou por um segundo e, em seguida, riu de leve.
ㅡ O que eu posso fazer? Você disse que era minha culpa.
Kaveh sorriu de canto, mas não respondeu.
Era realmente culpa de Haitham. Todos aqueles relacionamentos terminados, eram todos culpa dele. Se não pelo fato de que ele fez os pretendentes de Kaveh terminarem com ele diretamente, ao descobrir cada uma de suas artimanhas, e ameaçar jogá-los na prisão, ou apenas pelo fato de que ele sempre estava ao redor de Kaveh, olhando de forma nada feliz para os outros, dos quais ele não tinha encontrado nada.
Nenhum deles era bom o suficiente para seu Kaveh. Ninguém seria bom o suficiente se não conseguisse aguentar algumas simples encaradas de Haitham. Se não estivesse disposto a enfrentar tudo de ruim para estar com ele. Enquanto não houvesse alguém assim, Haitham jamais permitiria que seu Kaveh fosse levado embora. Quanto a um destes, bem, ele ainda teria que aparecer. Haitham não gostava de focar em hipóteses que poderiam nunca acontecer.
Haitham ajudou Kaveh a terminar o licor, e então o ajudou a ir para a cama, visto que o loiro estava tão bêbado que mal conseguia andar. Ele também tinha bebido consideravelmente, mas não tanto quanto seu sênior.
Na cama, Haitham o cobriu com o lençol e se virou para ir embora. Kaveh segurou seu pulso.
ㅡ Obrigada, Haitham. ㅡ Ele disse de forma suave. Haitham se virou para ele outra vez, e sorriu de canto.
ㅡ Não se preocupe com isso. Apenas durma. ㅡ Ele acariciou seus fios outra vez e, em um impulso, depositou um beijo na testa do seu sênior. ㅡ Boa noite, meu querido Kaveh.
ㅡ Boa noite. ㅡ Kaveh respondeu fraquinho, já de olhos fechados.
Haitham saiu do quarto dele e foi para o seu. Lá, ele se enfiou na cama e cobriu os olhos, ciente de que suas orelhas estavam vermelhas.
****
Quando Kaveh acordou na manhã seguinte, a primeira coisa que ele notou foi a dor de cabeça tenebrosa que ele estava tendo. A segunda foi que, muitas das suas memórias da noite passada estavam embaçadas. Como ele tinha chegado na cama?
Ele forçou o seu cérebro a lembrar, ignorando a dor de cabeça, e teve algumas lembranças fragmentadas de Haitham praticamente o carregando no colo e o colocando na cama e então... Um beijo? Ah, não, não, não. Aquilo não poderia estar certo. Talvez ele sonhou com aquilo? Onde Haitham seria tão gentil? Já era estranho o suficiente que ele tivesse levado-o até a cama. Um beijo? Há! Até parece. Ele provavelmente sonhou. Apesar de não fazer ideia de como o seu cérebro escolheria logo algo assim para sonhar.
Levantando da cama, Kaveh foi direto para o banheiro e tomou um banho, tirando todo o cheiro do álcool da noite anterior. Depois, ele foi para a cozinha, onde encontrou Haitham sentado, tomando café da manhã, de fones de ouvido postos, como sempre, e um livro na mão.
Kaveh parou na frente dele, dando uma batida na mesa com os dedos, atraindo a atenção de Haitham.
ㅡ Bom dia, Kaveh. ㅡ Ele disse, retirando os fones.
ㅡ Bom dia. ㅡ Kaveh respondeu, se sentindo estranho. ㅡ Escuta, sobre ontem à noite...
ㅡ Hum?
ㅡ Obrigada por cuidar de mim. Eu não lembro muito bem o que aconteceu, mas você manteve companhia comigo o tempo todo enquanto eu chorava minhas pitangas e depois até me colocou na cama, então, obrigada.
ㅡ Tudo bem. ㅡ Haitham disse em seu melhor tom de voz sem emoção.
Kaveh olhou com atenção para o rosto dele, tentando encontrar alguma pista de que não tinha sonhado com aquilo, mas Haitham mantinha a mesma cara de paisagem de sempre. Não tem como ele ter feito isso, pensou enquanto revirava os olhos mentalmente.
Kaveh assentiu e sentou na mesa, servindo uma xícara de café para si mesmo. Com sorte, aquilo faria sua cabeça melhorar. De outra forma, seria um longo dia.
Quando Kaveh focou no café da manhã, Haitham se permitiu analisá-lo um pouco. Ele queria perguntar se o sênior se sentia melhor, mas no fim, conteve a língua. Kaveh dizia que não lembrava de tudo o que aconteceu ontem, então ele tinha esquecido do beijo, certo? Era melhor assim. As coisas ficariam estranhas, caso contrário.
Durante o café, Haitham notou que Kaveh continuava a esfregar a testa, com o cenho franzido.
ㅡ Você está com dor de cabeça? ㅡ Perguntou. Kaveh o encarou, com um sorriso constrangido.
ㅡ Sim, eu bebi demais ontem.
Haitham escondeu o sorriso e terminou de tomar o seu café, levantando da mesa. Ele foi até o armário e retirou um potinho de medicamento, e o entregou para seu sênior.
ㅡ Tome um depois que terminar o café. Só um. Eles são fortes.
ㅡ Isso é remédio para dor de cabeça? ㅡ Kaveh perguntou surpreso. Haitham assentiu. ㅡ Por que você tem um estoque deles? Você sente muita dor de cabeça?
ㅡ Algumas vezes. Tighnari me prepara um pouco todo mês.
ㅡ Eu... Não sabia. ㅡ Kaveh murmurou. Haitham deu de ombros. ㅡ Obrigada, Haitham.
ㅡ Sem problema. ㅡ Haitham quase ergueu a mão e acariciou o cabelo dele de novo, mas se conteve. Não era algo que ele deveria se acostumar a fazer. Apesar de o cabelo de Kaveh ser muito macio. ㅡ Deite um pouco depois de tomar o remédio. Eles dão bastante sono.
Kaveh o viu sair de casa, e terminou de tomar seu café da manhã, brincando com o vidro com o remédio. Era estranho que morasse com Haitham há meses e não soubesse disso. Mesmo que eles se mantivessem cada um em seu próprio espaço e cuidassem da própria vida, não era algo que ele deveria saber, como seu colega de apartamento?
Kaveh suspirou e deu de ombros. Depois que ele terminou de tomar café, ele tomou o remédio e lavou as louças. Quando ele voltou para o quarto, pensando em trabalhar um pouco em seu novo projeto, o sono praticamente o derrubou na cama, então ele desistiu e foi tirar um cochilo.
****
Haitham chegou em casa pontualmente às 17:15, como todos os dias. Ainda que estivesse preso no cargo de Grão-Sábio Interino, ele se recusava a ficar mais tempo que o seu horário. Saía do trabalho às 17 horas em ponto, todos os dias, e caminhava para casa, apenas parando, às vezes, para comprar alguma coisa no Grande Bazar.
Quando abriu a porta, Kaveh estava esparramado no sofá, com a mesa de centro empilhada de papéis e ferramentas de desenho. Ouvindo a porta abrir, Kaveh tirou o braço dos olhos e encarou Haitham.
ㅡ Você voltou.
ㅡ Hum. ㅡ Haitham concordou com um aceno.
ㅡ O que era aquele remédio? Eu ainda estou grogue depois de dormir a tarde inteira! ㅡ Kaveh reclamou.
ㅡ Você teria que perguntar para Tighnari. Eu não sei as especificações. Não deveria ser tão forte assim. Geralmente eu fico apenas com um pouco de sono. Não é por causa da sua ressaca? ㅡ Ele perguntou, olhando para Kaveh pensativo. Este suspirou e jogou a cabeça para trás no encosto do sofá.
ㅡ Talvez. Ou talvez você desenvolveu tolerância aos efeitos.
ㅡ É uma possibilidade.
Vendo que Kaveh não comentou mais nada, Haitham foi para a cozinha, se preparando para fazer o jantar. Para sua surpresa, havia comida feita em uma travessa na mesa.
ㅡ Você fez isso? ㅡ Ele aumentou a voz um pouco.
ㅡ Nilou passou aqui agora pouco e nos trouxe isso. Aparentemente teve algum tipo de evento no Bazar mais cedo. ㅡ Kaveh respondeu.
ㅡ Eu vejo. ㅡ Haitham murmurou.
O silêncio se estendeu e o júnior foi para o seu quarto, deixando Kaveh esparramado na sala.
Kaveh abriu os olhos e olhou na direção da porta do quarto de Haitham. Ele tivera um sonho esquisito durante a tarde onde Haitham o chamava de "meu querido sênior". Não fazia o menor sentido. Eles sempre estavam se bicando. Será que finalmente tinha perdido a cabeça? Talvez estivesse tão cansado das afeições falsas no mundo real que começou a produzi-las subconscientemente em seu sonho. A única coisa intrigamente era o fato de que Haitham quem as demonstrava. Kaveh se perguntava como ele reagiria se o contasse sobre os sonhos.
Melhor não, pensou. É o primeiro dia em algum tempo em que não brigamos.
Suspirando, Kaveh se ergueu do sofá e se obrigou a focar nos desenhos à sua frente.
O término de mais um relacionamento fracassado ele não poderia resolver, mas poderia tentar sair do vermelho e começar a ganhar dinheiro logo.
****
ㅡ Senhor Grão-Sábio Interino, será que você poderia liberar o orçamento do meu Darshan?
A voz de Kaveh estava apenas demonstrando o suficiente de raiva pela forma em que ele falava entredentes. Haitham escondeu o sorriso. Era tão engraçado o fato de que Kaveh era sempre aquele que era mandado para renegociar o orçamento.
ㅡ A proposta não está boa o suficiente. Revise-a e mande-a para aprovação outra vez. ㅡ Haitham disse em seu usual tom de voz plano.
ㅡ Exatamente o que você espera da proposta?! Já é a terceira vez! ㅡ Kaveh estava a um passo de avançar por cima da mesa e sacudir os ombros largos dele.
