Capítulo 2

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No dia seguinte, eles souberam tudo sobre o garoto. Chamava-se Nando, tinha dez anos, estava mesmo na terceira série, morava mesmo na rua de Maria.


E tinha sido encontrado morto pela manhã, em sua cama. Aparentemente, morrera engasgado durante a noite. O médico, chamado às pressas para tentar salvá-lo, encontrou um pequeno pedaço de osso preso em sua garganta.


Não é preciso dizer o quanto Adriano ficou assustado com a notícia. Mal tinha conseguido dormir depois de ter visto o cortejo macabro. Aquela notícia, logo pela manhã, só confirmava suas suspeitas: fosse o que fosse que tivesse visto na noite anterior, era maligno. E ele precisava descobrir sua origem.


Nem Carlos, nem Tomé, nem Maria concordavam com ele. Na opinião dos três, melhor seria esquecer a estranha visão.

- Não é bom se meter com essas coisas - insistiu Carlos. - Isso tem cara de magia negra.

- Também acho - apoiou Maria. - Minha avó sempre me avisou para ficar bem longe de bruxarias.

A menção à avó despertou a atenção de Adriano.

- Ela costuma conversar essas coisas com você? - perguntou ele.

- Minha avó vem de um lugar onde todo mundo acredita em assombração, bruxaria, essas coisas - explicou Maria. - Ela é cheia de superstições.

- Mas ela entende disso? - insistiu Adriano.

- Entende um bocado - afirmou a menina. - Mas não me conta quase nada. Sempre que pergunto, ela diz que, quando chegar à idade certa, vou saber tudo o que preciso.

- O que precisa saber pra quê? - perguntou Tomé.

- Não sei, ela não diz.


Adriano ainda queria saber muitas coisas da amiga, principalmente se ela havia comentado alguma coisa com a avó a respeito da procissão da noite anterior. Mas, subitamente, a mãe de Maria apareceu e mandou a menina de volta para casa. Parecia zangada, como se não lhe agradasse ver a filha em companhia dos amigos. E Maria obedeceu muito rapidamente, meio assustada, como se soubesse muito bem que não deveria estar ali.


Adriano ficou cismado. Não gostou do jeito como a mãe de Maria o tinha encarado. Era um olhar ruim. Foi para casa e tentou botar as ideias em ordem.


Não havia nenhuma dúvida: a avó, a mãe e Maria estavam na procissão. Mas a menina também estava ao lado dele. Então, aquela era um cortejo de almas, de almas de pessoas vivas, que continuavam a cuidar de seus afazeres enquanto uma parte delas voava para longe. Mas para quê? Que sentido teria aquilo?


Depois de muito matutar, tomou uma decisão arriscada. Dirigiu-se à casa de Maria. Não sabia muito bem o que pretendia investigar, mas se havia uma resposta, só poderia ser encontrada na casa das três mulheres.


Maria morava com a mãe, a avó e um cachorro numa casa meio afastada, rodeada por uma cerca de tabique que ocultava o movimento interno de quem passasse pela rua. Não que precisasse. Quase ninguém andava por ali.


Adriano nunca tinha passado do portão, que cedeu a um leve toque de sua mão, e surpreendeu-se com a pobreza e o desleixo do lugar. O pequeno pátio da frente estava tomado pelo mato alto e poças de lama. A pintura da parede estava descascada em muitos pontos e muito suja em toda a sua extensão. Na parte lateral da casa, roupas velhas e encardidas balançavam-se num varal. Embora o sol estivesse a pino, o lugar dava arrepios.

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