I - Avó, Procópio e Vômito

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25 de Agosto de 2022

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25 de Agosto de 2022

Em meio a tantas pessoas no mundo é certo que existem diversas variedades de nomes, alguns um tanto estranhos outros únicos, mas, você ja conheceu algum Procópio? Se não, devo lhe dizer que é um prazer lhe conhecer. Aos 40 anos de idade minha vó - diga-se de passagem uma louca - decidiu fazer uma promessa sem o consentimento de ninguém apenas pegou sua bolsa de retalhos e saiu a todo vapor direto a igrejinha onde de joelhos ao chão pediu para que sua única filha até então infértil conseguisse ter filhos e que eles fossem saudáveis, em troca prometeu a santa que seu primeiro neto teria o nome de seu ator de teatro favorito. Dois anos atrás quando fiquei sabendo me pareceu um tanto estranho essa troca, mas decidi não questionar a velha e deixei para la coisa tal que não se tem mais o que fazer.

Foi daí que cinco meses depois a notícia chegou, minha vó e meus pais pulavam de felicidade e eu do tamanho de uma manga certamente rodava no ventre de minha mãe como em uma water ball, até então dona Beatriz carregou consigo a tal promessa e assim o fez até o momento que vim ao mundo com 2kg feio como um filhote de rato recém nascido, enrugado como a pele de um idoso e careca como o tio Chico Addams. A famosa cara de joelho era até um termo bonito para se utilizar ao se referir a mim mas mesmo assim minha tia paterna biruta sempre insistiu em me chamar de "o sobrinho mais bonito que ela tem" , agradeço pela bajulação tia Leandra.

Me chamaria Felipe e tudo estava pronto para que eu me chamasse assim as toalhas ja estavam bordadas com o nome, minha vó maluca via toda a situação e mesmo assim manteve aquela boca banguela fechada. No cartório a velha quase ficou sem o seu cabelo amarelo como uma manga chupada quando a minha mãe foi para cima dela no momento em que enfim a promessa veio a tona, meu pai como um belo de um medroso temeu que se não cumprisse com a promessa algo de ruim viria acontecer e foi assim que saí de lá uma homenagem a Procópio Ferreira um ator e diretor famoso nos tempos em que minha avó era jovem.

Dezessete anos depois e nesse tempo todo foram apenas cinco vezes que vi minha avó, com a colher cheia indo a boca na ceia de Natal onde todos a mesa se mantinham com olhares indo de minha mãe à dona Beatriz do outro lado da mesa o silêncio que era quebrado no momento em que uma insultava a outra repentinamente, o último Natal foi marcado por purê de batata no rosto das duas e que acertava quem se intrometesse no meio do fuzuê. Confesso que eu assistia toda a cena rindo da situação e gritava "briga briga" mentalmente.

Essa questão do nome se estendeu por toda a minha vida até os dias atuais, me sinto um livro esquecido no fundo de uma biblioteca que ninguém vê e ninguém procura, nos primeiros anos escolares era um nome diferente e meus colegas gostavam mas com o decorrer as coisas não eram bem assim, a cada chamada meu coração faltava sair pela boca as gotas gélidas de suor escorriam por todo meu corpo com a sensação de que iriam tirar sarro e não era só uma sensação. Agora aprendi a deixar de me importar com isso simplesmente decidi que deixaria coisas fúteis como essa entrar por um ouvido e sair pelo outro.

Ah, Dário meu amigo, me desculpe por você estar jogado embaixo da minha cama empoeirada que não vê um rodo e água à um bom tempo sei que aí deve estar cheio de pernilongos mortos pelo repelente que passei aí ontem a noite, mas meu amigo isso aqui é só por um tempo até que a minha irmã pare de mexer em minha mochila. Lhe prometo que amanhã voltarei escrever em suas páginas, mas até la faço dessa folha de papel qualquer meu momento de desabafo enquanto procuro ter o que fazer na festa de Halloween da escola.

Não queria ter vindo tudo aqui me da náuseas. Uma mesa gigantesca estava posta no meio do pátio passo por ela lentamente observando se havia algo convidativo a se comer, um pote de vidro com olhos de gelatina em algo que parecia sangue de verdade fez meu estômago imediatamente se revirar, era tão bem produzido que se não olhassem bem poderia acreditar que realmente eram partes de um corpo humano real. Momentos depois de passar por uma das mesas e ver tripas esticadas me vejo sentado no chão com braços e pernas ao redor do vaso sanitário, minha cabeça lateja e minhas mãos tremem, com a sensação de que um buraco estava se abrindo logo a baixo de mim pronto para engolir tudo que estivesse ali.