ㅡ Há muitos pontos incertos acerca do custeio dos materiais, bem como as despesas de viagem não estão bem delimitadas, o que dificulta a avaliação. Além disso, você não deixa claro por quanto tempo o projeto vai durar, o que não permite elaborar um orçamento preciso, visto que...
Kaveh estava encarando a boca Haitham mexendo, mas as palavras não estavam mais sequer entrando em seus ouvidos. Em sua mente, ele conseguia se ver com as mãos ao redor do pescoço de Haitham. Aquilo trazia uma paz de espírito indescritível.
ㅡ Você sequer está escutando? ㅡ A voz impaciente de Haitham o tirou dos seu lugar feliz onde ele esganava o outro até a morte.
ㅡ Haitham, quando é que vão escolher outro Grão-Sábio? Um de verdade. ㅡ Kaveh mudou de assunto.
ㅡ Eu pergunto para Lorde Menor Kusanali todos os dias. Ela não me deu uma resposta clara até agora. ㅡ Haitham murmurou. Kaveh esfregou os olhos e suspirou, sentando na beirada da mesa de Haitham.
ㅡ Então você não pode fazer, sei lá, um documento detalhando exatamente quais mínimos detalhes insignificantes você precisa para parar de me encher o saco? O que eu preciso fazer pra você aprovar de uma vez a droga da minha proposta?
Haitham engoliu em seco quando ele se inclinou. Droga. Seu coração começou a bater forte no peito e seus pensamentos lógicos escoaram para a casa do caralho. Tudo o que ele queria dizer era que se Kaveh deitasse naquela mesa e deixasse Haitham tratá-lo como queria, ele aprovaria tudo o que o outro pedisse. Porém, não era correto. Muito menos conveniente. Então ele escolheu a opção mais sensata: irritar Kaveh até que ele saísse furioso da sala, para que Haitham pudesse recuperar sua compostura.
ㅡ Não está na descrição do meu trabalho ensinar as pessoas como fazerem seu trabalho. ㅡ Ele se reclinou na cadeira, em uma posição relaxada que fez o sangue de Kaveh ferver de ódio.
ㅡ Você é insuportável! ㅡ Kaveh gritou. ㅡ Por que eu sequer tento?
Ele queria chutar a cara de Haitham para liberar um pouco do estresse. Parecia que todos os problemas da sua vida eram causados por Haitham ultimamente.
Seu corpo reagiu antes que sua mente pudesse. Ele girou o corpo na mesa, o pé mirando diretamente para seu peito. Não tinha muita força, só o suficiente para descontar um pouco da irritação que Haitham o fazia sentir no momento.
Talvez fosse porque ele não tinha realmente colocado sua raiva no movimento, mas Haitham segurou seu tornozelo com facilidade, seus dedos firmes parecendo quentes na sua pele.
ㅡ O que foi? Finalmente me odeia o suficiente? ㅡ Haitham perguntou sem soltá-lo.
ㅡ Sim! Não consigo suportar você mais! Mas não consigo me livrar de você porque você não me deixa trabalhar!
ㅡ Então, você está dizendo que se eu aprovar esse projeto você vai embora?
ㅡ Sim! ㅡ Kaveh repetiu.
ㅡ Tudo bem. Desde que você não se arrependa.
Ainda segurando seu tornozelo, Haitham se inclinou para a frente para alcançar o projeto que estava no fim da mesa. Sem soltar de Kaveh, ele assinou a autorização do projeto.
Com os dedos quentes em sua pele, Kaveh observou conforme Haitham levantava os olhos e o encarava.
ㅡ Feliz agora? ㅡ Os dedos de Haitham apertaram levamente seu tornozelo. A posição era um pouco estranha, pois Kaveh estava completamente sentado na mesa, de frente para Haitham, enquanto o encarava de cima.
Kaveh engoliu em seco, desconcertado por algum motivo.
ㅡ Sim!
ㅡ Ótimo. Tenha uma boa vida, Kaveh. ㅡ Haitham soltou sua perna e Kaveh escapou dele como o diabo fugindo da cruz, levando o projeto assinado consigo e batendo a porta atrás de si.
Haitham olhou para a porta, pensando que Kaveh era absolutamente deslumbrante mesmo enquanto quebrava seu coração. Outra vez.
****
Kaveh escutou um xingamento distante e o barulho da porta da frente abrindo mais tarde naquela noite.
Já passava das nove e Haitham não tinha ido para casa, o que era, no mínimo, estranho.
Ele caminhou na ponta dos pés até a porta do seu quarto e abriu uma fresta, observando a situação na sala. Tighnari estava apoiando Haitham até o sofá, onde o jogou, com uma cara nada boa.
Haitham fechou os olhos e os cobriu com o antebraço.
ㅡ Onde está o remédio? ㅡ Kaveh escutou Tighnari perguntar.
ㅡ No armário da cozinha.
Tighnari foi até a cozinha e achou o pote com remédio, pegando um copo de água pelo caminho.
Kaveh observou Haitham abrir os olhos apenas o suficiente para engolir o remédio.
ㅡ Você quer que eu te leve para a sua cama? ㅡ Tighnari perguntou.
ㅡ Estou bem. Você pode ir.
ㅡ Está bem. Mas da próxima vez que você resolver beber quando estiver com enxaqueca, eu vou te deixar morrer sozinho.
ㅡ Obrigado. Mal posso esperar. ㅡ Haitham murmurou. Tighnari suspirou.
ㅡ A culpa de você estar nessa situação não é sua? Não tente ganhar minha simpatia fingindo ser um pobre coitado.
ㅡ Não é como se fosse acontecer outra vez.
ㅡ Foi isso que eu ouvi anos atrás, mas aí está você outra vez, com o coração partido de novo. Pela mesma pessoa.
Kaveh, que estivera escutando apenas com uma leve curiosidade, arregalou os olhos ao ouvir isso. Haitham? Apaixonado? Como isso era possível? Ele sequer tinha emoções suficientes para isso.
Ele fechou a porta por instinto. Talvez não devesse estar escutando aquilo.
Tighnari percebeu a movimentação pelo canto de olho, mas não comentou nada.
ㅡ Você pode ir. ㅡ Haitham disse. Tighnari assentiu.
ㅡ Você precisa parar de fazer isso consigo mesmo.
ㅡ Eu sei. Eu vou.
ㅡ Acho bom mesmo. Boa noite.
ㅡ Boa noite, Tighnari.
Kaveh escutou a porta fechar e o silêncio reinar na casa. Ele ficou esperando o barulho de Haitham ir para o quarto por um longo tempo, mas suas expectativas foram frustradas.
Talvez devesse ajudar? Aparentemente Haitham estava com dor de cabeça. Seria devolver o favor do outro dia, certo? Não importava que tivessem brigado outra vez. Não era como se fosse a primeira nem a última briga deles.
Decidido, ele saiu do quarto, encontrando Haitham na mesma posição de mais cedo. Kaveh parou na frente dele e o encarou por um momento, sem dizer nada.
ㅡ Haitham? ㅡ Chamou, por fim. Haitham abriu os olhos. De perto, Kaveh conseguia ver que estavam vermelhos, como se ele tivesse chorado. O que era ridículo. Haitham nunca choraria.
ㅡ Ainda aqui? Achei que você tivesse corrido na primeira oportunidade.
Kaveh o ignorou.
ㅡ Levante, vou te ajudar a ir até a cama.
ㅡ Sênior está tão solícito hoje. Você está feliz assim que em breve não vai mais precisar me ver que até consegue sentir simpatia por mim?
Kaveh franziu o cenho. Aquelas palavras... Eram um pouco estranhas.
ㅡ Por que eu sentiria simpatia por você? Eu só não quero que você reclame do barulho de madrugada quando eu levantar para tomar água.
ㅡ Entendo. Faz sentido. ㅡ Haitham assentiu.
ㅡ Então, cama. ㅡ Kaveh estendeu a mão, impaciente. Haitham segurou-a, o que surpreendeu um pouco Kaveh.
Ele apoiou seu júnior até a cama, fazendo-o deitar.
ㅡ Quando você vai embora?
ㅡ O que? Você está com tanta pressa assim de se livrar de mim? ㅡ Kaveh perguntou indignado.
ㅡ Não é o contrário? ㅡ Haitham perguntou com a voz plana. ㅡ Você mesmo disse hoje.
ㅡ É, eu disse. Mas isso é porque você sempre diz que eu sou um incômodo!
ㅡ Quando eu sequer disse isso? ㅡ Haitham franziu o cenho. ㅡ De fato, eu não disse exatamente que você não me incomoda, da última vez?
Kaveh engoliu a resposta. Se ele pensasse bem... Era verdade.
ㅡ Suas palavras são diferentes de suas ações. ㅡ Disse, por fim. Haitham ficou em silêncio por um tempo antes de suspirar.
ㅡ Vejo que você tem alguns desentendimentos sobre mim. Não importa. O fato é que você não me suporta. Assim, é melhor que você vá. Mesmo que eu quisesse, não teria como fazer você ficar.
ㅡ Então você não quer que eu fique?
ㅡ Não quero. Por que eu iria querer te forçar a conviver comigo?
ㅡ Certo. Não se preocupe. Eu vou assim que a data do projeto for decidida.
ㅡ Bom. Agora, boa noite, Kaveh.
ㅡ É, boa noite.
Kaveh saiu do quarto dele com uma sensação ruim se espalhando pelo corpo. Ele não tinha certeza do porquê, mas aquela rachadura entre eles parecia formar um penhasco intransponível.
****
Os parceiros de projeto de Kaveh decidiram que a data seria dali um mês. Era apenas tempo o suficiente para arrumar tudo e partir.
Nesse meio tempo, Kaveh descobriu que Haitham parecia ter sumido do mapa. Ele ainda estava trabalhando, é claro, mas Kaveh não teve um vislumbre sequer dele, como se ele fosse um fantasma.
De repente, ele descobriu que, aparentemente, Haitham fazia parte de seu dia-a-dia mais do que ele imaginava.
Antes, quando ele chegava em casa tarde, Haitham sempre estava na sala, os fones de ouvido postos, lendo um livro. A comida estava pronta. Havia companhia para conversar, ainda que fossem conversas enfurecedoras. O ambiente podia ser considerado até mesmo acolhedor.
