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Me encolhi mais na arquibancada, o time de futebol da faculdade está treinando. E mais uma vez estou aqui, acompanhando minha colega de quarto na sua incessante busca pelo atacante promissor.

Olho pra esse 22 homens jogando e me bate uma saudade do Brasil, me lembro do meu tio que sempre me levava para o pequeno estádio quase todos os domingos.

- Ele é tão gostoso de uniforme - contive a vontade de revirar os olhos - Mão é possível que nenhum desses gostosos agrade você, Tônia.

- Acho que está errada, Huili, são eles que não se agradam comigo - ouvi o treinador encerrar o treino e suspirei pegando a câmera, eu cuidava da mídia esportiva da faculdade.

- Você parece que vai pra forca - fiz beicinho e minha melhor expressão fofa - Nem pensar, irei tentar uns beijos com o atacante gostoso.

- Malvada - me levantei e ganhei um tapa na bunda - Ei!

- Vai logo!

Fiquei seria e segui até próximo aos atletas, filmando a interação deles.

- Boa tarde Tônia - o treinador é um homem sério, por vezes penso que está sempre furioso.

- Boa tarde, o senhor está otimista com a tempora?

- Temos uma boa equipe.

- As outras equipes se reforçaram esse ano, o que esperar delas?

- Um jogo de cada vez, menina - ele deu uma breve risada e concordei - Fale com os zagueiros, dê visibilidade a eles.

Respirei profundamente e segui até a dupla de zaga, Keei e Victor Konosvik. Eles são primos e ninguém tira os dois da titularidade de zaga, há mais de dois anos. É o que eu vi, porém dizem que desde que entraram na faculdade cinco anos atrás eles são zagueiros. Ou seja, são sete temporadas e cinco títulos acadêmicos.

- Boa tarde, como está a preparação para o início da tempora? - ganhei a atenção dos dois, eles são sérios porém Keei é mais receptivo.

- Bom dia, estamos calmos. Treinamos muito nas últimas semanas, o primeiro jogo é em dois dias e não será fácil - concordei e foquei no rosto sombrio de Victor.

Ele é tão intimidante, sua estatura física impressiona. Ele é estudante de direito está fazendo doutorado, vem de uma família rígida. Como sei disso? Minha colega de quarto fala muito e já teve um caso passageiro com Keei, ela disse que mora apenas ele e o pai. Que é advogado empresarial, é sócio do mais conceituado escritório de advocacia.

- O quão importante é ganhar o primeiro jogo da temporada? - ele ficou seus olhos escuros sem vida nos meus e engoli em seco, o silêncio ficou sufocante. Sabia que ele não iria responder, ele só fala após os jogos. Abaixei a câmera e sorri sem graça - Bom.. hum, obrigada.

Me virei para ir embora, porém ouvi sua voz.

- O que aconteceu com Derick? - confesso que tremi de medo, me virei devagar e os olhei.

- Ele pediu desligamento - disse evitando o olhar nos olhos, Keei gargalhou.

- Você realmente assustou o garoto Victor - ele continuava a rir, porém não sei dizer bem o motivo. Eu nunca tive que trabalhar externamente, era sempre alguns dos rapazes - Você é que vai o substituir?

- Sim, ninguém quer cobrir o time - disse a verdade e ele sorriu mais, pegou sua bolsa no chão e me deu um olhar sério.

- E não vou mentir, moça..

- Tônia.

- Tônia, vai sobre com nossa equipe. Sugiro e espero que tenha paciência, principalmente..

- Por ser negra? - completei e os dois concordaram - Acredite, mão deveria mais isso é tão comum e acontece todos os dias. Que já estou acostumada, repito não deveria. Mais infelizmente não sou responsável pelo que outras pessoas falam e fazem.

- É a cultura.

Dei risada, e apertei a câmera contra meu corpo.

- Não, é ignorância mesmo - me virei saindo de perto deles a passos largos, passei pelo estacionamento e vi Huili atracada ao atacante. Dei risada pegando minha bicicleta elétrica, foi a minha primeira conquista aqui na Rússia.

Quando ganhei a bolsa, a ideia era apenas fazer especialização em endemias. Sou aluna de enfermagem da UFU, no interior de Minas gerais. Depois que perdi meu tios, me afastei de meus dois primos e única família. Sou grata por eles terem me deixado ficar na casa até me mudar pra cá, era apenas 10 meses. Mais minha mentora aqui decidiu que me queria em sua equipe, e hoje me divido entre o jornalismo e plantões no hospital. Posso ficar no dormitório durante 36 meses, ou seja tenho apenas esse ano de moradia gratuita.

Meu visto de cidadania não vai demorar a chegar, pois não tenho antecedentes e vou regularmente a imigração detalhar o que estou fazendo no país. Orientada pela minha mentora, consegui o visto. Paro no sinal e ajeito meu capacete, não ando sem.

Me assusto com o carro que freia bruscamente ao meu lado, quase caio. Olho para o mesmo e os vidros fechados, porém o arrepio percorreu meu corpo. Volto a olhar pra frente e quando o sinal abre sigo na ciclo via, o carro passa por mim devagar fazendo meu coração acelerar para logo depois sumir entre os outros.

Chego ao dormitório e corro até nosso pequeno apartamento, é uma sala minúscula com cozinha, dois quartos e um banheiro. Nessas horas foi risada pois tenho que me programar ou Huili não me deixa usar, e mesmo com o frio intenso não perdi o gosto pelo banho.

Me lembro de estarmos no inverno e eu tomar banho todos os dias, Huili me achava uma louca.

Me arrumei e me sentei para mandar o material de vídeo para a editora do jornal e responsável pelo site. O bom de não estar mais trabalho lá dentro, é que não vou passar horas editando e nem vigiar o relógio para não atrasar publicações.

Peguei minha marmita e fui para o hospital, hoje não tive aula então é dia de plantão. Vou a pé mesmo pois é próximo ao campus, não ligo para os olhares. Muitos colegas de classe e trabalho não gostam de mim, ou melhor da minha cor.

Muitos pacientes não me deixa os tocar, me lembro do meu primeiro dia. Fiquei na ala dos idosos e fui xingada de suja mais vezes do que pude contar, me lembro de chorar em silêncio no caminho de volta. Porém voltei nos próximos dias com um sorriso no rosto, não fazia e nem faço isso para provar nada a ninguém. Faço por mim, pois sei que estou construindo meu futuro.

Visto meu uniforme depois de lavar bem as mãos, coloco meu colar que tem um relicário por dentro da roupa fazendo minha oração diária.

- Senhor, obrigada por todas as pequenas coisas que me dá todos os dias. Eu não sei quais e nem quantos livramentos, passei e irei passar, porém agradeço por cada um deles. Amém.





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