Meu primeiro dia na quadra foi assim

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Chiara

Tudo foi meio que sem querer.

Na verdade, foi querendo, sim, porque tudo começou quando eu precisei de dinheiro e descobri uma coisa chamada bolsa atleta - calma que eu vou explicar.

Quando o técnico do time de vôlei da UFMG me viu e percebeu que eu grande o suficiente para as pessoas comentarem: "Nossa, você deveria jogar vôlei ou basquete"; A minha vida mudou completamente. Mas aí você me pergunta... O que se passava pela minha cabeça? Eu queria isso? Bom...

R$ 700,00 do bolsa atleta + R$ 1.000,00 do auxílio permanência + Qualquer dinheiro que minha mãe podia me mandar (ou não) + Qualquer bico que eu conseguisse fazer pra descolar uma grana = Eu conseguindo me sustentar em Belo Horizonte e não ter que parar minha faculdade de arquitetura. Era isso que se passava pela minha cabeça.

Eu poderia começar contar minha história assim como o Percy Jackson começa a contar a dele dizendo que ele não queria ser um meio-sangue - no meu caso, uma "atleta". E... É, eu acho que vou fazer isso.

Então, olhe, eu não queria ser uma jogadora de vôlei - juro por Deus e prometo explicar meus motivos.

Se você está lendo isto porque acha que pode ser uma, meu conselho é o seguinte: feche este livro agora mesmo. Acredite em qualquer mentira que sua mãe ou seu pai lhe contou sobre seu nascimento, e tente levar uma vida normal. Vá fazer uma faculdade qualquer, não entre em times de atlética, não se esforce muito e, se possível, use drogas, porque aí você já perde no dopping - não tem nem chances.

Ser uma atleta é perigoso. É assustador. Na maioria das vezes, acaba com a gente de um jeito penoso e detestável - 19 anos e não sei o que é comer uma porcaria, ter feriado, finais de semana... mas tem suas vantagens, vamos lá, animação, é o que dizem!

Se você é uma pessoa normal, que está lendo isto porque acha que é ficção, ótimo. Continue lendo. Eu o invejo por ser capaz de acreditar que nada disso aconteceu.

Mas, se você se reconhecer nestas páginas – se sentir alguma coisa emocionante lá dentro -, pare de ler imediatamente. Você pode ser um de nós. E, uma vez que fica sabendo disso, é apenas uma questão de tempo antes que eles também sintam isso, e venham atrás de você pra te levar pra um clube.

Não diga que eu não avisei.

Meu nome é Maria Chiara de Souza - só tenho um sobrenome porque meu pai foi comprar cigarro. Tenho 19 anos, sou de Vassouras, interior do Rio de Janeiro e vim para Belo Horizonte com o sonho de:

1. Sair de Vassouras;
2. Cursar Arquitetura em alguma universidade federal; e
2. Morar numa cidade grande e acreditar que minha vida vai ser um conto de fadas - já te adianto que essa parte deu errado.

Das três, a primeira foi a que deu mais efetivamente certo, já que não moro mais em Vassouras. A segunda está naquele estado meio corda bamba e é aí que vou começar a falar sem parar.

Desde criança eu fui apaixonada por desenhos e ângulos.

Já quis ser estilista - desenhava bonecas feias com roupas esquisitas, esses tipos de desenhos nunca foram meu forte. Já quis ser pintora, porque adorava aquelas artes mais geométricas e achava que minhas artes esquisitas fariam sucesso. Já quis até ser matemática, porque eu adorava as figuras geométricas e as formas que elas faziam sentido - era muito fácil reproduzir porque eu precisava de uma régua ou no máximo esquadros e transferidores e... Vamos lá, coisas replicáveis são coisas confiáveis.

Mas o que realmente chamou minha atenção foi a arquitetura. Por quê?

Combina arte, matemática e ciência. É um desenho científico, totalmente replicável porque existem medidas, ângulos, escalas e materiais onde eu posso me basear.

A gente nem ficouOnde histórias criam vida. Descubra agora