Agora, Kaveh tropeçava nos móveis tentando acender a luz quando chegava em casa, o que o fez perceber que ele nunca precisou decorar o caminho da porta da frente até o interruptor antes. O local era frio e inóspito, como se ninguém vivesse ali. Não havia comida deliciosa que o carregasse direto da porta para a cozinha, e suas artes penduradas na parede não respondiam os argumentos que ele propunha.
Era como se a presença de Haitham, que sempre pareceu fria, na verdade fosse o único pedaço de lenha queimando na lareira da sua vida, e agora até mesmo isso tinha ido embora.
O que era irônico, pois Haitham claramente vivia ali e ele era quem iria embora.
As palavras de Haitham ecoaram na sua mente outra vez. Desde que você não se arrependa.
O que ele queria dizer com isso? Que Kaveh iria se arrepender de ir embora? Claro que não.
Apesar disso, aquela sensação de estranheza não largava de si desde a última vez que viu Haitham. Querendo ou não, Haitham foi a pessoa que o acolheu quando Kaveh precisava. Foi ele que presenciou seus momentos mais embaraçosos.
Em suma, Kaveh sentia que precisava conversar com Haitham antes de ir embora. Nem que fosse apenas para agradecer por tudo e esclarecer as coisas.
Ele tentou esperar Haitham voltar para casa várias vezes, mas todas as noites acabava por pegar no sono deitado no sofá antes que Haitham chegasse. Quando acordava no outro dia, havia apenas uma coberta sobre si, o que indicava que seu júnior tinha estado ali em algum momento. Mas ele nunca estava por perto quando Kaveh acordava.
Era frustrante. Kaveh estava tão bravo que passava o dia bufando, o que fez seus colegas de projeto o darem os últimos dias antes da viagem de folga, enquanto eles terminavam de organizar tudo.
Assim, era meio da tarde quando Kaveh voltou para casa e encontrou Haitham sentado no chão, uma garrafa de licor na sua frente, praticamente vazia.
ㅡ Você finalmente está em casa. ㅡ Ele disse. Haitham o encarou por um segundo antes de virar o copo de licor. Então ele levantou, assentiu, e começou a caminhar na direção do próprio quarto, levando a garrafa consigo.
Kaveh caminhou apressado até ele e o segurou pelo pulso.
ㅡ Espere. Precisamos conversar.
ㅡ Nós já estamos conversados. Não há nada mais para dizer. Estou fazendo o que posso para não incomodar você até que você vá embora.
ㅡ Haitham! ㅡ Kaveh disse entredentes. ㅡ Você pode parar com o joguinho?
Haitham se virou para ele e o olhou com confusão nos olhos.
ㅡ Que joguinho exatamente você acha que eu estou jogando? Tudo o que eu estou fazendo é o que você quer! Se você diz que não me suporta, então você não me suporta! Por que você se força a tentar conversar comigo se não gosta? Eu não te pedi para fazer isso. Na verdade, nunca pedi nada de você. Kaveh, eu não sei o que você quer de mim mais. ㅡ Haitham finalmente explodiu, deixando Kaveh desconcertado. Geralmente ele era o que perdia a paciência. Haitham era quem fazia o papel de cínico e despreocupado. Naquele momento, Kaveh poderia jurar que estava vendo traços de tristeza nos olhos de Haitham. Mas não era possível. Com o que Haitham estaria triste?
ㅡ Eu só queria agradecer. Eu sei que nós brigamos muito, e você consegue me irritar como ninguém, mas você me ajudou muito. ㅡ Kaveh suspirou.
ㅡ Não tem motivo para agradecer. ㅡ Haitham murmurou, tomando um gole direto da garrafa.
ㅡ Sobre o que eu disse, sobre não te suportar...
ㅡ Está tudo bem. Você não me deve nada.
ㅡ Você é irritante. É só isso. É como se você soubesse examente qual chave virar para me deixar maluco. Não é que eu não te suporto. Eu só não consigo lidar com o modo como você me deixa furioso. Não nos demos bem no outro dia, quando eu terminei meu namoro, quando você não estava sendo irritante de propósito?
Haitham o encarou e assentiu.
ㅡ Ok. Entendi o meu erro. Boa noite.
Kaveh assistiu embasbacado enquanto Haitham entrava no quarto e fechava a porta.
Aquilo poderia ser considerado uma conversa?
Sendo ou não, parece que tinha acabado. Kaveh tinha feito tudo que podia.
****
Quando acordou na manhã seguinte, Kaveh notou que havia algo diferente. Num primeiro momento, ele não soube o que era, mas quando respirou fundo, percebeu que era o cheiro de comida recém-feita que se espalhava pela casa.
Surpreso, Kaveh levantou rapidamente e saiu do quarto, encontrando Haitham na cozinha, com seus característicos fones de ouvido, enquanto mexia mas panelas.
Seus pés pareciam colados no chão enquanto ele observava a cena, que tinha sido tão costumeira um dia, mas que era mais escassa que qualquer coisa ultimamente.
Não foi até Haitham se virar e vê-lo que ele reagiu.
ㅡ Bom dia, Kaveh.
ㅡ Bom dia...? ㅡ Respondeu atordoado. O que era aquilo? A conversa, de alguma forma misteriosa, tinha funcionado? ㅡ Você não deveria estar trabalhando? ㅡ Kaveh perguntou confuso.
ㅡ Lorde Menor Kusanali me mandou embora da Academia, dizendo que eu estava trabalhando demais. Ela me disse pra voltar só na semana que vem.
ㅡ Como é possível que você esteve trabalhando demais? Não é você que sai todos os dias em ponto?
ㅡ Eu precisava me distrair e o trabalho estava ali, então apenas o fiz. ㅡ Haitham deu de ombros.
ㅡ Se distrair de quê?
ㅡ Não importa. Já passou.
Kaveh não disse nada, mas ele estava pensando no que tinha ouvido. Haitham estava realmente de coração partido? Se sim, por quem seria?
ㅡ Quem é a pessoa que você gosta? ㅡ Kaveh perguntou sem pensar. Haitham o encarou surpreso.
ㅡ Como você sabe que eu gosto de alguém?
Ele disse "gosto", Kaveh pensou, não "gostava". O que queria dizer que, se já tinha passado, eles tinham se acertado. Haitham estava namorando?
ㅡ Eu apenas ouvi casualmente no outro dia. ㅡ Mentiu. Haitham assentiu e levou sua mão esquerda até uma mecha do cabelo de Kaveh que estava na frente se seu olho, colocando-a atrás da orelha.
ㅡ Depois eu te conto. Agora não.
ㅡ Oh. Okay. ㅡ Ele respondeu manso.
ㅡ Sente e tome café.
A situação era tão estranha que Kaveh apenas fez o que ele mandou. O que estava acontecendo? Haitham estava assim porque tinha se acertado com a pessoa que ele gostava, então estava de bom humor? Era tão esquisito.
Se Haitham fosse assim o tempo todo, eles não brigariam tanto, provavelmente.
Kaveh engoliu o café da manhã sem dizer mais nada, mas encarava Haitham pelo canto de olho de tempos em tempos. Se Haitham o viu fazer isso, nada comentou.
Depois, Kaveh lavou a louça, enquanto Haitham sentava no sofá com um livro. Eles não conversaram mais, mas por algum motivo, Kaveh estava aliviado com as coisas daquele jeito. Era aquela sensação de familiaridade, de quando a casa parecia acolhedora, que ele não sentia há algum tempo. O nó em seu peito se desfez um pouco.
Não foi até perto da hora do almoço que Haitham abriu a boca outra vez.
ㅡ Por que você não foi para a Academia?
ㅡ Ah, eles me disseram que eu andava muito estressado e me mandaram descansar enquanto terminavam de organizar tudo para a viagem.
ㅡ Por que o estresse? Achei que sua maior fonte de raiva teria se esvaído depois que eu aprovei o projeto. ㅡ Haitham disse, em tom quase brincalhão. Talvez aquela fosse uma das poucas vezes em que Kaveh percebeu que Haitham não usava apenas do cinismo para conversar. Era uma descoberta desconcertante para o momento.
ㅡ Vai ser uma longa viagem. É muita coisa para fazer. ㅡ Kaveh respondeu. Não era como se pudesse dizer na cara de Haitham que era culpa dele, certo? As coisas finalmente pareciam menos tensas.
ㅡ Tenho certeza de que as outras pessoas do seu Darshan conseguem lidar com isso. Já que você está de folga também, apenas aproveite para descansar antes de ir. O deserto nunca é fácil.
Haitham tinha certeza de que os outros cuidariam muito bem dos preparativos. Ele se garantiu de ter uma conversa com eles pessoalmente.
Kaveh apenas assentiu, realmente surpreso por não encontrar nem mesmo uma pequena dose de sarcasmo nas palavras dele. Será que estava ouvindo coisas? Ou será que ele só nunca tinha percebido e julgou Haitham erroneamente durante esse tempo todo?
ㅡ Ah, certo. Hoje a Nilou me chamou para ir almoçar com ela no Grande Bazar, você quer vir? ㅡ Kaveh perguntou. Haitham o encarou por um segundo e depois negou.
ㅡ Obrigado pelo convite, mas é melhor que você vá sem mim. ㅡ Haitham disse. Uma parcela dos ex-namorados de Kaveh gostava de estar ali durante o almoço. A maioria corria para longe quando via Haitham. Era melhor que Kaveh não visse essa cena, ou poderia acabar se perguntando o porquê.
Ainda que Kaveh fosse embora, Haitham não podia deixar de querer que ele partisse com um pouco menos do preconceito que tinha contra si.
Ontem a noite ele finalmente tinha entendido porque Kaveh o odiava tanto, então, mesmo que não fosse capaz de fazer com que ele se apaixonasse por si, Haitham ainda tinha esperanças de que pudesse desfazer um pouco daquele sentimento ruim.
Ele deveria ter sabido que seu comportamento não era o melhor para disseminar bons sentimentos entre eles, mas Haitham não tinha experiência e, bem, as coisas tinham funcionando para Cyno. Quem diria que o amor seria impossível para ele, que havia estudado tantas línguas, mas que não conseguia decifrar a linguagem do amor.
