VII | Globo espelhado

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    Os olhos azuis pousaram em Susan passando pela porta da cafeteria e por alguns instantes sua visão ficou turva. Seu mundo começou a funcionar de forma lenta, o som de seu coração acelerado era a única coisa que ouvia naquele instante. Não surpreendeu-se quando a mãe ignorou sua existência, afinal, esse é o modo que ela vem a tratando nos últimos dias.

    Seguiu Susan e suas amigas com o olhar, elas se sentarem na mesa do fundo com o olhar, não conseguiria atender elas, não conseguiria ver a própria mãe lhe tratando com tanto desdém.

    Max pressionou os dedos no balcão encarando a cena. Susan mexia nos cabelos castanhos de Heather, quem estava junto delas. Mulher sorria orgulhosa para a garota. A cada gesto gentil de Susan, o estômago de Max revirava, sentia raiva, inveja, muita inveja. Heather tem tudo o que Max mais desejou na vida, o afeto de sua mãe.

    Devagar, Edward se aproximou da garota, sem que Max percebesse. Gentilmente o homem toca no ombro de Max, fazendo com que a garota acorde do transe que ela se encontrava.

— Está tudo bem? — Max assentiu — Eu atendo a mesa, passa uma água no rosto — a garota sorriu disfarçando o constrangimento no qual se encontrou.
  
   Adentrou o banheiro dos funcionários como um furacão, bateu a porta atrás de si com força suficiente para o cartaz pendurado na porta escrito "funcionários" caísse. Se encostou na porta soltando o ar dos pulmões que não fazia ideia que prendia, passou as mãos nos cabelos ruivos presos no rabo de cavalo. Tampou próprio rosto com as mãos pálidas, certificando que nenhuma lágrima de ansiedade rolasse. Como pode sua mãe a afetar tanto sem falar ao menos uma palavra? O resto da sua vida seria assim? Susan aparecendo igual um fantasma lhe assombrando aonde ela estiver?

   Curvou-se sobre a pia de mármore molhando o rosto com a água fria, olhou para a porta se preparando para sair.

— É para você — Eddie entregou o telefone para ela quando Max retornou ao balcão.

— Obrigado — sussurrou — Alô? — perguntou. Quem poderia ligar uma hora dessas? Ainda mais para ela?

— Max? É o Lucas — o garoto parecia nervoso — Eu peguei o número da cafeteria esses dias — se explicou — Bom, uns amigos meus do time vão dar uma festa de Halloween essa noite, eu queria convidar você, sabe, nunca te vi fora da escola... Se não puder vir, tudo bem — Lucas estava mais nervoso do que no começo — Mas eu ficaria muito feliz em te ver.

— Lucas, onde é essa festa? —  Max entendeu pouca coisa que o garoto disse.

— Tem uma caneta aí?

   Max procurou em cima do balcão, abriu as gavetas e encontrou no fundo da segunda que abriu.

— Tenho — pegou um guardanapo perto dos copos descartáveis.

— É na última casa da rua Lincon, posso passar na sua casa se você quiser — Max olhou para a mesa de sua mãe.

— Pode deixar, eu vou sozinha...se eu sair a tempo.

— Ok. Ótimo, te vejo lá — Max pode ouvir gritos de comemoração por trás do telefone.

       Susan saiu da cafeteria hás seis, passou por Max como se a garota fosse uma desconhecida. Hás sete, quando Max chegou em casa, ela ainda não havia chegado.

        Max se jogou na cama analisando o convite de Lucas. Fechou os olhos, sentindo o vento do outono adentrar o quarto através da janela aberta. Passaria a noite inteira sozinha, aparentemente, e por mais que goste da própria companhia, em certos momentos a solidão e o silêncio absoluto começa a sufocar.

        Pessoas solitárias tendem a se acostumar com a dor da solidão, mas nunca com o vazio dentro de si. Max se sente solitária todos os dias, há todo momento, mesmo quando está cheio de pessoas ao seu redor. A solidão que a cerca sua vida inteira se tornou aos poucos um grande buraco dentro do peito, trazendo consigo um eco que fica na sua cabeça dizendo "Você morrerá sozinha". É fácil confundir a independência com solidão. Max se tornou independente da mãe aos dez, quando passou a cuidar de si mesma enquanto Susan trabalhava e no tempo livre passava a noite em boates. Mas solitária, ela sempre foi. Quando morava com os avós, por mais de ter tido suas melhores memórias como eles, ela era sua única e real companhia.

Outono | Elmax Onde histórias criam vida. Descubra agora