Volta às aulas

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Na escola era um mal aluno, sim, mal com "l", já que eu não era "bem" um aluno. Eu nunca fui formalmente matriculado na escola, já que minha avó tinha usado minha certidão de nascimento como rascunho. Ela aproveitou o papel para anotar uma receita que ela tinha visto de manhã de uma moça que era amiga de um papagaio na televisão.

Acontece que minha avó valorizava mais como fazer um bolinho de chuva do que manter meus documentos. E, sem uma certidão, você não existe para o sistema de ensino, você pode até berrar na cara deles, mas eles não se contentam em uma prova oral.

Gosto de me gabar que fiz várias amizades na creche. É verdade que eu já tinha idade para estar na quinta série, mas gostava de ser um exemplo para as novas gerações. O doido foi saber que quem me ensinaria mais coisas seriam eles, os pequenos. Por exemplo, sabia que a meleca do nariz pode fazer o percurso de volta para a narina se você se esforçar? É, foi uma lição de nunca desistir.

As tias da cozinha eram realmente as minhas musas. Elas estavam bem aonde eu queria estar: no meio da merenda. A melhor parte da escola, com certeza, era essa, mas quando a nutricionista adotou a pirâmide alimentar, eu me dei mal, pois você tinha que convencer o seu amiguinho a convencer o próximo amiguinho a querer comer na escola.

O ingresso para as séries seguintes foi automático, já que não tinham motivos para me deter, não tinha cometido nenhum crime ainda. Porém, para meu desgosto o jeito das coisas mudaram e não era igual antes que você só precisava comer e empurrar os outros na fila igual a apocalipse zumbi. Agora você tinha que ficar só sentado em uma cadeira sendo repreendido o tempo todo.

Você nem precisava fazer coisa errada, pois a falta de iniciativa também era vista com maus olhos pelos educadores. Tinha matérias que eu me dava bem, como educação física e recreio, mas tinha outras que eu era péssimo como cálculo, principalmente depois que a matemática fez um crossover com português e começou a aparecer letra onde não devia.

Eu era da turma do fundão, tanto no fundo da sala, quanto do ônibus, quanto do poço. Era o terror das inspetoras e da diretora. Todas elas sempre muito bem preparadas para lidar com crianças, já que elas agiam como uma delas.

Me pegaram mesmo quando ficavam repetindo que eu tinha que acertar as notas, mas quando comecei a socar o violão do professor de música, eles me expulsaram.

Cornélio: uma micro biografiaOnde histórias criam vida. Descubra agora