Agora era tarde demais. Ele deveria pelo menos tentar se despedir de Kaveh em bons termos dessa vez.
****
Nilou acenou para Kaveh na entrada do Grande Bazar. Ele foi até ela e a cumprimentou com um sorriso.
ㅡ Já faz um tempo que eu não venho aqui. ㅡ Ele disse. Nilou assentiu.
ㅡ A última vez foi há mais de um mês. Como está o projeto? Ainda brigando com Alhaitham?
Kaveh suspirou enquanto a seguia para dentro do Grande Bazar, e contou tudo o que tinha acontecido durante esse tempo para a amiga, inclusive a cena dessa manhã.
Nilou parecia muito entretida com a história, mas se limitou a falar apenas uma coisa no final:
ㅡ Bem, é claro. Tudo faz sentido agora. Eu me perguntei porque motivo ele colocaria todos os seus namorados para correr! Então é porque ele gosta de você, afinal.
ㅡ Hã??? Que parte da história toda fez você chegar a essa conclusão? ㅡ Kaveh perguntou confuso. ㅡ E que história é essa de ele espantar todos os meus namorados?
ㅡ Oh, não. Eu falei demais! Finja que não ouviu isso! Venha, todo mundo está te esperando para comer. ㅡ Nilou tentou desconversar. Kaveh cruzou os braços e a encarou, esperando. Nilou suspirou e balançou a cabeça. ㅡ Esqueça, esqueça. Eu estou falando besteira! Anda, vamos.
ㅡ Nilou. ㅡ Kaveh a encarou sério. Nilou abaixou a cabeça, mas acabou por falar:
ㅡ Ugh. Está bem. Eu ouvi alguns dos seus exes conversando no outro dia por acidente. Eles se encontraram por ali e começaram a falar suas experiências com Haitham enxotando-os. Alguns foram ameaçados de prisão por pequenos crimes que cometeram. Outros simplesmente não aguentaram a presença ameaçadora do Escriba e te largaram... Enfim, era quase como um grupo anti-Alhaitham.
ㅡ Então, você está dizendo que ele colocou todos aqueles caras para correr? ㅡ Kaveh recebeu um aceno de cabeça de Nilou. Ele sentiu seu sangue ferver. Então o tempo todo que ele sofreu, era tudo culpa de Haitham? E ele ainda teve a coragem de fingir que o estava consolando?
ㅡ Hum... Kaveh? ㅡ Nilou disse hesitante.
ㅡ Você ainda não me respondeu. O que fez você pensar que ele gosta de mim?
ㅡ Ah. Olhando para o quadro geral, é a única explicação. Eu não sei como te dizer de outra forma. Parece muito óbvio até para mim. ㅡ Nilou disse.
Kaveh não tinha certeza de como deveria reagir. Como ele conseguiria acreditar nisso? Haitham gostar dele? Por favor. Haitham sequer sentia emoção suficiente para isso. Por que ele gostaria de Kaveh?
Mesmo que ele gostasse de alguém... Espera. Tighnari não tinha dito na outra noite sobre Haitham ter tido o coração partido? Kaveh claramente não tinha...
As lembranças do dia voltaram para ele. Foi no mesmo dia em que eles tinham brigado. Mas aquilo era só coincidência, certo? Eles brigavam tanto...
Nilou percebeu que Kaveh estava meio perdido, então o empurrou até um canto e o fez sentar.
ㅡ Ei, pare de pensar nisso, que tal? Talvez eu esteja errada.
ㅡ Se você não tem certeza, por que disse isso? Esse tipo de coisa...
ㅡ Eu sei, eu sei. Me desculpe. Apenas esqueça. Definitivamente estou errada.
ㅡ Sim, você definitivamente está errada. Se você tivesse dito isso sobre qualquer outra pessoa, eu acreditaria, mas é sobre Haitham que estamos falando...
ㅡ Certo, certo. Então esqueça. Vamos comer! Sabe a deusa quanto tempo você vai ficar fora durante esse projeto. Vai ser a última oportunidade de reunir todo mundo em algum tempo.
ㅡ É, vamos comer. ㅡ Kaveh disse.
Ele seguiu Nilou até o local da reunião e cumprimentou todo mundo, mal notando quem era quem. Kaveh ficou o tempo todo em um estado meio atordoado. Sua mente só despertou depois que ele se despediu de todos e voltou para casa.
Haitham estava na sala, com fones de ouvido postos, e a cara enfiada em um livro, como sempre. Ele sequer olhou na direção de Kaveh quando este entrou.
Kaveh se jogou no sofá de frente para ele, o que pareceu chamar sua atenção.
ㅡ Você voltou cedo. ㅡ Haitham comentou, tirando os fones e olhando para Kaveh. ㅡ Aconteceu alguma coisa?
ㅡ Ah, sim? ㅡ Kaveh respondeu em dúvida. Ele não poderia dizer o que tinha ouvido olhando para a cara de Haitham. Ele sequer sentia a raiva que cresceu nele quando soube o que Haitham tinha feito com todos os seus relacionamentos. Poderia ser que ele tinha feito aquilo... Por ciúme? Haitham poderia realmente gostar dele? Mas por quê? Desde quando?
ㅡ O que aconteceu? Você não parece bem. ㅡ Haitham perguntou de cenho franzido.
ㅡ Eu preciso de uma bebida. ㅡ Kaveh murmurou para si mesmo, esfregando a testa. Ele levantou e foi até seu quarto, atrás da garrafa de destilado que tinha guardado. Depois, ele foi até a cozinha e pegou dois copos.
Quando sentou de frente para Haitham outra vez, tudo que ele fez foi encher os dois copos e empurrar um para seu júnior e beber o outro.
Haitham seguiu seu exemplo sem dizer nada. Ele sentia que havia algo na mente de Kaveh, que ele não sabia como colocar para fora.
Foi só ao notar que eles tinham bebido metade da garrafa sem dar um pio, que Haitham notou que sua cabeça estava muito mais leve que o normal. Ele franziu o cenho.
ㅡ Que bebida é essa?
ㅡ É um destilado que eu ganhei de aniversário de Tighnari. Ela é bem forte.
ㅡ Deu pra notar. ㅡ Haitham disse, virando o último gole que tinha no copo. Kaveh imediatamente repôs, antes que ele tivesse tempo de negar. ㅡ Você quer conversar sobre o que aconteceu e te deixou assim?
ㅡ Haitham. ㅡ Kaveh o encarou. Haitham pausou, seus olhos cerrando levemente.
ㅡ Sim?
ㅡ Você tem alguma coisa pra me dizer?
ㅡ Não.
ㅡ Eu vou embora em três dias.
ㅡ Estou ciente.
ㅡ Então, você não vai me dizer quem é a pessoa que você gosta?
ㅡ O que uma coisa tem a ver com a outra?
ㅡ Apenas perguntando. Então, você vai me dizer?
ㅡ Para que você quer saber?
ㅡ Eu quero saber se é eu. ㅡ Kaveh não conseguiu mais se conter.
Haitham ergueu as sobrancelhas, surpreso.
ㅡ É você. ㅡ Haitham admitiu. Se as coisas chegaram naquele ponto, não adiantava mais negar. ㅡ Como você percebeu? Você não sabia até hoje de manhã.
ㅡ Nilou me contou o que você fez com os caras que eu namorei. ㅡ Kaveh disse em tom acusatório.
ㅡ Ah. ㅡ Haitham sorriu de canto, parecendo orgulhoso. Kaveh sentiu a raiva que estivera abafada ressurgir.
ㅡ "Ah"? É só isso que você tem a dizer? Que tal um pedido de desculpas, para começar? Só porque você gosta de mim, não quer dizer que você pode fazer isso comigo!
ㅡ Eu sei. ㅡ Haitham disse calmo. Pelo menos na superfície. Por dentro, ele sentia todas as suas terminações acenderem. ㅡ Eu sequer fiz muito. Não é minha culpa se nenhum deles tem coragem o suficiente.
ㅡ Coragem?! Você ameaçou jogar alguns deles na prisão? Quem diabos estaria disposto a ir para a prisão por um namorado?!
ㅡ Se fosse por você, eu estaria. ㅡ Haitham respondeu sem pestanejar. Kaveh engasgou com as palavras dele e se ergueu, virando o copo de bebida enquanto bagunçava o cabelo. Ele andou de um lado para outro na sala.
ㅡ Por que diabos você gosta de mim? Não faz sentido.
ㅡ Eu apenas gosto. Qual o problema? Várias pessoas já gostaram de você. Você perguntou o motivo para todas?
ㅡ Haitham, tudo o que a gente faz é brigar. Sempre.
ㅡ Acho que o que dizem sobre ter apenas uma linha fina entre o amor e o ódio é verdade. ㅡ Haitham deu de ombros. Kaveh parou na frente dele e o encarou.
ㅡ Desde quando?
ㅡ Faz tanto tempo. Eu sequer lembro mais exatamente quanto.
ㅡ O que você quer que eu faça com essa informação, Haitham? ㅡ Kaveh perguntou frustrado.
ㅡ Kaveh. Meu querido sênior. ㅡ Haitham alcançou sua mão e segurou-a. ㅡ Eu não ousaria pedir nada de você. O único motivo de você estar ouvindo essas palavras da minha boca foi porque você pediu por elas.
ㅡ Então se eu não perguntasse, você nunca contaria?
ㅡ Nunca.
ㅡ Isso não é estúpido? Por que gostar de mim? É divertido viver um amor não correspondido?
ㅡ Sim. Desde que seja você. Você me fascina, Kaveh. Meu melhor passatempo é observar você.
Kaveh sentiu suas bochechas esquentarem ao ouvir aquilo. Ele largou a mão de Haitham e sentou ao seu lado no sofá, porque era o lugar mais próximo, e cobriu o rosto. Aquela conversa inteira era loucura. Não fazia sentido.
ㅡ Todas aquelas brigas, você fazia de propósito?
ㅡ A maioria delas. ㅡ Haitham admitiu. ㅡ Algumas simplesmente surgiam inesperadamente.
ㅡ Para que? Nunca te ocorreu que isso não te ajudaria em nada?
