Quando você ingere muito álcool e passa boas horas migrando de festa em festa, no dia seguinte, as sete horas da manhã, você se encontra deitado em uma cama de hospital, com um soro interligado em seu braço tomando boas gotas de glicose.
Abner começava a sentir o cansaço se aposar de si, estava quase cochilando naquela maca se não fosse pelas fisgadas causadas pela agulha em seu braço direito.
Em sua mente passava mil e uma coisas diferentes mas a principal era minha mãe vai me matar. Conhecendo bem sua progenitora, sabe que a mesma esta neste exato momento lhe esperando em casa com seu chinelo rosa em mãos, pronta para lhe dar uma bela de uma bronca.
Sua barriga começava a roncar, não se alimentou antes de sair e muito menos durante as trocas de baladas.
Seus olhos estavam presos em seus sapatos sujos, que antes estavam muito mais do que brancos. Abner foi tirado de seus pensamentos com a chegada da enfermeira.
— Consigo ver perfeitamente os carneirinhos pulando sobre você, dormindo acordado desse jeito. — diz a mulher sorrindo, conferindo a bolsa de soro.
Abner a encarou com tédio, como se não tivesse gostado da piada.
— Já esta acabando, logo você ira para casa e tomara umas belas palmadas de sua mãe. — afirma a enfermeira, logo saindo.
O rapaz mal queria saber como seria recebido em sua casa, mas já estava ciente que não teria como escapar de Dona Eva.
. . .
Faixas eram enroladas pela extensão de todo o braço magro daquela moça.
Seus olhos cansados apenas acompanhavam as mãos do doutor fazendo um movimento repetitivo por todo seu braço, até não sobrar nenhum espaço que possa mostrar sua pele machucada.
— Você tem ido ao psicólogo, Senhorita Lopez? — pergunta o doutor, finalizando o curativo.
— Não tem adiantado muito, faz umas duas semanas que não faço acompanhamento. — responde Talitha, vestindo seu casaco, escondendo seu braço, agora, enfaixado.
— Deveria voltar. — sugere o homem — Muitas coisas aconteceram nessas duas semanas que você não foi, não é mesmo?!
Talitha afirma com a cabeça, lentamente, evitando fazer contato visual.
— Saiba que o que precisar, estarei aqui, ok?! — o doutor colocou a mão suavemente sobre o ombro da moça — Lhe receitaria alguns remédios para dor, mas ainda esta fazendo o uso daqueles? — pergunta, pegando a sua prancheta.
— Também não, como disse, não tem adiantado muito. — nada vem adiantado muito, pensa Talitha — Não preciso de remédios, não estou sentindo dor. — afirma, indo em direção a porta do consultório, logo saindo.
O doutor, olhando a porta, que foi recém fechada, suspira em preocupação.
Talitha caminhava lentamente até a saida do hospital, enquanto isso, observava, disfarçadamente, cada sala daquele imenso corredor. Uns estavam acamados com muito mais faixas do que ela possuía, outros com olhos fechados e com tubos de oxigênio. Cada um com uma situação.
Abner ajeitava sua jaqueta em seu corpo ainda sentindo as fisgadas da agulha, já removida de seu braço, agora ocupada por um band-aid circular. Sentia suas costas doerem como nunca e sua barriga roncar mais alto do que antes, precisava urgente se alimentar.
Talitha estava a cruzar a porta de saída do hospital, sentindo o famoso gelado acima de si por conta do ar-condicionado exagerado.
Abner estava ao seu lado, também a passar pela porta, sentindo um refrascar ao sentir o vento gélido.
Ambos, parados um ao lado do outro, sem ao menos saberem quem são, de onde vieram ou o porquê de estar no hospital.
Talitha suspirou em alívio por finalmente sair de dentro daquele lugar sufocante. Olhou para os lados tentando saber qual rumo tomar agora. Casa, mãe, praça... ponte?!
Abner olhou para os lados tentando lembrar de como havia conseguido chegar ao hospital, tendo uma breve recordação de seu colega de trabalho o trazendo com seu carro, então sabia que agora teria que ir embora andando. Suspirou, cansado.
Por um breve momento, seus olhares se cruzaram mas desviando-os logo em seguida. Talitha não deu a mínima, para si, era apenas um rapaz qualquer. Abner voltou o olhar, analisando a mulher dos pés a cabeça.
Não sabia o porque estava a encarando, apenas sentiu que devia voltar a fazer.
Analisou bem seus cabelos curtos em tom escuro um tanto arrepiados, seu casaco preto com rasgos nas mangas e uma calça moletom cinza claro com manchas de sujeira, parece que ela rolou na terra, pensou ele, rindo com seu próprio pensamento.
O rapaz acompanhou com o olhar a moça atravessar a rua e sumir em meio a multidão que se formou na faixa de pedestre. Abner procurou por aquele casaco cansado – apelidado por ele mesmo – mas não o encontrou, dando por fim que ela seria só mais uma garota que encontrara na vida e que, jamais, a veria novamente.
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Estrelas de Papel
Lãng mạn𝗦𝗜𝗡𝗢𝗣𝗦𝗘 | Ambos se cruzam na saída de um hospital. Ele por mais uma noite badalada e ela por mais uma tentativa de suicídio. Ambos levam vidas completamente diferentes, mas quem disse que estrelas possuem os mesmos tamanhos?!