QUERIDO DIÁRIO

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CAPÍTULO 1 - QUERIDO DIÁRIO 


Dia 1, São Paulo, Brasil

Olá, meu nome é Artur e o ano é…. Não sei… todo mundo parou de contar depois do centésimo dia, afinal, temos coisas mais importantes para se preocupar, e bom, acho que não tem jeito mais didático de dizer isso, o mundo acabou, não literalmente, ainda tem gente viva e alguns animais, e baratas, muitas baratas.

O fim do mundo não foi como gostaríamos, não tem zumbis, nem mutações, mas ninguém ficou surpreso, foi exatamente como imaginávamos, os homens mais poderosos do mundo apertaram a merda de um botão e todo mundo se fodeu, exceto eles, eles devem estar em um abrigo subterrâneo com mantimentos o suficiente pra umas quatro gerações de sua prole de parasitas endinheirados, não que dinheiro esteja valendo muito hoje em dia, mas pelo menos garantiu a sobrevivência deles. Sabe o que vale muito hoje em dia? Água, óbvio, mas o menos óbvio é creme hidratante, nossa cara, eu faria qualquer coisa por um Monange agora, Brasil já era um inferno de quente, imagina agora que os caras abriram um bucetão no céu, tá difícil, mas pelo menos descobri que dá pra hidratar a pele com o soro do leite, o difícil é conseguir leite.

A transmissão de rádio funciona bem, e tem muita gente que usa para ajudar os outros, mas a maioria usa para lembrar músicas "antigas" ou para áudio porno, o que é tão previsível que chega a ser engraçado, o ser humano só sabe fazer isso em qualquer oportunidade.

A realidade é que o fim dos tempos foi uma grande mistura dos filmes que assistimos com algumas surpresas, muitos lugares se tornaram lugares desertos com aquela paleta de cores do México em filme de Hollywood, boa parte do Brasil virou um verdadeiro matagal, isso ajuda bastante nos dias quentes, que é basicamente todo dia, mas tem lugares que realmente ficou feia a coisa, nordeste virou deserto, sudeste virou nordeste e sul virou sudeste, agora quero ver gaúcho falando que dez graus é calor debaixo de um sol de quarenta graus.

A gente tá se virando bem, já construímos comunidades bem grandes, até porque a destruição aqui não foi pelas bombas em si, mas sim o caos que se instaurou e a guerra civil, essa guerra foi coisa de louco, não tinha exatamente dois lados guerreando um contra o outro, era meio que um cada um por si, pensando agora depois do ocorrido foi engraçado até, mas na época não foi não, foi bem feio na verdade, pensando bem nem foi tão engraçado.

Todo dia eu me pergunto o por que de insistir em sobreviver num lugar desses, muito gente se fez a mesma pergunta e toma a decisão mais óbvia e encerra sua carreira de sobrevivente nesse filme escrito por um maníaco e dirigido pelo  Tarantino, aliás, ele morreu nos primeiros dias, enfim, voltando ao assunto mórbido, eu ainda não me matei porque acho que viver isso aqui é tipo observar aqueles formigueiros de acrílico. O ser humano é bizarro, mas fascinante.

Mas é isso, estou escrevendo esse diário como se fosse para outras pessoas porque sou meio lunático, é claro que isso não é um conto escrito por um desocupado entediado, não é? Mas por hoje é só, aguardo vocês nas observações que farei em breve sobre como anda o fim do mundo, isso se eu não morrer para uma gangue de canibais nessa noite. Até a próxima.

Dia 2, São Paulo, Brasil

Olá, voltei, isso indica que não houve ataque de canibais, nem saqueadores, nem baratas mutantes, eu acredito que em algum momento isso vai acontecer, ela serão as próximas soberanas do planeta Terra sem sombra de dúvidas, antes eu achava que seriam os robôs, mas não rolou infelizmente, a gente até estava avançado no desenvolvimento de inteligências artificiais mas não deu tempo de rolar um hasta la vista, mas enfim, neste exato momento vocês já sabem do cenário atual do nosso amado planetinha e devem estar se perguntando o que eu pretendo fazer não é? Pois bem, meus planos são pouco definidos, mas pretendo seguir a brisa do vento até o sul, é um ambiente mais fértil e estão desenvolvendo melhor as cidades, finalmente eles conseguiram a independência que queriam, quer dizer, não foi bem do jeito que eles queriam, mas pra quem não tem nada metade é a dobro não é? Até o momento meu objetivo é chegar vivo na antiga fronteira com o Paraná e ver como anda a situação por lá, de repente posso até fazer uma viagem internacional e conhecer a Argentina, mas pra isso preciso de um meio de transporte, carro é inviável, não tenho CNH, já pensou se tem uma blitz na estrada? Não posso arriscar, então vou tentar achar uma bicicleta, ou pegar alguma na feira do rolo, é isso mesmo, voltamos para a era do escambo.

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