ㅡ Ah, Kaveh. Se apenas eu pudesse manter minha racionalidade perto de você... ㅡ Haitham usou uma das mãos para arrumar o cabelo bagunçado dele.
ㅡ Você deveria ter negado. Eu não acho que eu queria saber tudo isso. ㅡ Kaveh murmurou. Haitham riu. Surpreso, Kaveh ergueu a cabeça. Haitham estava realmente rindo.
ㅡ Eu não estou te contando isso porque tenho motivos. Eu sei da minha situação muito bem. Você pode apenas digerir e esquecer. Finja que nunca aconteceu.
Kaveh nada disse. Apenas encheu o copo e bebeu mais. Haitham fez o mesmo. Nenhum dos dois disse mais nada.
****
Já era noite quando Kaveh acordou, com uma ressaca tenebrosa que fazia sua cabeça latejar se ele sequer pensasse. Se revirou na cama, se perguntando como tinha chegado ali, e encontrou um copo com água na sua mesa de cabeceira. Aliviado, ele sorveu a água, diminuindo um pouco seus sintomas de morte.
Com dificuldade, ele levantou da cama e abriu a porta do quarto. A casa estava iluminada, o que queria dizer que ainda era cedo e Haitham não tinha ido dormir. Ele caminhou a passos lentos até a cozinha, pausando por um momento quando ouviu a voz de Cyno.
ㅡ Você lembra daquele cara que eu te apresentei da outra vez? Ele continua perguntando de você. O que eu digo? Você quer sair com ele?
ㅡ Não. ㅡ Haitham respondeu. ㅡ Eu tenho dono.
ㅡ Não, você não tem.
ㅡ Sim, eu tenho. Olhe, Kaveh marcou território. ㅡ Haitham disse.
Kaveh arregalou os olhos e praticamente correu até a cozinha.
ㅡ Eu fiz O QUÊ? ㅡ perguntou afobado. Cyno e Haitham olharam para ele e depois se entreolharam.
ㅡ Eu disse. ㅡ Haitham sorriu. ㅡ Conheço ele como a palma da minha mão.
Cyno suspirou.
ㅡ Droga. Eu realmente queria aquele verso de carta.
ㅡ O que está acontecendo? O que foi que eu fiz? ㅡ Kaveh perguntou confuso.
ㅡ Nada. Mas você deveria parar de beber se não confia em si mesmo e não lembra depois. As pessoas podem tirar vantagem de você. ㅡ Haitham disse indo até ele e fazendo-o sentar na mesa. ㅡ E pare de ouvir a conversa dos outros. Você vai acabar ouvindo o que não deve. ㅡ Acrescentou.
ㅡ Cale a boca. ㅡ Kaveh massageou as têmporas, percebendo que tinha sido enganado por aqueles dois.
ㅡ Aqui, coma isso. ㅡ Haitham colocou uma tijela de guisado na sua frente. Kaveh agradeceu e começou a comer.
ㅡ Estou indo. Tighnari está me esperando. ㅡ Cyno disse. ㅡ Haitham, não esqueça de pensar sobre a proposta. Ele realmente parece gostar de você.
ㅡ Passo. Não estou procurando um relacionamento. ㅡ Haitham negou imediatamente.
ㅡ Você vai morrer sozinho. ㅡ Cyno disse.
ㅡ Sem problema.
Desistindo, Cyno se despediu, deixando os dois à sós.
ㅡ Você está bem? Está com dor de cabeça? ㅡ Haitham perguntou.
ㅡ Haitham, da outra vez, você me deu um beijo depois de me colocar na cama? ㅡ Kaveh perguntou ao invés de responder.
ㅡ Oh? Sênior lembra?
Kaveh não sabia como se sentir ao saber que não era um sonho.
ㅡ E dessa vez?
ㅡ Eu estava meio bêbado hoje. Achei melhor não me dar oportunidade.
ㅡ Não confia em si mesmo nem com um beijo na testa, uh? Quem diria que o todo poderoso Alhaitham acabaria assim. ㅡ Kaveh debochou.
ㅡ Você parece muito confortável com o fato que eu gosto de você agora, e tudo que precisou foi de um pouco de bebida. ㅡ Haitham se inclinou para perto de Kaveh, sua respiração roçando levemente na orelha deste. ㅡ Me pergunto o que precisaria para você aceitar as várias outras coisas que eu penso sobre você.
Kaveh deveria saber melhor. É claro que Haitham faria a situação virar a seu favor.
ㅡ Você ainda é irritante. ㅡ Ele murmurou. Haitham se afastou, não deixando sua expressão ser vista por Kaveh.
ㅡ Estou saindo.
Kaveh queria perguntar aonde ele ia aquela hora, mas se conteve. Não era da sua conta.
Haitham andou pela cidade para extravasar aqueles sentimentos que cresciam em seu peito. Tudo estava bem enquanto Kaveh não sabia o que ele sentia, mas e agora? Ele se arrependia de não ter negado? Claro que não. Mas agora que Kaveh sabia, Haitham tinha uma ínfima esperança crescendo no peito. O que, com certeza, não era bom. Kaveh ainda não o suportava. Não era como se ele fosse magicamente esquecer tudo e passar a gostar dele.
ㅡ Alhaitham?
Haitham se virou na direção da voz.
ㅡ Ah, é você. ㅡ Ele tinha um rosto familiar, mas Haitham realmente não conseguia lembrar do seu nome.
ㅡ Faz um tempo. ㅡ O homem disse. ㅡ Eu visitei Fontaine um pouco, mas acabei por voltar pra cá.
ㅡ Você está morando aqui outra vez, então?
ㅡ Sim.
ㅡ Entendo. Que bom.
ㅡ Ei, você está ocupado? Quer tomar uma bebida comigo?
Haitham queria negar, mas ao pensar melhor, talvez fosse uma boa ideia.
ㅡ Tudo bem.
O homem sorriu e fez sinal para Haitham o seguir até a taverna de Lambad.
****
Como Kaveh tinha dormido a tarde inteira, ele demorou a pegar no sono outra vez, mas mesmo quando ele foi dormir, Haitham ainda não tinha voltado.
Claro que ele não estava prestando atenção propositalmente. Foi apenas algo que ele percebeu de passagem, já que estava acordado, de qualquer forma.
Quando levantou na manhã seguinte, perto da hora do almoço, Haitham estava sentado na sala, como sempre, com o cheiro de comida sendo preparada se espalhando pela casa.
ㅡ Bom dia, Kaveh.
ㅡ Bom dia. ㅡ Kaveh murmurou. ㅡ Como é possível que você já esteja de pé se voltou tão tarde para casa?
ㅡ E como você sabe que eu voltei tarde para casa?
ㅡ Eu apenas fui dormir tarde porque dormi a tarde inteira. ㅡ Kaveh disse na defensiva.
ㅡ Você deveria parar de fazer isso.
ㅡ O quê? ㅡ Ele sabia que ia se arrepender de perguntar.
ㅡ Subitamente se importar com o que eu faço. Vai me fazer pensar coisas que eu não deveria.
ㅡ Como o quê? Que eu algum dia gostaria de você? ㅡ Kaveh cruzou os braços, o tom de sarcasmo óbvio.
ㅡ Claro que não. ㅡ Haitham disse calmamente. ㅡ Mas receio que não posso te dar detalhes dos meus pensamentos.
ㅡ Essa é a segunda vez que você diz algo do tipo. Se você não está dizendo, pare com as indiretas.
Haitham sorriu de canto e levantou do sofá sem dizer mais nada. Kaveh ficou sozinho na sala, observando Haitham se movimentar pela cozinha.
Aquele clima de tensão entre eles era desconfortável para Kaveh. Felizmente ele estava indo embora dali em alguns dias.
Seus pensamentos foram interrompidos por uma batida na porta. Curioso sobre quem estaria visitando naquela hora, Kaveh foi abrir a porta.
Cyno assentiu para ele e passou direto para a cozinha.
ㅡ Alhaitham, quem caralhos era aquele cara ontem? Ele desapareceu. Eu o segui por um tempo, mas ele sumiu como o vento.
ㅡ Eu não tenho recordações do nome dele.
ㅡ Por que você estava pegando uma pessoa suspeita que você não sabia nem o nome?
ㅡ Ele disse o nome para mim uma vez, mas eu estava ocupado com outra coisa e não decorei.
ㅡ Você parecia ter decorado outras coisas dele muito bem. Nunca vi uma cena tão nojenta na minha vida.
ㅡ Eu apenas queria algo casual. Quem diria que ele estaria tão interessado na Lorde Menor Kusanali que se aproximaria de mim. É tudo culpa dela por não escolher um Grande Sábio logo. Sinto falta da minha vida simples. ㅡ Haitham suspirou. ㅡ Então, você o perdeu?
ㅡ Sim.
ㅡ Isso não é típico de você.
ㅡ Fui afetado pela sua performance e mal conseguia olhar na cara dele.
ㅡ Bem, boa sorte encontrando ele. Não tenho mais nada a ver com isso.
ㅡ O que? Nenhuma visita íntima quando o prendermos? ㅡ Cyno comentou sarcástico. Kaveh não ouviu Haitham dizer nada, mas Cyno saiu da cozinha e o encarou por um segundo, antes de sair pela porta.
Kaveh sentou no sofá e encarou o nada por alguns minutos. Até dois dias atrás, Haitham ainda era um boneco sem alma e coração. Hoje, ele tinha não apenas descoberto que Haitham tinha um coração, um que gostava dele, por sinal, como ele também tinha uma vida da qual Kaveh não estava ciente e não fazia parte.
Não que Kaveh quisesse participar ou saber da vida sexual de Haitham. Era apenas estranho. Quer dizer, Haitham era bonito, isso nunca teve como negar, mas era inconcebível para Kaveh que houvessem pessoas que conseguissem conviver com ele o suficiente para desenvolver uma atração. Ou talvez fosse esse o ponto: ninguém o conhecia o suficiente.
ㅡ Você sabia que não disfarça muito bem suas emoções?
A voz de Haitham tirou Kaveh dos seus pensamentos.
ㅡ E? Não tenho motivo pra esconder elas. Não é como se eu precisasse fingir não ter sentimentos, como você.
