Canto I

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Esse texto foi escrito todo durante a pandemia (2020/2021). Não tem uma narrativa, é uma prosa-poética. Dionísio é Jungkook.

Dedico essa publicação à Erin.

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Começar confessando.

Confessar que minha alma foi comprada. Que minha alma nunca foi minha. E que as noites me comem pelas beiradas desde que selei o contrato. Ter emprestado à lua o próprio sangue é deixar-se morrer toda noite, anêmica, desprovida de cor e veias. Deixar-se abrir e aguar. Como as águas d'Ele me dividindo ao meio. Tão cedo para falar d'Ele, o comprador da minha alma. Uma criança preocupada com os jogos e os colegas, alheia ao mundo dos adultos. Ele é quem é por ser alheio. Por estar de fora. Como um deus que ouve uma prece. Como a ilusão de que todas as preces serão ouvidas e o amargor dos dias não vai passar de um retrogosto.

Queria dedicar a Ele que me comprou as palavras, que me despiu da realidade, que come o meu fígado todo dia mas me mantém viva. Queria dedicar a Ele, Dionísio, a morte que eu vivo todo dia. E as palavras de luta e de ordem que me mastigam a poesia. Ele, Fundador da Minha Solidão, que Ele me ofereça as mãos já que nunca pude usar as minhas.

Eu o odeio, Dionísio. Por ser a minha metade fundida ao nada. Muda. Por ter me presenteado com a graça de uma quase voz instável e tremida.

Por ter arrancado a minha beleza. E meus olhos. E minha partida. Por ter feito de mim um bastidor de feridas.

Ditirambos de Dentro do LabirintoOnde histórias criam vida. Descubra agora