Capítulo 2

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Passo quase o dia inteiro fora de novo na tentativa de não encher o saco de Iori e quando retorno tento ao máximo evitar ser inconveniente: dedico toda minha energia trabalhando como um louco e o que sobra esbanjo conversando em fóruns de internet.

Só que nem isso é o suficiente: é como se ver minha energia já fosse um problema para ela e percebo a expressão aborrecida, as pequenas manias que evidenciam que está estressada quando levanto para tomar água, dou risada de alguma postagem ou me mexo na cadeira.

— Você não consegue ficar dois minutos quieto?!

— Nossa, ainda mal-humorada?

Mal penso no que digo, é como se as respostas estivessem sempre na ponta da língua esperando para ganhar o mundo e aborrecê-la.

Contudo sua reação é diferente da que imaginei: dessa vez me fita com curiosidade em meio a toda a irritação.

— "Mal-humorada"? — Pergunta impaciente. — Pelo menos já gostou de alguém de verdade?

Sua voz tem um toque explícito de desdém; é chocante como realmente acham que sou um completo imbecil, embora admita que não costumo me esforçar para passar uma imagem diferente.

Sei que o término de uma relação é doloroso, e é por isso para começo de conversa que evito iniciá-las.

— Claro que sim. Só não deu certo.

Capturo seu interesse e ela apoia o queixo sobre a mão fechada me fitando com atenção, a franja lhe conferindo um aspecto jovial que equilibra bem a expressão sempre séria.

Essas nuances dela são muito charmosas e parte do que me atrai tanto.

— E por que não? Ela não te quis?

Certa provocação brilha nos olhos escuros e no fundo, preferia que tivesse sido essa a razão.

— Namoramos.

— E então? Conta logo tudo!

É engraçado como o interesse em saber dos detalhes sórdidos da minha vida a distraem de todo o sentimentalismo em que estava imersa e não posso deixar de pensar que não está doendo tanto assim, afinal.

Nunca contei essa história para ninguém mas é um momento raro de intimidade e por alguma razão me sinto confortável com Iori, pelo menos o suficiente para falar brevemente.

— Fui um babaca. E só amor não resolve tudo.

Ela fica admirada e um pouco surpresa.

— Não resolve mesmo... Quem diria que tem alguma coisa nessa sua cabeça oca?!

Sorrio um pouco chateado com sua observação embora já tenha me acostumado a sempre esperarem o pior de mim: ela nem se surpreende com o fato de ter sido eu o causador da separação.

Devolvo a pergunta mais para alfinetá-la, porém confesso ter curiosidade de saber como seu relacionamento que parecia tão perfeito chegou ao fim.

— E vocês, terminaram por quê?

— Porque só amor não resolve tudo.

Iori torna a se fechar jogando em minha cara nossa assimetria: ela me ouve como uma irmã mais velha e nesse posição, não faz sentido que se abra comigo. Não tenho nada a oferecer nesse sentido.

Foco que meu objetivo nem é esse; qualquer envolvimento mais íntimo gera expectativas e é bom que ela já saiba exatamente o que pode esperar de mim: não serei seu confidente, seu melhor amigo nem nada do gênero, só posso ser uma companhia divertida para algumas noites tediosas.

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