Kaveh cruzou os braços, virando o rosto para não olhar para Haitham.
ㅡ Você faz parecer como se eu não falasse exatamente o que eu penso o tempo todo.
ㅡ Aparentemente, você deixa de dizer apenas as coisas que importam.
Haitham suspirou.
ㅡ O que eu deveria ter dito? Faria diferença se eu dissesse? O fato de que você parece incomodado ao saber que eu gosto de você não prova o meu ponto ao não te dizer?
ㅡ Você está se fazendo de coitado agora?
Haitham fechou os olhos, respirou fundo e bagunçou o cabelo.
ㅡ Kaveh, você sabe ser muito irritante, às vezes. Essa conversa já está ficando velha. Por que você não pede claramente o que quer?
ㅡ Eu não quero nada de você!
ㅡ Mentiroso. ㅡ Haitham sorriu com impaciência e se aproximou de seu sênior. ㅡ O que você quer, exatamente? Me diga. ㅡ Ele se inclinou na direção de Kaveh. ㅡ Quer esmurrar minha cara por te livrar de todos aqueles lixos que você chamou de namorado?
ㅡ Parece uma boa opção! ㅡ Kaveh fechou a mão direita em punho. ㅡ Assim nós ficamos quites.
ㅡ Por que eu te deixaria fazer isso? Não temos uma distribuição de tarefas aqui? Eu sou responsável pelo lixo. Estava apenas cumprindo meu dever.
ㅡ Idiota. ㅡ Kaveh murmurou.
ㅡ Eu posso deixar você me bater, se eu puder ganhar algo em troca.
ㅡ O que? Quer um beijo? ㅡ Kaveh perguntou com sarcasmo. Haitham ergueu as sobrancelhas.
ㅡ Não tinha pensado nisso, mas é uma boa ideia. Você escolhe. Pode ser o beijo que você sugeriu, ou você pode apenas esquecer que um dia eu admiti gostar de você e seguir sua vida como se não soubesse.
ㅡ E como exatamente você espera que eu apague essa informação do meu cérebro, hein?! ㅡ Kaveh bufou.
ㅡ Então você está escolhendo o beijo? Inusitado.
Kaveh empurrou Haitham e levantou do sofá.
ㅡ Estou escolhendo não te bater! Agora me deixe em paz!
ㅡ Uma pena. Estava me perguntando quantos segundos levaria para você ficar sem fôlego considerando que você sempre precisa respirar fundo algumas vezes perto de mim. ㅡ Haitham respondeu bem-humorado.
A porta do quarto de Kaveh batendo com força foi sua única resposta.
****
ㅡ Por que você está aqui de novo?
Haitham suspirou e se virou para Cyno.
ㅡ Estou afogando minhas mágoas, sozinho.
ㅡ Bem, não está mais! ㅡ Cyno deu tapinhas no seu ombro. ㅡ Tighnari está chegando. Vamos todos jogar uma partida de Chamado Sagrado dos Sete!
ㅡ Todos quem?
ㅡ Ora, quem! Nós e Kaveh, é claro. Nós quatro, como sempre.
Haitham bateu o copo na mesa e levantou.
ㅡ Tchau.
Kaveh entrou na taverna bem a tempo de ver Cyno chamando por Haitham, que o ignorou e saiu do local às pressas.
ㅡ Bem, lá vai ele. ㅡ Cyno comentou. ㅡ Ah, Kaveh! Ai está você!
Kaveh sorriu e foi até ele.
ㅡ O que aconteceu? Haitham saiu parecendo que estava sendo perseguido.
ㅡ Não se preocupe com ele. ㅡ Cyno balançou a mão. ㅡ Ele está ranzinza por causa do coração partido.
ㅡ Oh.
O tom de voz de Kaveh fez Cyno o observar por alguns segundos antes de semicerrar os olhos.
ㅡ Você sabe. Como você sabe? Desde quando?
ㅡ Uh?? Você não sabia? O que foi toda aquela cena na cozinha ontem, então?
ㅡ Como diabos eu saberia! Eu escutei você acordando e sabia que você viria na cozinha, então propus uma pequena aposta. Ele... se confessou pra você?
ㅡ Mais ou menos? Eu perguntei se ele gostava de mim e ele admitiu. ㅡ Kaveh respondeu envergonhado.
ㅡ Como você descobriu? Você é mais tapado que uma porta.
ㅡ Ei!! ㅡ Kaveh protestou. Cyno deu de ombros.
ㅡ O que? É verdade. Todo mundo sabe. Por que você acha que sempre que há problema no orçamento do seu Darshan seus seniores mandam você pra resolver?
Kaveh encarou o tampo da mesa surpreso. Fazia sentido.
ㅡ Cyno? ㅡ Kaveh chamou. Cyno o encarou. ㅡ Por que caralhos Haitham gosta de mim?
ㅡ E como é que eu vou saber? Pergunte a ele você mesmo, ué.
Cyno revirou os olhos e Kaveh suspirou.
Tanto faz, pensou. Vou embora em dois dias.
****
Kaveh tropeçou pela casa, sua cabeça muito zonza para que ele soubesse onde estavam os móveis. Cyno o tinha carregado até a porta e dito adeus, deixando-o à sua própria mercê da porta para dentro.
As luzes estavam acesas, o que facilitou um pouco sua locomoção e ele conseguiu ir até o sofá, onde se jogou.
Houve um barulho abafado quando Kaveh se sentiu cair em algo firme que não era o sofá e ele ergueu a cabeça o suficiente para ver que era Haitham embaixo de si.
Surpreso, ele se jogou para fora do sofá, pousando com força no chão.
ㅡ Kaveh? ㅡ A voz de Haitham estava lenta e rouca depois de ter acordado de forma abrupta.
ㅡ Desculpe. Não vi você aí. ㅡ Kaveh murmurou de olhos fechados. Seu corpo estava dormente o suficiente que ele mal sentiu dor.
Haitham sentou, olhando para a figura estendida no chão, e riu baixo.
ㅡ Você está bêbado de novo?
ㅡ Cale a boca.
ㅡ Vem fazer. ㅡ Haitham respondeu, rindo.
Kaveh sentou e olhou para Haitham, que ainda estava deitado no sofá, olhando para ele com um sorriso cínico.
ㅡ Você é irritante. Por que seu humor é tão volátil? Mais cedo você não queria sequer olhar na minha cara e agora você está aí me provocando.
Haitham riu alto, se virando para encarar o teto.
ㅡ Não dói tanto se eu estou bêbado. ㅡ Riu mais um pouco. ㅡ Talvez eu deva começar a me embebedar todo dia.
Kaveh franziu o cenho. Sua cabeça entorpecida demorou um pouco para processar a fala dele, e quando por fim conseguiu, seu cenho franzido se aprofundou.
ㅡ Haitham, se gostar de mim dói tanto, por que você não para?
Haitham riu e olhou para ele.
ㅡ É isso que você quer? Ok, eu paro.
ㅡ Sério? ㅡ Kaveh perguntou surpreso.
ㅡ Claro. Me dê alguns anos. Eu poderia me mudar para Mondstadt, aí eu não te veria mais tão cedo. Certamente funcionaria. Longe dos olhos, longe do coração.
ㅡ Pare de brincar!
Kaveh o encarou, irritado. Haitham piscou, surpreso.
ㅡ O que foi, meu querido sênior? Não está bom o suficiente para você? Talvez se eu for mais longe, então? Ou o problema é o tempo? Apenas me diga, eu farei tudo o que você quiser. ㅡ Haitham disse, estendendo a mão e fazendo carinho no rosto de Kaveh com os dedos. Este encarou seu júnior com descrença.
ㅡ Você realmente faria tudo o que eu quisesse?
ㅡ Claro. Qualquer coisa que eu puder. E se eu não conseguir, eu peço para alguém que consiga.
ㅡ E se eu pedir que você me beije? ㅡ Kaveh lambeu lábios. A respiração de Haitham parou por um segundo e ele recolheu sua mão. Kaveh ergueu uma sobrancelha. ㅡ O quê? Não faria tudo o que eu pedisse?
ㅡ Eu faço, mas você não quer isso.
ㅡ Eu quero. Eu quero descobrir o que possivelmente entre nós dois fez que você se apaixonasse por mim.
O rosto de Haitham ficou sério e ele se sentou.
ㅡ Você não tem ideia do que você está pedindo. Vá dormir.
ㅡ Haitham, eu quero que você me beije.
Kaveh o encarou com olhos firmes. Haitham sentiu sua respiração pesar.
ㅡ Você vai se arrepender disso. ㅡ Ele murmurou.
Kaveh foi empurrado até que estivesse deitado no chão e Haitham estivesse em cima dele. A respiração de Haitham estava batendo em seus lábios, o cheiro de álcool predominante, o que fez o coração de Kaveh bater mais rápido. De repente ele lembrou que Haitham tinha dito não ter se atrevido a dar um beijo nele quando estava bêbado. Antes que ele pudesse dizer algo, os lábios de Haitham estavam sobre os seus. Ele não começou devagar, nem deu tempo para Kaveh se acostumar. Seus lábios foram abertos pela língua dele e Kaveh sentiu seu corpo inteiro explodir enquanto suas línguas se entrelaçavam.
As mãos de Kaveh foram para as costas de Haitham e ele abriu mais os lábios, perdido no beijo mais sujo e devastador que ele já deu em toda a sua vida.
Seu corpo parecia estar passando no meio de uma tempestade de raios, todas as suas terminações nervosas acesas como uma supernova. Ele enrolou as pernas ao redor da cintura de Haitham e o prendeu contra si, seus quadris se movendo contra os dele.
Haitham gemeu e afastou a cabeça dele da sua, quebrando o ósculo.
ㅡ Kaveh, por favor...
ㅡ Pare de pensar. ㅡ Kaveh mandou. Ele apertou mais suas pernas e se moveu contra Haitham, fazendo esse gemer outra vez. Os lábios deles se juntaram outra vez, de forma mais desajeitada dessa vez, porque Kaveh não conseguia parar de mover o quadril contra o dele.
Haitham estava ficando louco. Ele deveria parar. Aquilo era um erro.
