Estendi a mão em direção à enfermeira Jones parada à minha frente. Esta deu-me um pequeno copo cheio de compridos que aceitei de bom grado. Finalmente, finalmente a dor ia desaparecer durante mais umas horas.
Sentei-me numa cedeira perto da janela, que já era o meu lugar e olhei lá para fora como habitualmente. A verdade é que a paisagem não mudava muito, o hospital psiquiátrico tinha sido construído no alto de uma colina, no meio de uma floresta para que os seus residentes tivessem melhor ambiente de cura.
Durante uns instantes perdi-me na dimensão da árvores e no brilho do sol, ocultado pelo espesso nevoeiro matinal porém esta alienação não durou muito.
-Querida, é hora da consulta vamos? - uma enfermeira jovem tinha a mão pousada no meu ombro de forma benevolente. Apeteceu-me rir, sinceramente. Olhei directamente para ela e vi-a estremecer durante um segundo antes de se recompor. - O doutor já está à tua espera.
Levantei-me lentamente da cadeira suspirando enquanto a enfermeira caminhava apressada e stressadamente à minha frente. Coitada, era nova de certeza. Tinha a certeza de nunca a ter visto ali antes e certamente também ela se lembraria de mim. É difícil esquecer uma das pacientes mais famosas do Hospital.
Enquanto atravessávamos um dos muitos corredores em direção ao gabinete do psicólogo consegui ver o meu rosto refletido numa das muitas janelas. Agora percebo o susto da rapariga. O meu cabelo castanho (outrora loiro) parecia ainda mais um ninho de ratos que normalmente e envolvia-me o rosto magro e com aspeto doente. A minha pele parecia tão pálida como o costume, sob esta luzes florescentes. Os meus olhos, que podiam ter sido bonitos em tempos, estavam agora rodeados pelas mais assustadoras olheiras que já tinha visto. Toda eu parecia um cadáver.
-Podes entrar - disse a enfermeira, abrindo a porta do consultório. Reparei que desta vez não houve qualquer contacto físico, nem visual e toda a suavidade tinha desaparecido da sua voz. Ela tinha aprendido a lição.
-Bom Dia Alice.
Entrei para o gabinete ouvindo a porta a fechar atrás de mim. Olhei para o Dr. Emmet que como sempre parecia ridiculamente gordo, careca e alegre.
-Bom dia Doutor.
Nem me preocupei em sentar-me na cadeira em frente à sua secretária e atirei-me diretamente para o sofá de cabedal preto no canto do consultório. Não sabia se o sofá tinha algum efeito prático mas fazia-me sentir tão hollywoodiana que desde que o vira nunca mais o largara.
-Como estiveram as coisas esta semana?
-Paradas como sempre. Espere não é bem verdade, a Felicity tentou matar outro paciente com um garfo na cantina... Na realidade foi um espectáculo interessante de se ver.
Dr. Emmet tossiu levemente - Eu estava a falar da tua condição. Tens tido alguma espécie de visão?
-Não - menti facilmente.
-Alice... Não precisas de me mentir - disse o homem, baixando os óculos e olhando-me atentamente.
Fodasse o homem lia-me os pensamentos.
-Não estou a mentir, não tenho tido visões.
-O nosso trabalho aqui é ajudar-te... Tens de admitir o teu problema senão a recuperação vai ser longa.
Não aguentei mais e ri-me na cara dele.
-A minha recuperação vai ser longa? Sabe há quanto tempo estou aqui fechada? Cinco anos! Cinco anos de merda passados com gente psicopata, com enfermeira que me falam como se eu fosse um bébe e com sítios a cheirar a mijo e a morte! Sabe que mais? Se não estava louca antes sem dúvida que fiquei depois de vir para aqui.
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Dark Wonderland
FantasíaO que aconteceu à jovem Alice depois de ter saído do País das Maravilhas? Hospital Psiquiátrico. Tentativa de suicídio. Loucura. O lado negro da história de Alice, enquanto adolescente que procura voltar ao único lugar aonde algum dia se sentiu com...