Me levanto do chão ainda meio tonto me apoiando com uma das mãos na parede da cabine de uma tinta verde clara desbotada e com a outra aperto a descarga que aparentava estar quebrada, sinto algo melequento na palma da minha mão como se houvesse espremido e quebrado a casa de uma pobre lesma, temendo saber o que era aquilo não quis nem olhar para evitar meu espanto foi então que notei que ja haviam se passados segundos e a privada não parava de se encher de água feito uma cachoeira. Meu vômito que se recusou a ir embora logo se espalhou no chão junto com toda aquela água que não parava de jorrar, meus pés deslizavam de uma forma que me lembrava os exercícios que via minha mãe fazendo com o detergente espalhado pelo chão, minha tentativa de puxar a descarga emperrada, aquela lambança ja ia saindo para fora da cabine.

Deslizei por baixo de uma cabine a outra, e claro, como um belo idiota só fui pensar na possibilidade de existir alguém ali segundos depois quando me vi de joelhos no chão do banheiro segurando a perna de Evandro o mais inteligente da escola, seus olhos arregalados pareciam querer sair das órbitas enquanto me olhava estático e horrorizado. Me estremeci e de supetão me levantei do chão, minhas costas molhadas se chocaram contra a porta e o silêncio ali dentro parecia não querer se quebrar. O garoto se levantou da privada e agradeci aos céus por ele não estar fazendo o que se deve fazer em um banheiro, a revista que ele segurava em mãos exibia algum tipo de super herói que eu desconhecia, aliás, nunca gostei de super heróis.

A vida me parece tão melancólica e tão estranha ao mesmo tempo e quando tudo parece monótono minha vida vira um caos em medíocres segundos passando para um desespero aterrorizado, dentro daquela pequena cabine eu já não sabia quem possuía o olhar mais assustado, mas acredito que você ser pego de surpresa por um louco ou tarado deslizando até seus pés enquanto se mantem tranquilo em um banheiro é o mais chocante, ou não?

"Ai meu Deus !"

Foi então que me estremeci e me espremi contra a porta mais ainda, seria fácil se eu simplesmente abrisse a porta e saísse correndo dali mas ser visto com outro garoto dentro de uma única cabine não seria de fato algo agradável.

"Que diabos é isso?! Cara você é um doido!"

"Shiu!"

"Você invade minha privacidade e ainda me manda ficar quieto? Vá catar coquinhos seu imbecil"

No mesmo instante que Evandro passou por mim e saiu novamente deslizei e dessa vez não havia ninguém. Uma ideia maluca passou por minha mente e sem pensar duas vezes joguei minha mochila pesada de livros inúteis no chão o impacto soou como se alguém tivesse caído, um morto após levar um tiro, para todos os casos esse alguém era eu. Ao abrir a porta me deparei com um grupinho de pessoas formando um círculo ao redor da cabine enquanto la dentro o inspetor um baixinho barrigudo, parecia prestes explodir ao fazer força para tentar concertar a descarga, estava vermelho como um pimentão, ao perceber que um deles lançou seu olhar curioso contra mim resmunguei:

"Ai minha coluna !"

Imediatamente todos me ignoraram e voltaram a sua atenção para o inspetor, a sensação de adrenalina me invadiu e eu sai do banheiro de olhos arregalados pelo susto mas feliz por ter conseguido ter me safado dessa, ou pelo menos achava. Postos de frente ao banheiro a escola inteira mantinham seus olhos fixos com seus ouvidos atentos procurando encontrar um fiapo de conversar em meio aos burburinhos do que supostamente estava acontecendo: "Me disseram que o vaso entupiu e explodiu"
"Fiquei sabendo que um menino tarado estava la e agarrou as pernas do Evandro"

Eu sabia que não tinha completamente conseguido escapar daquilo, sabia que Evandro iria abrir sua boca, ser taxado de gay pela escola inteira acabaria com minha invisibilidade.

Procópio Não Gosta Desse NomeOnde histórias criam vida. Descubra agora