Sua mente tentava ser racional, mas então os suaves gemidos de Kaveh o faziam esquecer de tudo. Ele esteve enjaulado por tanto tempo. Agora era tarde demais para voltar ao que era antes.
As mãos de Kaveh passeavam por suas costas, até por fim se alojarem em sua bunda, apertando suas nádegas com força.
Haitham separou suas bocas e atacou o pescoço de Kaveh, que inclinou a cabeça para o lado para lhe dar espaço. A visão de Kaveh estava turva enquanto seu corpo pedia por sentir mais de Haitham. Era um sentimento indescritível de se ter após tantos anos de brigas. Como se toda aquela irritação se transformasse em desejo acumulado. Tantos anos brigando... Kaveh precisava. Ele precisava fazer Haitham arcar com todo aquele desejo.
Haitham mordeu seu pescoço com força e Kaveh tremeu da cabeça aos pés. Seu corpo reagiu antes que sua cabeça terminasse de formar o pensamento e ele se impulsionou, fazendo Haitham ser aquele que estava deitado de costas no chão.
ㅡ Você... ㅡ Ele disse sem fôlego, agarrando o cabelo de Haitham. ㅡ Você vai me pagar.
Haitham sorriu ladino, o que fez Kaveh agarrar o cabelo dele com mais força.
ㅡ Tudo o que o sênior quiser. ㅡ Haitham disse. ㅡ Eu disse que você ia se arrepender.
Ele realmente tinha dito, mas Kaveh não achou que seria daquele jeito. Kaveh se arrependia muito. Ele não deveria ter demorado tanto para descobrir. Ou talvez fosse melhor que ele nunca tivesse descoberto, porque ele sabia que nada seria igual a partir daquele momento.
Kaveh o beijou furiosamente outra vez, ao mesmo tempo em que tirava suas roupas. Haitham ria em meio ao beijo, o que enfurecia Kaveh ainda mais e o fazia trabalhar mais rápido.
Quando por fim se desfizeram de suas roupas, Kaveh estava embriagado pela sensação arrebatadora de suas peles se tocando em todo lugar.
ㅡ Haitham... ㅡ Kaveh murmurou. Haitham sorriu.
ㅡ Tudo o que você quiser, Kaveh.
Kaveh assentiu e moveu seu corpo para baixo, deixando rastros de beijo no abdômen de Haitham, até que sua boca estava ao redor da ereção dele. Haitham fechou os olhos e estremeceu. Ele tinha certeza que não era um sonho, pois havia muitas sensações, mas parecia muito irreal para ser verdade. Como ele poderia estar ali com Kaveh, naquela situação? Com Kaveh sendo gentil com ele? Como poderia não ser um sonho? Depois de tudo...
Kaveh colocou o membro de Haitham na boca, engolindo-o até a base, e voltando, repetidas vezes, enquanto Haitham gemia e se contorcia embaixo dele, sem, contudo, empurrar o quadril contra a boca de Kaveh. Apenas deixando Kaveh fazer com ele o que quisesse.
Kaveh sorriu internamente e tirou a ereção de Haitham da boca. Este olhou para seu sênior com expectativa.
ㅡ Você tem certeza? ㅡ Kaveh perguntou.
ㅡ Eu deveria ser quem está te perguntando isso. É você que precisa ter certeza de que entende o que estamos fazendo, sênior.
ㅡ Eu tenho. ㅡ Kaveh respondeu antes de colocar dois de seus próprios dedos na boca, enquanto a outra mão ele usava para abrir as pernas de Haitham e puxá-lo para mais perto de si.
Haitham engoliu em seco e lambeu os lábios, expectante. Kaveh mantinha-se olhando para seu rosto, apenas para ter certeza, mas Haitham nem uma vez demonstrou medo ou qualquer emoção que indicasse que não concordava com o que estava acontecendo.
Confiante, Kaveh levou os dois dedos lambuzados de saliva até a entrada de Haitham e inseriu um primeiro, devagar. A respiração de Haitham ficou rasa pelo incômodo da invasão, mas ele apenas assentiu com a cabeça para Kaveh, dizendo-lhe que tudo estava bem. O loiro moveu o dedo devagar algumas vezes, até sentir que podia enfiar o outro dedo. Haitham gemeu entredentes. Kaveh achou o som estranhamente adorável, então ele moveu o dedo algumas vezes, ouvindo os sons que saíam da boca de Haitham de forma desenfreada.
ㅡ Kaveh, por favor, eu quero você. ㅡ Haitham implorou, quando por fim não aguentou mais. Os dedos de Kaveh não eram suficientes, ele precisava de mais. Ele precisava de seu Kaveh. Seu sênior. Seu amor.
Kaveh nada disse, pois seu membro implorava por alívio apenas ouvindo Haitham. Ele estava morrendo para saber que sons ele faria quando estivesse dentro dele.
Kaveh tirou os dedos e posicionou seu membro na entrada, olhando uma última vez para Haitham. Apenas para ter certeza mais uma vez. Seu júnior assentiu, então Kaveh entrou lentamente.
Os dois gemeram ao mesmo tempo. Estava tão quente onde eles se uniam. O calor se espalhou pelos dois corpos e Kaveh se viu enclinado sobre Haitham, juntando suas bocas novamente, tentando não se mexer muito enquanto ele se acostumava. Haitham abraçou seu pescoço e retribuiu o beijo com um fervor renovado, como se não aguentasse mais ficar longe dele.
ㅡ Você disse que me faria pagar, sênior. ㅡ Haitham murmurou em meio ao beijo. ㅡ Por favor, cumpra sua promessa.
Kaveh agarrou o queixo dele, aprofundando o beijo, e começou a se mexer.
Haitham gemia em meio ao beijo a cada estocada que Kaveh dava dentro de si. Ele não conseguia respirar direito. Sua visão estava embaçada de prazer. Era o momento mais feliz da sua vida. Mesmo que tudo desse errado depois, aquele momento teria valido a pena.
Kaveh o beijou até que a velocidade das estocadas não o permitiu mais. Haitham se agarrou a ele, enrolando suas pernas ao redor de sua cintura, pedindo-o para ir mais fundo, mais rápido. Tudo que Kaveh podia fazer era obedecer. O sons dos gemidos se misturaram com o som da pele se chocando, criando uma atmosfera de prazer carnal tão intensa que deixava ambos loucos.
Haitham gozou como nunca antes em sua vida, um prazer tão intenso que ele sequer conseguia abrir os olhos. Quando Kaveh viu aquela expressão no rosto dele, sabendo que havia sido ele que havia causado aquela cara de paisagem a demonstrar tanto, ele não conseguiu se conter e gozou também, capturando os lábios de Haitham em um último beijo antes de cair por cima dele, exausto.
Suas respirações desniveladas se misturaram até se acalmarem. Haitham abraçou Kaveh, deitando-o ao seu lado e enfiou o rosto em seu pescoço, aproveitando aquele momento de paz.
Ele nunca achou que poderia desfrutar de um momento assim. Era como se todos os anos em que tinha gostado de Kaveh fossem apenas um prelúdio para o quanto estava sentindo agora. Seu peito estava tão cheio de amor que ele sentia que poderia explodir a qualquer momento.
ㅡ Haitham...
ㅡ Hum?
ㅡ Você está bem?
Haitham riu baixo.
ㅡ Claro que sim, Kaveh.
ㅡ Você ainda está bêbado?
ㅡ Não posso estar apenas feliz?
Kaveh olhou para ele.
ㅡ Feliz? Apenas pelo sexo? É suficiente pra você?
ㅡ Eu serei feliz com qualquer coisa que você me der. ㅡ Haitham disse, depositando um beijo na testa do seu sênior. ㅡ Não importa o que ou o quanto você decida me dar.
ㅡ Mesmo se eu disser que nunca mais vai acontecer?
ㅡ Não posso ser egoísta. ㅡ Haitham suspirou.
ㅡ Mas eu posso? Como diabos funciona a lógica do seu cérebro? ㅡ Kaveh perguntou incrédulo.
ㅡ Que lógica? Eu já não disse que não consigo ser racional com você?
Kaveh sorriu de canto e se aconchegou nos braços de Haitham. Eles eram quentes e acolhedores, assim como a casa deles quando Haitham estava presente. Kaveh pensou na casa fria que o recebeu por um tempo, a qual ele odiou. Se fosse embora, não seria recebido assim o tempo todo?
ㅡ Haitham, você quer realmente que eu vá embora daqui? ㅡ Kaveh perguntou.
ㅡ Eu nunca quis que você fosse embora. Mas você disse que não me suportava, então o que eu poderia fazer? Eu não podia te acorrentar ao meu lado e te deixar infeliz. ㅡ A voz de Haitham era suave, assim como a mão que deslizava gentilmente pelos seus cabelos. Kaveh sentiu um nó se formar em sua garganta ao notar traços de tristeza nas palavras do seu júnior. Por que ele não tinha percebido antes? Ele era cego e surdo, por acaso?
ㅡ Eu... Não quero ir. ㅡ Kaveh admitiu.
ㅡ Então fique. Mas fique nos seus próprios termos. Eu não vou te prender e nem te forçar a gostar de mim.
ㅡ Okay. Mas eu gostaria de tentar gostar de você. Afinal, se eu continuar namorando outros caras, você vai apenas espantar todos eles. ㅡ Kaveh comentou de brincadeira. Haitham riu alto.
ㅡ Eu apenas faço uma seleção pra você.
ㅡ É? Com quais critérios? ㅡ Kaveh debochou.
ㅡ Nada muito difícil. Eles apenas precisam ter a mesma perseverança que eu. É o mínimo que você merece.
ㅡ Isso é impossível. Ninguém seria tão tapado.
ㅡ E no entanto, aqui estou eu.
ㅡ Sim, você está. ㅡ Kaveh sorriu e se aproximou, dando um beijo lento nele.
Haitham sorriu de volta e eles se embolaram no chão por mais um tempo, trocando beijos e carícias.
****
Kaveh acordou em sua cama no outro dia. Desnorteado, ele olhou para os lados, procurando Haitham. Quando não o encontrou, Kaveh sentou na cama, se perguntando se tudo tinha sido um sonho. Se tivesse sido realmente um sonho, Kaveh não tinha certeza de como se sentir.
