14 de janeiro de 2020. 02h15 A.M. Musutafu, Tóquio.
A jovem garota de cabelos roxos corria contra o tempo, aflita, pela densa mata, sem nunca olhar para trás. Não tinha idéia de como ainda não havia tropeçado e caído, devido a vasta escuridão da floresta. Merda, não podia nem ligar a lanterna que trazia consigo, pois revelaria sua localização e não demoraria muito para que a alcançassem-na então. Podia sentir as longas folhagens e galhos arranhando seu rosto, com agressividade, devido a corrida desesperada mas, sinceramente, tinha preocupações maiores no momento.
Mal conseguia enxergar aonde pisava, era possível se ouvir apenas sua respiração desregulada e ofegante e o barulho de seus coturnos se chocando contra o chão enlameado da floresta, à medida que corria. Em sua mochila, juntamente a sua lanterna, um frasco de alvejante e um pedaço de pano, estava a faca que foi usada para matar sua amiga, Momo Yaoyorozu .
Pôde sentir sua visão ficando cada vez mais embaçada por conta das lágrimas que insistiam em se formar nos cantos de seus olhos, rapidamente trata de secá-las a fim de continuar seu percurso.
Céus, como havia parado em meio a todo aquele caos? Questionava mentalmente.
A cena execrável da jovem de longos cabelos negros estirada em cima de uma enorme poça de seu próprio sangue, com seu corpo ja inerte, encarando o vazio, insistia em voltar inúmeras vezes em sua mente, como um loop infinito que nunca a deixaria em paz. Lembrou-se de seu olhar naquele momento, aquele olhar. Nunca se esqueceria dele, por mais que quisesse ou tentasse a todo custo. Era como se aquele maldito olhar fosse amaldiçoá-la para sempre. Frio, inexpressivo, vazio. Aquele não era o olhar de sua amiga. não era o olhar de Momo. Era apenas um triste e cinzento olhar que havia habitado o seu corpo. Permanentemente, infelizmente.
Ela tá morta.
Nunca mais ouviria sua risada, a qual poderia facilmente fazer o corpo de Kyouka estremecer por completo. Nunca mais veria o seu belo e largo sorriso, o qual, segundo Kyouka, era capaz de afastar qualquer tipo de energia ruim por perto sempre que se manifestava. E o seu cheiro…céus, o seu cheiro. Realmente sentiria muita falta de seu doce aroma. Sentiria sua falta por completo. O tamanho de sua dor era inimaginável, queria apenas parar e poder finalmente chorar pelo luto da pessoa que a fez descobrir o significado da palavra amor.
Sempre fora considerada uma pessoa um tanto tímida, neutra até. E isso também se aplicava quando o assunto eram seus sentimentos e atrações por outras pessoas. Nunca em toda a sua vida havia experimentado o tal gosto daquilo que os demais chamavam de amor . Mesmo se identificando como alguém bissexual, sempre fora um tanto complicado para a garota, se relacionar romanticamente com os outros. Até o dia em que, acidentalmente, distraída em sua música que soava alto em seus headphones trombou, literalmente, derrubando todos os livros que a outra carregava com a garota que faria Kyouka finalmente sentir a sensação de como era estar apaixonado com alguém.
Ela só queria apenas, ter conseguido reunir coragem o suficiente para se declarar e falar de seus sentimentos por Momo antes que encontrasse o seu cadáver estirado ao chão.
Com um forte aperto em seu peito, seguiu seu caminho, logo chegando a um lago próximo a casa de Ashido. Provavelmente correu por uns 20 minutos e já podia sentir o enorme arrependimento de ter matado a todas as aulas de educação física no último semestre. Ainda ofegante e tentando recuperar seu fôlego, a ansiedade voltou a tomar conta de seu corpo, afinal, estava correndo contra o tempo.
Sem prolongar mais, rapidamente se ajoelhou na beira do lago, podia sentir que desmaiaria a qualquer momento. Com as mãos trêmulas, tirou sua mochila de suas costas, logo em seguida a abrindo e tirando lá de dentro, a caixa aonde dentro dela estava o maldito objeto que havia tirado a vida de Momo em questão de segundos. Sempre se certificando para que não deixasse suas impressões digitais no tal objeto, começou a limpá-lo minuciosamente com o pano e o alvejante que trouxera, tratando de retirar qualquer vestígio de sangue ou impressões que ainda permanecessem ali.
Com a arma já totalmente limpa, Kyouka a colocou novamente dentro da caixa, enrolando em volta da mesma, uma corda que também havia trazido consigo. Juntamente a arma, ela também pôs dentro da caixa várias pedras, para que o peso fosse maior. Levantou-se, dando um pequeno impulso para trás, afim de conseguir forças o suficiente para que conseguisse arremessar a caixa o mais longe que conseguisse. Em um rápido movimento, a jogou, e logo pôde ter a visão da caixa lentamente afundando mais para o fundo do lago.
Estava feito.
Ela então, sente suas pernas fraquejarem, fazendo com que caísse ajoelhada no chão. Estava exausta. Apertando seus punhos com força contra o chão, finalmente se permitiu derramar suas lágrimas que havia prendido por tanto tempo.
Um barulho entre a mata atrás de si, pode-se ouvir, a fazendo rapidamente se virar para trás afim de tentar enxergar quem estava ali. Não estava sozinha? Merda, pensava ter sido cautelosa ao adentrar em meio à mata e aquela escuridão, só dificultava sua visão, fazendo com que não conseguisse ver quem era.
Logo pôde ter uma visão mais nítida da silhueta da misteriosa pessoa que ali estava. Deu um passo a frente, se revelando para a garota que estava a alguns metros de si. Kyouka suspirou em alívio, logo virando-se para frente novamente, encarando o lago.
- Como você tá? - questionou o jovem de cabelos também roxos, se aproximando calmamente de Kyouka. Mantinha sua expressão neutra de sempre, porém, cansada e com as mãos dentro do bolso de seu moletom, devido ao frio do local.
- Fisicamente, psicologicamente, espiritualmente ou emocionalmente falando? - ela retruca, em deboche.
Hitoshi estala a língua no céu da boca, em seguida, suspirando pesadamente. Sabia que Kyouka não estava passando por um momento fácil.
- Não deixaremos que a morte dela seja em vão, Kyouka. - assegura.
-Não mesmo. Garantirei que não seja.
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todos temos segredos. você não?
Mysterie / Thrilleraquela fatídica e maldita noite jamais a deixaria. Kyouka só queria apenas, ter conseguido reunir coragem o suficiente para se declarar e falar de seus sentimentos por Momo antes que encontrasse o seu cadáver estirado ao chão.