Tenho desenhado nos cantos da página, nem que seja cobrindo as linhas pré-existentes. Porque não posso ser a mulher que desenha na sua pele. E que, ao mesmo tempo, lhe causa dor e lhe fere. Eu só queria feri-lo. Machucá-lo sem sangue, ver seu rosto lutando contra demonstrações de fraqueza, aguardar pacientemente sua casca se quebrar.
Quero fazê-lo chorar. Aí eu lembro que já fiz. Que as lágrimas enfeitaram seu rosto sagrado uma vez por mim. Duas vezes por mim. Todas as vezes por mim.
Que talvez ela, que desenha na sua pele, jamais tenha de fato lhe causado dor.
Que talvez ela o tenha feito gozar, mas sem sofrer (qual é a graça?) e enfeitado de lírios a sua pele.
É irônico porque eu sempre me imaginei perfurando flores na sua pele. ("Por favor me ame"). Eu te amo já. Não precisa pedir (mas peça).
Acreditei por um período que tinha deixado de amá-lo, Dionísio, mas seria impossível porque você inventou o amor. O amor é um garoto bobo e perdido, que sente o cheiro do inverno, que tem medo de microondas, que se veste todo de preto mas carrega uma flor bordada na pele e galáxias no lugar dos olhos. O amor é um deus que finge não ser divino para melhor enganar a humanidade.
E nasce no meio dos homens sendo inteiramente deus. O amor é estar próximo quando poderia estar distante. É romper a multidão e ignorar a segurança e o protocolo, o amor é não ter medo de ser estraçalhado de amor, é estender a mão e agradecer mesmo sabendo que um deus não precisa de gratidão.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ditirambos de Dentro do Labirinto
PoetryLouvores pandêmicos ao deus epidêmico. Dionísio: o deus do êxtase, que venceu a morte e a loucura, nascido duas vezes, Aquele Que Não Pode Ser Evitado. O labirinto: o isolamento pandêmico e seus desejos irrealizáveis (e por isso mesmo eternos). Aria...