Capítulo 2

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Isso era o que Malvina pensava. Menos de um mês depois da partida de Fabio chegou uma carta. Trazia uma foto do menino e mais dinheiro ainda. A mulher ficou radiante.
- Eles devem estar mesmo muito encantados com Fabinho para mandarem essa dinheirama toda - disse ela arregalando os olhos.

Simara sempre desconfiada, examinava a fotografia.
- Mãe, olha só...
Mas a mulher arrancou a foto de sua mão.
- Olha só digo eu, Simara! Sempre foi lindinho, o seu irmão. Mas com essas roupas... Benza Deus! Parece um príncipe.

Na foto, o menino estava de pé, em meio a um imenso jardim sem flores, mas com o gramado muito bem cuidado, ao fundo do qual se via um casarão com a fachada ornamentada. Vestia sapatos pretos de verniz, meias brancas, terninho azul-marinho combinando com a bermuda, camisa branca de colarinho e gravata cetim cinza-claro. O cabelo estava penteado para trás, cheio de goma.

Simara não se convencia. Todos os outros irmãos enviavam fotos em que apareciam cercados de brinquedos, em parques, comendo doces, rindo, abraçados com a nova família. Fabio não. Estava sozinho, de pé, com os braços estendidos ao longo do corpo, no meio daquele jardim imenso. Parecia triste.

Simara insistiu no assunto, mas Malvina proibiu a filha de prosseguir.
- Gente chique é assim. Não fica pulando e gritando. Ele está é ficando educado - encerrou a conversa.

No mês seguinte, a mesma coisa. Mais um envelope entregue pelo correio. Dentro, nem um bilhete. Só mais dinheiro e outra foto.

Agora Fabio aparecia de pé em um quarto amplo e ricamente mobiliado. Estava diante de uma cama alta, de dossel talhado em madeira escura, e ao lado de uma escrivaninha cuidadosamente arrumada. Não havia brinquedos à vista. A roupa não era a mesma da foto anterior, mas muito parecida. E a expressão do menino também, embora parecesse ainda mais pálido e tristonho.
- Ele não está feliz - constatou Simara em voz alta, sabendo que a mãe não a ouviria. Estava ocupada demais fazendo planos para o dinheiro que chegara. Já dava até para pensar em comprar um fogão de verdade, com bujão de gás e tudo. E teria comida para fazer todos os dias.

Na verdade, teve muito mais do que isso. Todo mês chegava novo envelope com uma foto e mais dinheiro. Cega pela boa sorte repentina, mal olhava para o filho impresso no papel. Ia direto para o maço de notas, contava-as avidamente, sorria e fazia planos.

Apenas Simara estava cada vez mais intrigada. A cada foto que chegava, parecia-lhe mais evidente que havia algo muito estranho ocorrendo ao irmão. Sempre o mesmo tipo de roupa, os ambientes luxuosos - mas antiquados e soturnos -, e a expressão ausente,o olhar mortiço, a postura imóvel.

A última foto era ainda mais impressionante. Solitário, sentado à cabeceira de uma mesa imensa, de madeira escura e polida, Fabio não olhava para a baixela de prata à sua frente, nem para a louça filetada de ouro, nem para os talheres de cabo de madrepérola. Seu olhar tampouco se dirigia para o fotógrafo. Parecia fixar-se num ponto impossível, distante, muito além da realidade.

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