Lápsos

Arte em dor

Eu passo rapidamente e espero a linha branca se avermelhar aos poucos.

Naquele momento, eu até consigo sorrir.

O primeiro risco foi feito, agora só deus sabe quando vai ser o último.

Arde por poucos segundos e eu espero, encarando a linha branca que brilha.

Penso em formas.

Eu devia fazer de um jeito que pareça que foi acidente? Que pareça que foi minha gata?

Decido que não, vou ser criativa.

Cantarolo uma música que pus no celular enquanto aperto a minha pele pra adiantar o processo da tinta.

Eu preciso ver o que estou fazendo pra construir minha obra de arte.

O choro que antes tomava minha respiração, se dissipa em lágrimas secas e grudentas em meus olhos enquanto eu me concentro no meu dever macabro.

Eu quase estou aliviada da enorme pressão que minha cabeça sentia anteriormente.

Tudo se vai em riscos.

Um deles fundo demais, eu me preocupo.

Fico atenta a barulhos que possam me atrapalhar, pronta para esconder tudo caso alguém abra a porta, mas ninguém vem.

Meu inconsciente deseja que alguém venha.

Mas é sempre melhor lidar com isso sozinha. 

Se alguém viesse, não falaria e nem faria nada que pudesse ajudar de qualquer forma.

O trabalho é calmo.

Sem choro, sem desespero. 

É como um artista desenhando no seu caderno de desenho.

E foi o tempo de uma música ou duas.

Na metade de "Positions" eu me dou por satisfeita.

Quase satisfeita.

Essa linha aqui não ficou tão reta, eu deveria tentar consertar? 

Quando cicatrizar vai dar pra ver?

Desisto.

Guardo meu pincel bem escondido pra que ninguém o tire de mim.

Observo a pintura feita em dor e tinta temporária.

Os questionamentos vem.

Eu devia tentar esconder?

O que eu faço se descobrirem?

Falo a verdade? 

Me abstenho de comentar?

Eu me sinto tão relaxada agora.

A minha cabeça silenciou completamente.

Eu devia fazer isso toda vez que me sentir mal.

É aí que mora o perigo.

Era pra ser só uma última vez.

Algum dia vai ser a última vez.