Ele saiu da cama, notando que estava vestido apenas da cintura para baixo, e respirou fundo. Não tinha como ter sido apenas um sonho. Não mesmo. Como ele poderia sonhar com algo assim?
Kaveh saiu do quarto apressado, seus passos parando apenas quando viu Haitham sentado na mesa da cozinha tomando café da manhã como todos os dias.
ㅡ Haitham.
Seu júnior olhou para ele sem qualquer expressão no rosto.
ㅡ Bom dia, Kaveh.
Kaveh sentiu sua espinha gelar. Certamente... não tinha sido um sonho. De jeito nenhum.
ㅡ Haitham...
ㅡ Hum?
ㅡ Sobre ontem...
ㅡ O que tem?
Kaveh não sabia o que dizer. O que estava acontecendo? Haitham estava fingindo que nada tinha acontecido?
ㅡ Você está me zoando? ㅡ Kaveh perguntou, se irritando. Haitham pausou e o encarou, abrindo um sorriso de canto. ㅡ Se fode!
Haitham riu.
ㅡ Desculpe, é hábito. Você é lindo quando está irritado. ㅡ Haitham estendeu a mão e o puxou pelo braço até que ele estivesse perto o suficiente para abraçar sua cintura. ㅡ Sênior dormiu bem? Precisa de remédio para dor de cabeça? Quer que eu faça algo específico para você comer?
Kaveh ficou embasbacado com a enxurrada de perguntas. Então realmente não era um sonho.
ㅡ Estou bem. Como você está?
ㅡ Eu? Maravilhoso. De fato, nunca me senti tão bem em toda a minha vida.
Kaveh riu baixo e acariciou os cabelos de Haitham. Aquele júnior era muito diferente do que estava acostumado, mas ele tinha certeza que seria muito fácil acostumar se continuasse assim.
ㅡ Como é que de uma noite de bebedeira nós acabamos assim? ㅡ Ele perguntou. Haitham ergueu uma sobrancelha. ㅡ Tudo bem, eu acabei assim? ㅡ ele se corrigiu.
ㅡ Com certeza não foi planejado. ㅡ Haitham murmurou. ㅡ Acho que tenho que agradecer a Nilou por isso.
Kaveh revirou os olhos e se soltou, sentando à mesa para tomar café.
ㅡ Você não deveria agradecer ao Cyno, ao invés? ㅡ Ele perguntou. Haitham franziu o cenho em confusão. ㅡ Afinal, foi ele que continuou me incentivando ontem a pelo menos te dar uma chance, já que "eu sabia de tudo agora".
ㅡ E você achou que era uma boa ideia enquanto estava bêbado, então se jogou para cima de mim? ㅡ Haitham parecia entretido pela possibilidade.
ㅡ Eu estava planejando pensar um pouco sobre isso, mas as coisas acabaram assim de algum jeito. ㅡ Kaveh suspirou.
ㅡ Você ainda tem tempo para pensar. ㅡ Haitham disse sério.
ㅡ Eu sei, mas as coisas já chegaram tão longe. E eu gostei muito do que aconteceu.
ㅡ Se eu soubesse que seria assim tão fácil fazer você me considerar... ㅡ Haitham suspirou. Kaveh revirou os olhos.
ㅡ Você ainda é um idiota, porém.
ㅡ Certas coisas estão além do meu controle. ㅡ ele deu de ombros. ㅡ Por favor, pense em mim com carinho, sênior. ㅡ Haitham pediu com um sorriso tímido.
****
Kaveh estava terminando de embalar suas coisas quando Haitham bateu na porta aberta do seu quarto, nu da cintura para cima, e entrou, carregando um travesseiro e uma expressão que Kaveh nunca achou que veria em seu rosto: implorante.
ㅡ O que foi? Você quer dormir aqui comigo? ㅡ Kaveh perguntou. Haitham assentiu.
ㅡ Aparentemente eu não consigo dormir direito sem você nos meus braços depois de ter a sensação comigo uma única vez. Você é viciante, Kaveh.
Kaveh escondeu o rubor se formando em suas bochechas ao se abaixar para colocar mais uma peça de equipamento na mala.
Haitham continuava sendo muito direto, o que era um problema, pois agora esse tipo de coisa saia da boca dele sem aviso e ele não parecia nem um pouco envergonhado ao dizer.
ㅡ Mesmo que você durma aqui, nem sequer pense que vamos fazer algo. Eu saio amanhã cedo.
ㅡ Eu sei. ㅡ Haitham disse feliz, deitando-se na cama. Esta, que era de solteiro, mal tinha algum espaço sobrando após ele deitar. Kaveh se perguntou como exatamente eles dormiriam naquele espaço pequeno.
Ele não disse nada, porém, e terminou de arrumar suas coisas sob o olhar atento de Haitham. Quando estava pronto, fechou a porta do quarto e caminhou em direção aos braços estendidos do seu júnior, que se agarraram em sua cintura e o puxaram para deitar por cima de si.
Kaveh sentiu seu coração derreter um pouco com aquilo. Haitham era tão carinhoso com ele, como ele conseguiria resistir? Ele beijou Haitham nos lábios, se cercando com o cheiro dele, e se aconchegando em seus braços confortáveis. Ele sequer lembrava que a cama era pequena demais para os dois, pois eles se encaixavam como ninguém.
ㅡ Quanto tempo você vai passar longe? ㅡ Haitham perguntou. Kaveh deitou a cabeça no seu peito e suspirou.
ㅡ Provavelmente uns dois meses, pelo menos. Nós vamos ter que fazer um estudo no local antes de começar o planejamento.
ㅡ É muito tempo. ㅡ Haitham reclamou. Kaveh riu baixo.
ㅡ Você nunca reclamou antes, e eu já passei seis meses longe.
ㅡ Era diferente. Eu não podia reclamar.
ㅡ Hum, isso é verdade. ㅡ Kaveh disse pensativo. ㅡ Acho que você vai ter que aguentar, então!
ㅡ O que você vai fazer se eu morrer de saudade?
ㅡ Você não vai. Apenas foque no seu trabalho, como você fez das outras vezes.
ㅡ Focar no meu trabalho, claro. ㅡ Haitham escarneceu. ㅡ Por que você não pergunta a Panah quão bem eu fiz meu trabalho da última vez?
Kaveh o encarou sem palavras. Como podia essa pessoa ser mesmo o Haitham que ele conheceu por tantos anos? Ele realmente conhecia Haitham?
ㅡ Não dê trabalho para os outros!
ㅡ Se você me prometer que vai voltar para casa e para os meus braços o mais rápido possível, eu posso te prometer isso.
ㅡ Por que você está agindo como um mimado? ㅡ Kaveh estava realmente embasbacado com aquela atitude.
ㅡ Você me fez ficar assim. ㅡ Haitham disse, puxando Kaveh para si, para beijá-lo até que ele perdesse o fôlego. Quando Kaveh foi libertado do beijo, ele teve que se acalmar por alguns minutos. Não era apenas sua respiração que estava descompassada. Seu coração também parecia ter corrido uma maratona.
ㅡ Você... sinceramente! ㅡ Kaveh o estapeou e escondeu o rosto em seu pescoço. Haitham riu, sentindo o coração de Kaveh bater forte contra seu peito.
Ele estava realmente muito feliz naquele momento. Ainda que Kaveh não admitisse, Haitham sabia que o estava enredando em si. Ele apenas conhecia-o demais.
A Luz de Kshahrewar era também a luz da sua vida. E ele faria com que continuasse sendo assim pelo resto de seus tempos, agora que a oportunidade tinha aparecido.
****
Havia um boato circulando por toda Sumeru nos últimos meses.
Aparentemente o Escriba da Academia, que estava servindo como Grão-Sábio Interino, estava namorando alguém.
Ele foi visto várias vezes comprando flores e outros presentes para o suposto namorado, mas ninguém sabia quem poderia ser, vez que ele mantinha sua vida extremamente privada. Ele não parecia ser próximo de ninguém exceto o General Mahamatra e o Guarda Florestal, Cyno e Tighnari, mas todos sabiam que esses dois eram um casal. A outra única pessoa que era vista ao redor do Escriba era o famoso arquiteto, dono do projeto do ambicioso Palácio de Alcazarzaray, mas estes dois viviam brigando, como poderiam namorar!
Ninguém além dos amigos próximos do Escriba pareciam saber, mas Panah sabia. Afinal, ele era a única pessoa que estava na sala do Grão-Sábio na maior parte do tempo.
Toda vez que Kaveh aparecia na sala, havia uma comoção. Eles brigavam sobre como relatórios deveriam ser entregues e valores de orçamento e então, quando pareciam que iam sacar as armas e lutar, a voz do Escriba suavizava e perguntava ao arquiteto o que ele queria para o jantar. Quando o cardápio estava decidido, Kaveh era obrigado a voltar com o relatório para refazer, mas deixava a sala após um beijo de Haitham, seguido de um "eu te amo" dito aos sussurros para que Panah não ouvisse.
Mas não muito baixo, para garantir que Panah ouvisse.
Assim era a vida privada do Grão-Sábio Interino, que era tão discreto que precisava esfregar seu amor na cara dos outros todos os dias.
Era realmente uma vida muito feliz.
________________________________
NOTAS DA AUTORA: sai minha zona de conforto escrevendo isso, mas eu amei cada segundo! Simplesmente sou apaixonada em kavetham (infelizmente genshin player) e como boa fanfiqueira não podia deixar de tentar escrever pelo menos uma história deles kkkk
Espero que tenham gostado 🥺❤️
E se algum de vocês chegou aqui pq me seguem e acabaram lendo mesmo sem conhecer o ship, por favor não se envolva nesse mundo! É um caminho sem volta!
VOCÊ ESTÁ LENDO
Everything you want [kavetham]
RomanceKaveh e Haitham se odiavam. Esse era o consenso entre os dois e todos de Sumeru que os conheciam. Isso era o que Kaveh achava, pelo menos. A realidade era que Haitham era apaixonado por ele desde o tempo em que eram estudantes da Academia, e aparent...